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sábado, dezembro 07, 2019

Sobre o meu poema de Natal

O meu primeiro «insight» ou inspiração para o poema deste ano foi aquela história do bebé colocado por sua mãe num contentor de lixo, naturalmente para o abandonar e ele morrer, ou, quem sabe, secretamente, para que alguém o visse e o criasse. O bebé resistiu catorze horas, até o seu choro ter alertado uns sem-abrigo e um deles ter chamado as autoridades. A história está escrita e já se evidenciaram todas as suas componentes. Biblicamente, repetiu-se, noutro cenário, noutro tempo, o lançamento de Moisés às águas, para ter a sorte de ser encontrado por alguém mais afortunado. 

Eu não sei até que fundo batem as pessoas e até que fundo batem as histórias das pessoas no coração da gente. Há um lastro de muita mensagem em toda esta história, não que tenha sido esse o propósito, mas que tem sido esse o desencontro das situações: se a mãe quis matar, não matou, se quis abandonar, não o conseguiu de todo, se quis chamar a atenção para si teve êxito total, mas que atenção é essa que ela nos pede que não seja a atenção total do seu filho? Cabe a cada um contar a história e dar-lhe fundamento integrador. Foi o que tentei em meu poema com uma simples referência, que vai escapar a muitos leitores, ao contentor do expediente, sendo a natureza deste expediente, neste caso, o lixo biodegradável, a semente de muita vida se lançado à terra. 

Depois inspirei-me na outra dimensão de ver e acompanhar o nascimento de uma criança em situação que dizemos normal e natural, com toda a assistência médica, com todas as relações institucionais e familiares asseguradas; foi o nascimento do filho de meu afilhado, o Francisco Xavier de seu nome, cujos pais são meus sobrinhos netos por parte de minha esposa, portanto a criança bem pode aceitar o meu castigo pessoal de lhe chamar neto, se é castigo o encargo que assumo de o ajudar naquilo que puder. O Natal é o nascimento de uma criança, em qualquer circunstância ou pretexto de se originar a vida, o Natal está a ser lembrado e a ser actualizado na vida de cada um de nós. 

É seguro que nós os católicos atribuímos ao Natal toda a importância histórica e reveladora de uma transcendência de sentido, mas essa dimensão sempre ocorreu com a sua humanização total ao longo da história, humanização esta que se representa e se fixou em arte e se transporta para todas as fases do humano, do vivido, com dimensões que são ora valorizadas mais ora menos, como as festivas e as solidárias, como as do afastamento dos maus augúrios ou forças do mal, sendo mal aqui tudo aquilo que não vai ao encontro de uma ideia de bem universal, horizontal a todos os credos e presente um pouco em todas as perspectivas de vida. 

O Natal congrega civilizadoramente muitas tradições, a principal das quais é a de que a criança que nasce é uma esperança de superação e de consagração da vida para os seus e para todos. O Menino Salvador da religião cristã concretiza uma ideia presente em todos os povos, a de que a nova vida se constitua como mais vida para todos, podendo mesmo ser a luz orientadora , como me parece ser a ideia de que o guia espiritual de um povo reencarna  e assume-se num novo ser  e que estaremos sempre à espera que esse ser último nos conduza a um estádio de felicidade plena. Até a tradição do consumismo contemporâneo está enraizada na história do Natal a par da sua contrapartida que é a partilha ou solidariedade: muitos povos celebram a festa da vida com a produção de inúmeros presentes, com a distribuição de inúmeras prendas, tal como se todos fôssemos Reis Magos; e a partilha é a da solidariedade de pastores que levaram ao menino seus pertences e produtos de sobrevivência. E até a ecologia ou sustentabilidade ambiental está presente no imaginário de Natal. O fogo, o sol, a luz, na forma de estrela orientadora ou na forma de energia é a nossa sobrevivência.

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