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segunda-feira, agosto 20, 2012

Os dias de férias

Andei por aqui, neste ir e vir de casa para a praia de Esposende e de lá quase sempre para casa, não fosse um desvio de convite amigo ou uma ougada passeata por lugares próximos. Ocupei-me com ver e ler, também tocar e compor, que os prazeres impõem-se e pesam como obrigações. A praia esteve soberba, em termos de gente, calor, banhos e conversas, passeios miúdos e provas de comes e bebes. Em livro, andei com os irmãos Grimm e com uma série de ensaios de Claude Levi-Strauss sobre o Japão; entretanto meteu-se-me na linha de leitura um atrevimento inventivo para um caso da obra de Graça Moura Os Lusíadas para gente nova, felizmente ainda sem resultado final.

Mas as leituras mais intensivas foram no Kindle, primeiro um conjunto de contos de que terei de falar em Outeiro Seco no próximo dia 1 de Setembro, para os apresentar como Memórias do Arco-da-Velha, um trabalho editorial de Altino Rio. Depois, Meu Nome é Vermelho, um livro de Orhan Pamuk, que me fascinou e agarrou em horas consecutivas naquelas cadeiras amarelas de plástico que a senhora das barracas da praia consentiu que nós tivéssemos como equipamento extra. Esta narrativa do turco martelou-me o pensamento analógico, sempre a empurrar-me para o mecanismo da conservação das tradições a que ando folcloricamente apegado, ainda não sei bem com que fundamentos plausíveis ou com que aproximações miniaturais de guarda e transformação.

Entretanto andei por festas e romarias, no encontro de concertinas de S. Bento da Porta Aberta, em Pitões da Júnias, em Tourém, nesse encontro transfronteiriço para o qual me atrevi a criar um hino; a mesma ideia tiveram os galegos que apresentaram uma belíssima composição como hino do couto misto na voz de Maria do Céo e que tem uma evocação claríssima de José Afonso e do apelo «o povo é quem mais ordena». Lá encontrei o padre Fontes, uma personalidade institucional; gostei do seu aspecto saudável e sempre acolhedor, estivemos na sua mesa ou de sua família, melhor, de sua irmã, que nos apaparicou com um bolo de carne em que a cebola tinha uma função de requinte paladar; tive o atrevimento de lhe pedir metade para saborearmos gulosamente em grupo. No domingo, foi o evento do Sameiro que correu bem e deixou emocionadas impressões em muita gente. Agora estou atido ao disco que homenageia Fernando Alvim, irmão do engenheiro  Alvim que trabalhou nas Minas de Jales e a quem eu fui, um dia, tinha os meus 12 anos, pedir um violino para tocar em férias e ele mo emprestou depois de eu lhe demonstrar os sons de uma cantilena clássica que tinha aprendido. Vamos a ver como ocuparei o resto das férias.



quarta-feira, agosto 08, 2012

Sameiro 2012 - dia 19 de Agosto

Vamos bailar à Senhora – 4ª edição – 19 de Agosto de 2012
Danças e cantigas religiosas – uma dimensão criativa do nosso folclore
No pretérito domingo, dia 5 de Agosto, nas tardes de domingo, nome que identifica o programa que o pelouro da cultura da CMB instituiu há uns anos dedicado à exibição de grupos folclóricos do concelho, o Grupo Folclórico de Tibães apresentou um vira com o sugestivo nome de «Senhora do Ó» e o Grupo Folclórico de Macada-Vimieiro apresentou um malhão com letra dedicada aos santos da freguesia: Santa Ana, Santo Amaro e S. Bento.
Trago aqui estes apontamentos para realçar a importância do evento «Vamos Bailar à Senhora» que vai acontecer no Sameiro na sua 4ª edição desde 2004, ano em que, por iniciativa de Monsenhor Cónego Eduardo Melo, tive o privilégio de organizar, simultaneamente como projecto cultural e como conteúdo prático das actuações dos grupos folclóricos. Frequentemente, desde então, me confronto com casos singulares de concretização da dança e da cantiga como dimensões da vivência religiosa das populações, através dos grupos folclóricos ou de grupos dedicados à cultura popular, naturalmente.
Li num catecismo ou manual de doutrina cristã que quem canta reza duas vezes e quem dança reza três vezes. Viajo pela net e encontro nas diversas práticas religiosas dos povos as manifestações coreográficas e as cantigas populares integrando o seu património imaterial.
Àqueles que me perguntam se o nosso folclore tem danças religiosas, tanto aqueles que têm curiosidade pelo assunto, como aqueles que estão convencidos de que a resposta tem de ser negativa, aconselho a que pesquisem em tudo quanto é grupo, aldeia e canto ou documento e logo verão que sim, que as há e que estão presentes nos repertórios. Acresce que, para entretenimento de quem quiser estudar melhor o assunto, aproveito para esclarecer que as festas religiosas não passam sem a integração de todos os conteúdos na sua programação, pelo que devemos afirmar com propriedade que todos os conteúdos da festa são de foro religioso ou encontram na dimensão da vivência religiosa a sua plenitude de explicação.
Isto não quer dizer que tudo se deva aceitar e permitir, mas quer dizer que a vivência religiosa sobre tudo se deve pronunciar e reflectir. Não ignoro os movimentos depurativos que a Igreja, enquanto instituição criada por Deus mas gerida por homens, teve no passado e possa ainda ter no presente e no futuro, mas toda a história acumulada desses movimentos aí está para provar que as questões e os problemas existem e fazem parte da natureza social que vamos construindo. Tudo quanto se tende a afastar de um canto se vai realizar noutro, pelo que a melhor maneira de encarar as diversidades culturais é dar-lhes uma visibilidade construtiva e adequada à sua realidade, mínima que seja, ou provisória, ou esporádica.
A actual Confraria de Nossa Senhora do Sameiro continua a acarinhar esta iniciativa, portanto aqueles que a promovem e realizam devem honrar o compromisso de a culminarem com o maior brilho e a melhor competência. No dia 19 de Agosto os grupos folclóricos de Cervães, Macada-Vimieiro, Nogueira, Marrancos, Cruz Vermelha, Sinos da Sé, Cabreiros, Josephine-Morreira, Palmeira, no todo ou em parte de seus elementos, mais outros indivíduos que fazem questão de participar individualmente, como José Lages, Francisco Vieira e Rosa Ferreira, Carla Castro, darão corpo a este projecto de mostrar a dimensão religiosa das danças e dos cantares minhotos.
Na rusga à Senhora do Sameiro, uma cantiga que Gonçalo Sampaio (1865-1937) testemunhou como sendo de «genuína» criação popular, incluem-se aqueles versos afirmativos de que «a Senhora do Sameiro deita fitas a voar, vermelhinhas e branquinhas, todas vão parar ao mar», versos estes que constituem uma clara verbalização simbólica das relações entre o humano e o divino, sendo as fitas os elementos físicos dessa ligação vital, a mesma que está no crescimento das plantas – a fita do linho namora / cortar as fitas ao milho – e sendo o mar essa concepção húmida e massiva da humanidade criativa. Para além da música, o coletivo das coreografias visará representar este sentimento estético e religioso da comunidade em festa, conciliada consigo mesma e com Deus, por intermédio de Maria sua Mãe.