Pesquisar neste blogue

quarta-feira, julho 18, 2012

Expostos


Dar a camisa pelo amigo ou dar a camisa ao pobre ou dar a camisa às causas - a camisa tem um percurso político muito marcado - qualquer predicado se pode tomar como figura do corpo que se consome na vida, por ela própria e pelas suas consequências. As camisas, hoje reinventadas pela T-shirt, são a nossa pele, nela inscrevemos o mundo e elas nos situam nele. Em tempos foram usadas como página de texto ou de figurado, marcadas a linha bordada com sentido de pertença e de função, hoje verbalizamo-las com toda a espécie de mensagens, continuam a ser denúncia e a denunciar-nos, umas vezes como festa, outras como paródia, muitas como desconcerto, algumas como causa. Elas e a marca delas já dizem muito de si, mas nós teimamos sempre em que digam um pouco mais de nós.

A primeira encontrei-a numa casa de lavoura, porventura de proprietários abastados, já marcada para queima ou lixeira de monturo, juntamente com aqueles suspensórios. Expusemo-la, eu e meu grupo «Os Sinos da Sé» numa mostra de vestuário tradicional no ano passado na Casa dos Crivos, em Braga. Ficou assim suspensa, fantasmagórica de si e de seu consumidor primeiro, ou de posteriores, se os houve. Todo o encantamento a fez ressuscitar, tão cheia estava ainda de pormenores de produção e tão cheia ficou, certamente, de comentários sintomáticos.


As segundas vi-as dependuradas em Guimarães, este ano, numa praça de plátanos, ocupando a abertura de céu que as copas frondosas consentiram, numa combinação de cores atractiva e curiosa. São camisas felizes, estas que estão em cordas, penduradas pelas mangas e pelo colarinho, encaixando-se como telhas, parecendo um pára-quedas. O proprietário destas é a cidade capital europeia da cultura e determinou-lhes o uso e a função de levitarem, com tudo o que se pense ou diga ou sinta. Estas instalações são graciosas e cumprem o destino. 



Sem comentários: