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domingo, novembro 10, 2013

O despertar do luto

Na sexta-feira, dia 8 de Novembro, desloquei-me a Raiz do Monte, lugar da freguesia de Vreia de Jales, concelho de Vila Pouca de Aguiar, para celebrar a missa de trigésimo dia do falecimento de minha mãe. Em rigor a sua morte fez um mês no dia 1 de Novembro e nesse dia eu também estive junto da sua sepultura, com minha esposa e meu pai, a depositar um ramo de flores. 

Minha mãe faleceu no dia 1 de Outubro após um período muito prolongado de definhamento físico provocado por quedas e acidentes cardiovasculares; minha mãe foi ficando impossibilitada de andar, depois foi perdendo a faculdade de conversar e finalmente a capacidade de balbuciar qualquer som inteligível. Creio que nunca deixou de ouvir nem de ver. Não se lhe ouvia um queixume, mantinha-se desperta quando se falava para ela, via e olhava as pessoas, dirigia a cabeça e ficava suspensa em si, sem que soubéssemos interpretar as suas reacções. Melhor, eu e os que mais de perto a rodeavam, a senhora que tratava dela e meu pai, considerámos sempre que ela nos perscrutava no seu silêncio, ficava desperta junto de nós e gostava de ir passear de carro ou na sua cadeira de rodas. 


Durante os últimos quatro anos eu ia todas as sextas a casa de meus pais, uma casa que eles construíram num terreno da herança de minha mãe, chamado a Mó, logo depois de meu pai se aposentar das Minas de Jales onde trabalhou 45 anos ininterruptos. Fui assistindo, semana a semana, ao apagamento de minha mãe, e aconteceu-me chorar a sua perda progressiva das faculdades na hora do meu regresso a Braga, sempre por aquela autoestrada do Alvão que liga Braga a Vila Pouca. Às sextas era, pois, o dia do nosso encontro esperado, ela estava mais desperta e eu ia sempre motivado para lhe contar as novidades e lhe cantar alguns sons de minhas actividades culturais. De tarde íamos passear, ou melhor, íamos levar meu pai à Vila para ele se aviar em matérias de banco e de mercados, ou de barbeiro e de encontro de amigos e conhecidos, Eu ficava com minha mãe, ora no carro, ora a dar voltas na cadeira de rodas quando o tempo permitia. Parávamos com este e com aquela, trocávamos repetidos; depois íamos ao supermercado e passeava com ela por entre as prateleiras dos produtos, colocando-lhe no regaço as compras, quase uma de cada vez, que íamos levar ao carrinho. 

Havia no super uma funcionária da secção de queijos e fumeiro que a cumprimentava e para quem ela sorriu até quase à hora final, era a Mónica, uma jovem filha de um amigo meu de infância, neta de vizinhos e amigos de meus pais. Aquela jovialidade foi um alento, um pequeno regalo nas relações humanas que uma grande superfície nos proporciona. Creio que a variedade de cores dos produtos expostos e a frequência da circulação das pessoas divertiam a minha mãe; havia sempre quem parasse e saudasse e assim aqueles momentos das compras valeram a pena. 

No regresso de Vila Pouca parávamos na farmácia de Jales onde meu pai se ia abastecer de medicamentos para ele e para ela, momento sempre de algum peso verbal consoante a factura. Às sextas eu dava o comer a minha mãe, ela foi comendo sempre razoavelmente, tudo liquefeito ou em papa . No dia de seu funeral, na terça-feira seguinte à última sexta em que eu lá estivera, tomei consciência dessa realidade a que o povo chama as melhoras da morte, pois então me lembrei que nessa sexta ela se mantivera sempre muito desperta e seguidora de tudo quanto se fez e disse junto dela, embora não tivesse sido dia de encontrarmos a Mónica no supermercado, seu dia de descanso de 3 em 3 semanas. 

No funeral, entusiasmei-me com cânticos e palavras e orações, recitei-lhe uns versos que criara e cantei-lhe um pranto que compusera há algum tempo. Fizemos, eu e os meus oito irmãos e meu pai e nossos familiares e nossos amigos e conhecidos e todos os que compareceram um funeral bonito, alegre, na convicção da sua ascensão ao céu e de sua imortalidade em Deus.

1 comentário:

Anónimo disse...


M ãe

A mor

E terno