
Hoje celebramos o Dia Internacional da Mulher e eu quero aqui lembrar-me quanto dependo dela e quanto lhe procuro dar de mim e do que sei, na certeza que mais recebo e nem sempre agradeço e de que mais cobro exigindo agradecimento, numa representação desmedida de papéis e de funções, dentro de um quadro de relacionamentos que tem vindo a ser equilibrado pela história, mas que ainda pende para um dos lados quando é submetido a formas de pressão ou a modismos de tendência, gerando reféns e vítimas, mais ela do que eu, ela mulher e eu homem, que esta divisão ainda a tenho por natural.
Hoje é também um dia em que os professores se juntam em Lisboa, capital do reino, para que «acudam aos mestres que os matam sem por quê», como li num sugestivo, pertinente e certeiro texto de meu colega António Mota, dando conta, nesta paráfrase recriativa de Fernão Lopes, das arbitrariedades legislativas do Ministério da Educação.
Hoje é um dia de combate por uma ideia de escola pública, com os professores em primeiro lugar como seus imprescindíveis e fundamentais intervenientes e com estes a desejarem que os outros parceiros se não arvorem em paladinos de causas fáceis e de resultados duvidosos.
Sou a favor da liberdade de ensino, mas gostava que os pais e os alunos optassem pela escola pública por saberem que ela não é a solução mais económica nem a mais fácil, mas que é a melhor e a mais eficaz. Digo isto desejando os mesmos valores para as escolas particulares.
Lançar para o ar essa argumentação de que a escola pública está falida, que é um modelo de ensino desactualizado e sem rumo ou sem préstimo para o futuro dos jovens e dos cidadãos de amanhã, que não lhes desperta o interesse e a animação, foi chão da crítica de vários intervenientes nos últimos e frequentes programas televissivos, quase sempre conduzidos facciosamente. De vez em quando sai da elite intelectual uma tirada destas e a gente fica a pensar, pois parecem baseadas no facto de hoje a juventude estar a demonstrar outras apetências de saberes e de habilitações que a escola não consegue sustentar. Pura ilusão esta, mas fica bem dizê-la para provocar um debate, só que não dá
Idêntica, mas sintomaticamente mais provocadora, muito na moda desse tique discursivo sobre a escola desactualizada, é essa representação de que hoje os jovens fazem três coisas ao mesmo tempo, vêem televisão, jogam playstation e ouvem Ipod, como se isso fosse a demonstração de capacidades e não de distracções, como se isso fosse a representação de genialidade e não da mais inteligente vitalidade da preguiça e do distendimento de meninges. Até se podem acrescentar outras tarefas que os jovens ainda conseguem realizar ao mesmo tempo que ouvem música, vêem televisão e jogam, como seja comer e falar e ir à casa de banho, que a simultaneidade é sempre uma questão de perspectiva, só que não é por isso que se deve tornar assunto escolar ou base para construção de currículos.
Estas bocas sobre a falência da escola são a fruta do tempo e dos debates, mas não passam de bagatelas sintomáticas sobre os distúrbios do nosso mundo. Eu sou dos que pensam que a escola não está a falhar e não é ela que tem de fazer tudo, ela cumpre o seu papel e a sua missão e só não faz melhor porque não deixam, não a querem avaliar com rigor e querem que ela se dilua em burocracia estatística e matérias de banalidade. A escola requer estudo e o estudo requer tempo e o tempo requer muito autocontrole de boca e de estômago: campeia a demagogia das metáforas e a simbologia das miragens, como esssas da devolução da escola às comunidades, da sua gestão em estilos empresariais, da inspiração eficaz de lideranças, das quotas de mérito e da ocupação intensiva dos horários.
Em Lisboa corre um rio de águas indignadas. Que se não perca!
4 comentários:
O rio há-de ir ter ao mar.
Amanhã continua o luto e a luta, porque os professores sempre tiveram a arte de saber ensinar.Havemos de ter imaginação para isso,e a razão há-de ser o "comboio de corda" que a fará entreter.
Abraço
Gracinda Castanheira:
E é tudo tão verdade! Mas a ti ou a pessoas como tu, ninguém chama, ninguém pergunta...seria uma voz demasiado incómoda, pelas verdades que encerra e por apontar muitas das culpas de quem não quer pensar nem parar para ver.
Mas havemos de conseguir!Não nos calaremos! Pena que entretanto fiquemos tão magoados e desgastados!Esta tristeza e este desânimo podiam virar alegria e irmos para a escola sem um profundo luto na alma!
Um abraço Zé.
Cro Zé Machado!
Foi bom ler este texto teu.
Estava um grupo em Lisboa. Algumas caras conhecidas. Atrevido, perguntei: - De que escola é que sois? A resposta veio em coro: Da Francisco Sanches. E então eu: -Ah! A escola do Zé Machado! Depois acrescentei qualquer coisa que não vou dizer aqui, não vás tu envaidecer-te. Mas mandei-te um abraço.
Contamos contigo. Mas precisamos mais de ti.
Um abraço.
António Mota
«A escola existe para ensinar a pensar e a desenvolver potencialidades,o que significa que ela é na sua essência plural e não única ou de um sentido só.»-Plenamente de acordo.Esse deve ser o verdadeiro conceito de escola e não o que as hierarquias estão a querer impor!
Em Lisboa corre,correu um rio de forte corrente!!!E não se quer perder,e não se quer enfraquecer!
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