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sexta-feira, fevereiro 20, 2015

Foi partindo sempre do que não havia...

Miséria havia no meu tempo, que nem tínhamos onde fazer as necessidades, que tínhamos de trabalhar de pequenos, pobres fomos nós, meu filho, agora vós tendes tudo e desaproveitais, por aqui vê-se lá miséria, vê-se lá pobreza, vê-se mas é gente que bem podia trabalhar, vê-se é gente à boa vida, a viver de subsídios, sabeis lá vós o que é ter fome, sabeis lá vós o que é ser pobre.

Estes desabafos de meu pai têm o tempo contra ele, o presente nega-os, o passado recalca-os, o futuro recusa-os, mas que eles são pedradas contra vidros, são, sim senhor, digo a mim mesmo. 


O dinheiro tinha de se ganhar e se o pedisse tinha de o pagar, começava-se com vontade de o ter, é certo, mas não se esperava por ele. Fazia-se a horta, criava-se o reco, as galinhas, os coelhos, ia-se ao monte pela ração, a mãe fazia a costura e fazia tudo. E havia a empresa, claro, havia a empresa, que dava a casa, a luz, a lenha, que tinha cantina a crédito com desconto no cartão de vencimento, que tinha tudo, não faltava nada. O salário era tudo o que a empresa dava. Então, aí está, havia trabalho e havia um salário, meio pecúlio, meio recursos, mas havia com o que contar, o resto era o merecimento a fazê-lo, não? Mas tudo num limite apertado, meu filho, que se um homem fosse gastador ou a mulher desgovernada, algum que se ganhava logo se perdia e as dívidas carregavam. Não foi o nosso caso, mas a vida foi toda de trabalho, de segunda a sábado, só ficava o domingo para a missa e para algum descanso.