
5ª As multidões são de sempre e os consensos também, mas alguém começou, alguém teve a iniciativa, alguma causa desencadeou a reacção e o processo deu-se e sustentou-se. As causas, as origens, os começos, a partir de certa altura da reflexão, deixam de interessar. Em qualquer data de um processo, quando me interrogo: porque continuo a fazer o que se fez até aqui? - a origem está encontrada, os argumentos podem começar a elaborar-se. O argumento da tradição não evita esta interrogação, nem a desculpa, nem a substitui. Antes a requer com mais segura argumentação, ou seja, com actualização de razões.
Na imprensa, no sermão, no roteiro turístico, minguam as actualizações de argumentos. Mantêm-se as lendas, mantêm-se os mistérios, prevalecem os sentimentos e os instintos. Acredita-se e justifica-se: «mal não faz!» No fundo, é este mesmo argumento que nos deveria levar mais longe a própria criatividade, a própria ousadia.
6ª Continuamos tribais, a sobreviver. Mas a acumulação de experiências - o acumulado sonoro, verbal, icónico - teve momentos de criação, de variação, de repetição, de alteração. Baseamos a noção de identidade numa permanência de traços e de registos ou numa similitude dos processos operativos, isto é, reconhecemos a identidade por fazermos as mesmas coisas ou por pensarmos do mesmo modo, por utilizarmos os mesmos instrumentos cognitivos?
7ª Muito recentemente descobrimos a música antiga, a música medieval, reinventámo-la. Até a gravámos e agora reproduzimo-la. Na música, como noutras áreas, procurámos a «emergência» e conseguimos a ressurreição. Não há razão para descrermos. Quando minguam as fontes documentais, crescem os processos da imaginação, os da procura, os da comparação, os da construção etnográfica do próprio conhecimento.
2 comentários:
Gostei de ler os teus textos. Li os dois últimos - "Proposições evasivas". Estava a lê-los e a ouvir-te falar. Mas não foi só por isso: as tuas "Proposições" também me interessaram. Vou passar por cá mais amiúde. Cuida-te, pois. Registei-me nesta coisa sem nome, e assim quero ficar. Pelo menos para já.
Um abraço.
A.M.R.M.
Bom, assim espero que sejas o que dizes, que eu me cuide, pois é disso mesmo que preciso para ser quem sou e nem sempre me tenho cuidado. O meu descuido é pensar que me basta dizer o que penso, quando sei que preciso de interlocutores. Que o sejas, assim espero e me cuidarei. O anonimato não me cuida, quando o nome for preciso não hesitarás em dizer-mo.
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