Em que estás a pensar? Eh! Em que pensas? Na morte da
bezerra? Quem é que já não foi surpreendido com esta pergunta tão instalada no
primarismo verbal de uma comunicação? Este perguntar revela-nos em absoluto:
representa aquele desejo íntimo que todos temos de saber em que é que o outro
pensa, que é uma variação do desejo mais íntimo de que ele esteja a pensar em
nós. Esta pergunta se fosse feita por deus aos homens requereria que estes
respondessem que pensavam em Deus naquele preciso momento da questão. Hoje
temos precisamente uma variação de deus a fazer-nos diariamente esta pergunta
«em que estás a pensar?», mas não é Deus quem a faz, é outro poder, esse mesmo,
o leitor já calculou, o Facebook. Estar e navegar no Facebook é andar ao sabor
desta pergunta, lendo as respostas de todos os que a responderam, sabendo
precisamente o que quer saber este deus da rede virtual. Pois então eu vou
responder também ao Face que me perguntou em que é que eu estava a pensar para
lhe dizer que pensava em demonstrar como todos nos tornámos Pilatos na rede virtual,
sem o querermos ou de modo tão intencional como o prefeito romano. O leitor não
se deixe surpreender com a minha resposta, que é o título desta crónica, que eu
explico: toda a gente sabe mais ou menos a história do Pilatos, o tal prefeito
romano da província da Judeia, esse mesmo a quem foi entregue o prisioneiro
Jesus, o Nazareno, para que ele o julgasse. É conhecido o resultado, o homem
que fazia as vezes do imperador de Roma não descortinou qualquer culpa no
cartório de Jesus, mandou-o de Anás para Caifás, encheu-se de dúvidas sobre o
que seria a verdade, e entregou o profeta à multidão para que ela decidisse o
que lhe fazer… Ora o comportamento de Pilatos virou moda na internet e
sobretudo no Facebook e o que se vê é precisamente o mesmo estilo de não
decidir, não escolher, apresentar ao público, postar, como se diz, e quem
quiser que escolha, que comente, que opte, que decida… e por causa deste comportamento
anda toda a espécie de «coisas e loisas» na internet… Uma pessoa não sabe que
posição há-de tomar sobre a divulgação de uma cena cruel, pois, não tem
problema, pega com ela no face, sem
comentários e quem vir que diga o que lhe apetecer… Aquela perguntinha «Em que
estás a pensar» é que determina tudo e permite colocar naquele espaço qualquer
coisa, pois mesmo que eu não pense nada, alguém há-de pensar… Como eu também
ando pelo Facebook deixei por lá, um
dia, o soneto seguinte…
Umas vezes avanço, outras atraso,
Como quem passa as ruas a olhar
Se vê quem não procura, por acaso.
O rato impele a mão a clicar,
Ou a rolar a página sem caso.
E quanto a pôr «gosto» ou comentar,
Umas vezes demoro, outras me vazo.
O «Face» é rua larga e paradeiro,
Novíssimo lugar de soalheiro,
Com muita indiscrição provocadora.
Por isso aqui passeio à porfia
De toda a novidade sedutora
Que possa alimentar-me a fantasia.
Como quem passa as ruas a olhar
Se vê quem não procura, por acaso.
O rato impele a mão a clicar,
Ou a rolar a página sem caso.
E quanto a pôr «gosto» ou comentar,
Umas vezes demoro, outras me vazo.
O «Face» é rua larga e paradeiro,
Novíssimo lugar de soalheiro,
Com muita indiscrição provocadora.
Por isso aqui passeio à porfia
De toda a novidade sedutora
Que possa alimentar-me a fantasia.
(Publicação de Hermínio da Costa Machado em 26 de Dezembro de 2014)
O acesso às redes sociais requer o domínio progressivo das
tecnologias e estas dão origem a cada vez mais recursos sofisticados. Ter
telemóvel ou smartfone, ter pad ou ter computador, enfim, ter uma plataforma
móvel que esteja capacitada a manter-nos em contacto global é hoje um desejo
comum e, felizmente, uma concretização cada vez mais possível. Todavia, a
integração destas tecnologias na nossa vida e a integração da nossa vida nestas
tecnologias são coisas ou dimensões um bocadinho diferentes. É importante que a
escola seja um lugar de aprendizagem das novas tecnologias e seja também um
lugar de sabedoria sobre as suas capacidades e os seus limites, sobre as suas
potencialidades e os seus perigos. A facilidade de exposição que hoje
praticamos nas redes virtuais pode facilmente virar-se contra nós, quer em
termos de manipulação, quer em termos de condicionamento mental. Os vícios
pagam-se caro, costuma dizer-se.
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