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quinta-feira, julho 08, 2021

Das circunstâncias que nos educam

 

Meus caros leitores, fiquei eu de vos ilustrar com exemplos como é que meu pai se tornou um educador para mim, quer pelo que fez , quer pelo que levou outros a fazer. Para vos explicar com algum rigor e em pouco tempo terei de vos fazer apreender o modelo de empresa em que meu pai foi meu criador de seus filhos. 

Meu pai foi trabalhar para as Minas de Jales, uma empresa mineira dedicada à exploração do ouro. Estas minas ficavam na aldeia de Campo de Jales, na freguesia de Vreia de Jales, concelho de Vila Pouca de Aguiar, em Trás-os-Montes. O nome de «jales» significa precisamente depósito de estéreis ou de restos de mineração. Estas minas foram bem conhecidas e exploradas pelos romanos, quem olhar em redor, pelas montanhas que cercam as aldeias de Jales verá que toda a terra tem um aspecto de ter sido remexida, havendo elevações que parecem ter resultado da deslocação de terras e havendo covas que resultaram a exploração em profundidade. Mas a empresa tinha uma organização singular. 

Embora radicada numa localidade, Campo de Jales, a empresa dera origem a outra localidade, construindo bairros e casas para os seus trabalhadores e construindo instalações para toda a espécie de serviços à indústria mineira; estradas e luz eléctrica permitiam a boa circulação entre o casario e entre os serviços. A empresa tinha todos os serviços da indústria: as minas, as oficinas, a serração de madeiras, a tanoaria, a carpintaria, o laboratório, a central eléctrica, os armazéns, a lavaria, a barragem, os escritórios; e tinha também todos os serviços de apoio aos trabalhadores que viviam nas casas da empresa ou nas da aldeia e de que se podiam servir: a cantina, a messe, o salão para o cinema e o teatro, o clube desportivo, a barbearia, a padaria, o posto médico, os sanitários, os parques de recreio, a polícia. 

A primeira condição para esta empresa ser um centro educativo e formativo de pessoas estava asseguradíssima: a troco da força de trabalho, a empresa garantia condições de vivência integrais, com excepção do serviço escolar que era garantido pela escola pública e do serviço religioso que era pela paróquia; a aldeia tinha feira mensal. 

Foi nesta empresa que fui educado: os pais tinham orgulho nas condições de trabalho que a empresa proporcionava, a empresa regulava a vida social de forma organizada, com nítida percepção dos limites territoriais proibidos e tolerados à circulação de trabalhadores e não trabalhadores, as condições de trabalho por turnos tornavam a aldeia de Jales um corropio de pessoas vindas das mais variadas proveniências, a diferenciação laboral, social e cultural dos trabalhadores demonstrava hierarquias de saber e de poder. Tudo isto foi o meu livro educativo, lido pelos meus pais, mas de maneira especial pelo meu pai que assumiu sempre a empresa como coisa sua.

Ter objectivos de criar e instruir os filhos era o sonho de meus pais, dar-lhes todas as possibilidades de educação e de ensino, fazê-los participar em todas as dinâmicas da empresa na gestão dos tempos livres: clube com desporto, com biblioteca, com salão de televisão, com cinema, festas organizadas pela empresa no ciclo festivo do natal e da Páscoa e da padroeira dos mineiros, Santa Bárbara. Além da empresa, a educação familiar era completada com trabalho agrícola, quer na dimensão dos cuidados da horta, quer na dimensão das terras de cultivo que meus pais possuíam ali perto: ter uma ocupação contínua, era o lema dos pais para educarem os filhos: havia sempre que fazer para ajudar os pais, fosse a mãe nas tarefas da casa, fosse os pais nas tarefas da agricultura. A curiosidade sobre a vida dos outros, os vizinhos e os de fora, era estimulada de forma muito natural, pois havia sempre novidades nos bairros, nos serviços, nas idas e vindas das pessoas para os programas vários ou de divertimento ou de ocupação religiosa ou de prática desportiva ou de feira e comércio. 

Os serviços de armazém em que meu pai trabalhava constituíram a minha caverna de Ali Babá, não com riquezas, mas com variedade de objectos e de máquinas e de instrumentos e de materiais e de utensílios: Havia de tudo no armazém que meu pai geria, ir ao armazém era abrir muitos livros de curiosidades. 

1 comentário:

VictorJ disse...

Bom dia,
desculpe o comentário lateral...
Gostaria de entrar em contacto consigo para partilha de informações sobre jalotos antigos.
O endereço que encontrei no seu blogue (costamachado@mail.pt) parece desatualizado ou errado pois a mensagem veio devolvida...

O meu contacto é
vjcarocha@gmail.com

Obrigado
Victor João Carocha