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sábado, dezembro 31, 2011

Em resumo, 2011 foi um espanto!

Acho que este quadro relativo às tentações de Santo Antão se presta à minha representação do ano findo. Por mim falo, que me enganei demais e demais confiei também; se me dei conta de erros, não os evitei e se me dei por seguro em remédios, não os tomei. Arrimei-me ao que de melhor pensava que sabia e sobrevivi, mas não estou seguro de que saiba aconselhar alguém.

Esta ideia de que os meus governos foram incompetentes assusta-me e consome-me; disponibilizo-me para pensar melhor, mas fico à espera de o fazer com outros. Quanto a finanças, nem das minhas o soube cuidar: estou nas mãos de terceiros e aguardo.

De uma coisa começo a ter vontade de me redimir definitivamente: da certeza de que a minha geração, tão à esquerda quanto a pureza o permitia, falhou redondamente e não o quer reconhecer. Este ano foi um espanto!

quinta-feira, dezembro 01, 2011

Feliz Natal 2011!










Em jeito de edital

Procura-se um pobre, voluntário,
Incólume aos favores do rendimento,
Trabalhador fiel, sem vencimento,
E sempre disponível, solidário.

Além do mais, que seja visionário
Em seu exemplo e dom de pensamento,
Austero em questões de alojamento,
Sofrido, sorridente, libertário.

Ninguém vai responder a este apelo?
O édito é de todo imprevisto?
Só quem for muito burro ou bom camelo?

Direis: com tal perfil, só Jesus Cristo!
Eu sei, mas fora Ele, acho vital
Que nasça alguém assim neste Natal!

José Machado / Braga / 2011
Com os nossos votos (meus e de minha esposa)
de Feliz Natal

segunda-feira, novembro 07, 2011

Picar o boi!

Pica o boi
Se o queres para lavrar
As terras produtivas da tapada
Pica o boi
Que a picada não lhe dói
Se o queres pra carrejar
O mato espinhoso da encosta
Pica o boi
Que a picada não te rói
Se o queres para emprenhar
As vacas disponíveis da manada
Pica o boi
E aproveita toda a bosta
Que ele te deixar na caminhada
Pica o boi
Que a picada não boicota
E o boi não faz batota
Pica o boi
E não largues a aguilhada
Entre ti e o boi há uma vara
Que representa a lei que vos ampara
Se a deixares no jugo, a besta pára
Se a puseres ao ombro a besta avança
É o poder da vara que vos cansa
Vais de vara à feira
Vais de vara à festa
Até na procissão ela te presta
E conservá-la é tudo o que te resta
Chama boi à vida, ávida, sofrida,
O boi é o trabalho, é o cansaço,
A vara é o teu braço
E o boi é receptivo no cachaço
Pica-os com a mesma intensidade
Não ganhes o cagaço na subida,
Não tragas o cangaço na descida
Pica o boi que é a tua liberdade
Pica o boi
Que a picada sempre foi
A tua novidade.

quarta-feira, novembro 02, 2011

Gregos e troianos!

Recorro a esta imagem do cavalete do poço de Santa Bárbara das Minas de Jales para lembrar o tempo das minas de ouro, a profundidade a que já corria a exploração e os desvarios que as encerraram. Andam agora os garimpeiros por outros lugares, corre o preço do ouro por máximos e voltam a perspectivar-se as ilusões. Um povo tem de estudar a narrativa de suas empresas para perceber até onde pode descer ou subir a nossa ambição.

O facto de termos herdado a paideia grega deve levar-nos a desejar que eles a conheçam ainda melhor do que nós e nela se inspirem. Um povo não pode ter as narrativas fundadoras e agora transformá-las em programas de desenhos animados.

domingo, outubro 23, 2011

A velha lousa chega?

Façamos de conta que será nesse limite que vamos acabar, com ordenado minguado e liberdade de ensinar. Tudo bem, se a versão for digital, direis todos. Mas, e se a crise obrigar à versão de ardósia, se a própria escola tiver de ser em banco corrido debaixo de uma árvore ou de um coberto de chapa ondulada?

domingo, outubro 09, 2011

Dia 15 de Outubro: Lagoaça em Braga

15 DE OUTUBRO DE 2011 – FESTA DAS VINDIMAS

PROGRAMA

15:00 H – VISIONAMENTO DE FILMES SOBRE FREIXO DE ESPADA À CINTA
17:00 H – HINO DE LAGOAÇA E APRESENTAÇÃO DA OBRA
19:00 H – MERENDA TRANSMONTANA
20:00 H – INTERVENÇÕES MUSICAIS

(GRUPO DE CAVAQUINHOS DA CASA DE TRÁS-OS-MONTES
ASSOCIAÇÃO CULTURAL E FESTIVA «OS SINOS DA SÉ» DE BRAGA)

Sobre o livro: síntese

Trata-se de uma colectânea de textos de autores oriundos de Trás-os-Montes, mandada fazer neste ano de 2011 pela Comissão de Festas de Nossa Senhora das Graças de Lagoaça, freguesia do distrito de Bragança e do concelho de Freixo de Espada à Cinta, sob a direcção de António Neto e de Armando Palavras, o primeiro empresário e presidente da festa da padroeira, o segundo professor, ambos com umbilical e sentimental ligação à freguesia promotora desta iniciativa que serviu para celebrar os 725 anos de atribuição do Foral pelo Rei D. Dinis.

Ambos os promotores e autores de textos se explicam: Neto considera esta colectânea uma acção simbólica de concretização do dever de honrar pai e mãe, ou seja, uma aplicação do dever que um indivíduo tem de se superar, honrando o orgulho de ser descendente de outros que tudo fizeram para vencerem dificuldades maiores, com menos meios e menos recursos. Armando Palavras considera que os 74 autores cumpriram a missão de testemunhar a reflexão, esta prática intervencionista da cidadania que se opõe à indiferença ou ao sossego da boa vida, sobre uma região que está encriptada no imaginário português de forma singular.

Trata-se de um mosaico de conhecimento, sintetizando as dimensões da ciência e da cultura, com aberturas temáticas multidisciplinares: literatura variada, desde o conto à poesia, passando pelas viagens e pela descrição de pendor etno e antropológico, política e segurança, do país e do mundo, personalidades, mercado de trabalho, costumes e tradições, arte, música, museus, gastronomia, ciência, crítica social, programação sentimental e pessoal, para referir aquele tipo de textos incontornáveis de amor próprio e razão cega.

Trata-se de uma iniciativa original por parte de uma Comissão de Festas a Nossa Senhora das Graças, entidade já por si angariadora de fundos para cumprimento de razões de fé, mas expansiva dos seus projectos e objectivos: uma devoção fortalece-se quando busca mais conhecimento de nós, dos nossos e dos outros. Bem podem dar graças à Senhora das Graças que os compensou com obra de substância, boa para leitura regular, podendo o leitor intervalar, saltar, variar e escrever à margem ou em espaços disponíveis, que os tem.

Ao fim e ao cabo, todos os autores quiseram perspectivar Trás-os-Montes a partir de uma reflexão, como se um lugar pudesse ser o centro do universo, coisa que todos temos por certa: de onde estou penso o mundo, por onde andar penso a minha terra. Há no livro o pensamento local e o pensamento global, há o quixotismo dos moinhos de vento serem exércitos inimigos, e há o vicentismo de introduzir as novidades mal elas se cheiram no ar, há a preocupação didáctica e há a crítica acesa, há a viagem e há o regresso, há a nostalgia e há a fuga, há uma estética geral de vontade. Toda a gente quis fazer algo sobre nós, os transmontanos, os portugueses, os cidadãos da Europa e do mundo.

O primeiro conselho ao leitor é o de que abra o livro na página 351 e passe os olhos pelos autores, verificará personalidades incontornáveis do nosso destino desde antes do 25 de Abril, os mais velhos nasceram nos anos 20 do século XX, nem todos são de Trás-os-Montes mas todos foram tocados pelas vicissitudes da região ou do «reino maravilhoso, para usar uma expressão de Miguel Torga, também ele «presente» na poética da obra. Neste presente histórico marcado pela crise e pelos apelos à mudança de paradigma de desenvolvimento, há no livro muitas pedras de toque, umas geradoras de incómodo e de apreensão, outras apaziguadoras.

A imagem de Nossa Senhora das Graças tem nela própria a sugestão do livro e da escrita: saem-lhe das mãos resplendores de influência, linhas de água para rega de terras, linhas de imaginação para alimento de sonhos, sugestão de ideias para reflexão. Agora diga o leitor se este profundo arreigamento antropológico ao poder fecundante da mãe não é a chave de todo o encantamento que um livro deseja possuir.
José Machado, professor, vice presidente da CTMAD em Braga, Outubro 2011.

terça-feira, setembro 27, 2011

Os calvários do barroco.

Vai decorrer em Braga um colóquio sobre o barroco.
Não deixará de ser tomado como indício de alguma coisa que este colóquio ocorra numa altura em que o dinheiro para mandar cantar um cego se tem de pedir a outros.
Mandar cantar um cego decorre de ele ser o autor de música mais barato possível: não gasta pautas, não transporta estante, nem precisa de instrumentos: canta de cor, canta o que sabe, canta o que pode inventar. Mas canta, à espera de ser agradecido.
Todo o património barroco nos remete para tempos de prosperidade e de investimento artístico, fosse de reis ou de mecenas abastados ou de instituições eficientes na angariação de recursos, como a igreja, por exemplo. O que não deixa de contrastar com uma das temáticas patrimoniais mais glosadas: o calvário ou a via sacra.
Ainda que tenhamos de colocar as criações artísticas na sucessão histórica e elas resultem sempre de uma acumulação de aprendizagens e de influências, o certo é que o período barroco, nesta altura de crise, nos pode motivar e desafiar um pouco mais: no que toca às artes, eis uma boa oportunidade para nos interrogarmos sobre as criações que deixamos nos tempos de fartura e nos tempos de carência.

quarta-feira, setembro 21, 2011

Na escola, com a crise...

Estamos perante uma crise de inteligência e de conhecimento, não duvido. O que nos falta é QI, é razão pura e dura, é ciência na sua luminosidade metódica e nas suas preocupações de prova.

Cada vez são maiores as falhas por defeitos de tecnologia, quer na indústria automóvel, quer na informática, quer na saúde.

Cada vez são maiores os buracos na política, quer na local, quer na nacional, quer na mundial, saindo das cartolas mais depressa o erro e o descuido que a vigilância da razão.

Tudo por falta de conhecimento, por falta de racionalidade. Os critérios da iluminação do conhecimento foram sabiamente desmontados pela política como estorvos, as teorias da vontade e dos instintos sobrepuseram-se aos critérios da razão, a parolada impôs-se e chama-se pensamento politicamente correcto.

Daqui deduzo: a escola é ainda um princípio de criação do mundo.

quarta-feira, setembro 14, 2011

Que há de novo para teimar melhor?

Não há grande coisa nem grandes causas, não obstante a causa do país ser a coisa que mais parece grande, ou vice-versa, ser a causa que mais parece grande coisa.

Da escola só direi que o essencial é esta relação escolar entre nós, os professors, e eles, os alunos; após a sedução, ficam os compromissos e as distracções devem ser eficazmente evitadas e combatidas. Ora tudo o mais, fora desta relação, é distracção e não me está a parecer que as coisas tendam a melhorar: não gostava que eu e aqueles que viram no dia 5 de Junho uma nova oportunidade fôssemos vítimas de incratidão, mas...

Sem exemplos de cima, sem humildade de serviço político, sem radicalidade de métodos, não vamos lá. Para já os sinais exteriores mantêm-se: carros, mordomias, visibilidades, demoras, autoritarismos, gabarolices, dependências de TV e de comentaristas...

Não sei porquê, mas vêm-me à memória os frades descalços...

domingo, setembro 04, 2011

Parabéns, minha mãe!

As fotografias foram tiradas por meu irmão António no dia 25 de Agosto, em Raiz do Monte, no dia do 87º aniversário de nossa mãe. Brindámos à sua presença entre nós, agora dando-nos o exemplo do sofrimento absoluto no silêncio da sua intimidade. Todos temos consciência do seu estado e tudo fazemos para melhorar as nossas limitadas capacidades de intervenção. A nossa mãe foi sempre uma voz levantada para o nosso sustento e para a nossa educação, redundava os actos em palavras e destas fazia obra de alimento físico e espiritual. Porventura somos todos faladores devido a ela, dimensão que costumávamos atribuir mais à influência de nosso pai. As palavras são agora pequenas e mínimas, como as suas memórias requeridas por nossa ânsia de reconhecimento, mas é ainda total o seu olhar demorado, a sua percepção de nós e de si, a sua resignação ao que é. Queira Deus que a luminosidade de sua vela nos esclareça sempre os valores da palavra e das aprendizagens legadas por seu exemplo. Todas as lágrimas são já subterrâneas.

Em nossas festas brinda-se por todos, pelos presentes e pelos ausentes, por este e por aquele, estejam onde estiverem, sendo a palavra a chamá-los à mesa e a este encontro de copos sempre em risco de colisão excessiva. Foi meu pai quem nos interiorizou esta prática ruidosa de brindar, com elevação da voz em cadência ascendente. Os mais novos acham a algazarra excessiva, mas é assim que a coisa ainda funciona com graça.

Estão sete netos na imagem, duas filhas e é ainda perceptível a nossa Hermínia, a senhora que cuida de nossos pais. Cantámos os parabéns, houve repetição no acender e apagar das velas pelos netos mais novos, houve a distribuição do bolo por idades, com os habituais atropelamentos ou fugas, houve os elogios e o discurso do Zé, eu próprio, este ano mais mudo também, mas talvez certeiro no que disse, assim mo reparou meu sobrinho Duarte. A mãe teve de nos suportar a festa! Ó amor de mãe, paciência de mãe, silêncio de mãe!

Aí estamos nós a seguir o curso dos anos, ainda bem favorecidos pelo amor e pelo preto e branco da fotografia, que meu irmão anda sempre atrás de uma fixação de sentimentos e os dele são generosos.

terça-feira, agosto 23, 2011

Vamos bailar à Senhora 2011

Aproveito esta imagem para embraiar a síntese que faço do evento supra referido. Fiquei satisfeito com a execução dos grupos, mas senti-me frustrado com a falta de condições técnicas para o nosso desempenho: não tivemos aparelhagem de som, portanto não fomos bem ouvidos e acompanhados, não obstante o clima de atenção geral que se instalou. Se mesmo assim se ouvir dizer que tudo correu bem, não sou eu que vou contrariar a apreciação, mas no meu íntimo está instalada uma sensação de frustração e dela espero tirar lições. Falo só por mim, embora sentisse a solidariedade de reacções semelhantes. Quando de um evento se diz bem, mas depois se remata tudo com um «foi pena» ter faltado isto ou aquilo, esse conteúdo da pena passa a ser o objecto do desejo, neste caso da frustração, e instala-se como problema. Não está em causa saber de culpados, nem castigar prevaricadores: o que está em causa é o sentimento de perda, de incompletude, de falha.

Aqui fica o meu agradecimento ao trabalho dedicado dos grupos participantes:
- Associação Cultural e Festiva"Os Sinos da Sé" - Braga
- Grupo Folclórico e Etnográfico de Palmeira - Braga
- Rancho Folclórico S. João Baptista de Nogueira - Braga
- Rancho Folclórico da Cruz Vermelha - Delegação de Braga
- Grupo Etnográfico de Aldreu - Barcelos
- Grupo Folclórico de Cabreiros - Braga
- Grupo Folclórico de Marrancos - Vila Verde
- Sr. Lage, Sr. Chico Gordo e esposa, Carla Castro.
Agradeço também à Confraria do Sameiro e ao seu presidente Sr. Cónego José Paulo Abreu, à D. Emília, ao senhor Joaquim, a todas as pessoas que trabalham no santuário.

Em termos morais e em nome dos requisitos que a boa comunicação folclórica requer, já declarei à Confraria do Sameiro a minha indisponibilidade para participar como animador do evento previsto para o dia 18, o piquenicão para angariação de verbas para a cobertura do templo, porque não me concebo a animar musicalmente um repasto gastronómico que requer as condições técnicas que não foram disponibilizadas no dia 21 de Agosto.

quarta-feira, agosto 10, 2011

S. Lourenço da Armada - uma caminhada de saudade!

10 de Agosto: hoje fui ao S. Lourenço da Armada, no alto da Boalhosa, no cimo do monte, donde se vê Viana do Castelo; a ermida fica na freguesia de Gondufe, Ponte de Lima, mas a romaria está baptizada pela tradição como sendo da Armada e o lugar este ano estava cheio de arcos, novidade que contraria uma representação de abrandamento na festa, coisa que andava no ar desde que a comissão de festas, há coisa de três anos, afastara do adro da capela os «restaurantes ambulantes», vistos como pólos de atracção nem sempre favorecedores do recolhimento festivo. A polémica decorreu também da velha questão nunca resolvida da nomeação da festa, ou seja, de saber a quem pertencia fazê-la, se aos da Armada, se aos de Gondufe, tendo prevalecido estes.

Agora no adro permanecem os vendedores de doces, de brinquedos e um posto de venda de cerveja, para além do palco; os lugares de comes e bebes desceram o monte, para o patamar inferior, onde pululam as merendas e os convívios e onde eu vi dançar, da primeira vez que lá fui, como nunca pensei que fosse possível: foi um momento de meu deslumbramento com a presença viva da tradição coreográfica. Esta foi a minha primeira festa «etnográfica» nos anos oitenta, fui lá levado pelo Domingos Dias, meu colega professor, natural de Pedregais, que foi leitor em Providence, na América, falecido numa hora em que a sua força de trabalho estava a levantar um voo singular.
Deixei o carro ao pé da escola primária de Beiral do Lima e subi o monte. Ainda estava pouca gente a peregrinar, passei por um pai que já descia com o filho pela mão, mas que o levara para cima às carrachilas, «a cavalo», como disse; passei por um grupo de quatro pessoas que «merendava», um homem e três mulheres de luto, eram 9:20. A subida puxa bem, o pó solta-se, as pedras rebolam e o tojo pica. Fui à capela, tirei as fotografias repetidas, a das pontes da autoestrada e a de Viana e mais uma dos campos cultivados na encosta sul, que já é terra de Vila Verde. Já eu descia quando voltei a cruzar-me com aquele grupo de quatro e com um trio de cavaleiros, modo cada vez mais crescente de andar nas romarias. Antes de pegar no carro, comprei a rosca na doceira, fui ao café comer a sande de queijo e beber o sumol, dieta que me ficou de pequenino, quando minha mãe me levava às festas e me perguntava sempre se queria uma laranjada para o pão com queijo que ela levava de casa.


No regresso passei por Pedregais e fui à capela de S. Bento e ao cemitério, dois lugares de emoção. Fui visitar o meu amigo Domingos Dias; na mesma campa está o seu pai,o senhor Pereira Dias, e um seu irmão, falecido na Venezuela. Visitei também outro amigo, o senhor Manuel Lourenço, cunhado do Dias, casado com sua irmã Maria, emigrante em França e homem de uma simpatia contagiante. Fui a Pedregais porque dali parti a pé a primeira vez que fui a S. Lourenço, foram duas horas de caminhada, sempre a subir. Já repeti essa subida outras vezes, mas a memória da primeira mantém-se como caminho de iniciação. Em Pedregais fotografei a tradição dos arcos de romaria, «este feito já pelo herdeiro do homem que os fazia como ninguém e que até colocava a imagem dos dois santos, o S. Bento e o Santo António, colocando ainda uma caixa com pombos e flores que se abria puxando uma cordinha quando o pálio passava por baixo e as pombinhas ficavam ali ao redor do andor e as flores caíam na cabeça do santo, coisa linda de se ver, que o homem era um artista, mas o filho também fez boa obra, a cruz do alto caiu ao pôr-se o arco de pé, mas tem boa distribuição de símbolos e é branco para nunca perder a cor; era mais alto, mas assim está bem, pelo menos este, porque o homem já não tem herdeiro que lhe pegue na tradição, o filho não quer saber disto» - foi esta a história que ali ouvi.

Para lá e para cá, um homem leva o mundo na cabeça e o mundo anda nas bocas de todos: no café, uns emigrantes discutiam as vantagens da concorrência que devia haver cá nos preços dos combustíveis; lá dentro, na TV, um cozinheiro explicava como fazia os bolinhos de bacalhau e referia-se ao aumento do dinheiro no bolso dos clientes e a senhora do café, atrás do bar, dizia que o dinheiro já faltava; na rádio, os distúrbios nas cidades inglesas coordenavam-se com as nuvens negras dos incêndios no horizonte; durante o regresso, o «forum» sobre as negativas em Matemática e em Português desenquadrava-se com o bulício das bermas na estrada Braga-Ponte de Lima. A saudade começa a andar empurrada por um receio de catástrofe.


domingo, agosto 07, 2011

Uma oportunidade de reflexão


Só hoje é que soube que podia ter acesso a esta gravação que fiz para o programa «Ser Igreja» da Rádio SIM, no dia 21 de Junho deste ano, conversando com o Dr. Carlos Aguiar sobre o evento «Vamos bailar à Senhora», evento este previsto para o dia 21 de Agosto próximo. Gostava de o partilhar com todos.

terça-feira, julho 26, 2011

Exposição de Trajes Folclóricos.










ASSOCIAÇÃO CULTURAL E FESTIVA «OS SINOS DA SÉ» - BRAGA

Eis o convite enviado
Sendo lido e recebido
E melhor correspondido
Já tem o nosso obrigado

Mas se por qualquer motivo
Tal não venha a acontecer
Obrigado volta a ter
Para não ser esquecido

sábado, julho 16, 2011

Jorge Lima Barreto

Morreu Jorge Lima Barreto e eu quero que os meus leitores conheçam uma das minhas fontes de conhecimento em matéria de musicologia, mesmo sobre a música de tradição oral. Considerado na sua juventude uma espécie de «grande dirigente do rock e da pop» evoluiu para a experimentação electrónica e foi-nos digerindo os problemas de conhecimento que a música cria e aborda no diálogo com outros saberes. Paz à sua alma e que os seus livros sejam lidos e comentados. Voltarei em breve a alguns dos seus textos.

Recolhi esta imagem no jornal Público.

sábado, julho 09, 2011

Apresentação de «Zerbadas em Chaves»


Foi dia 8 de Julho, à noite, na Casa de Trás-os-Montes e Alto Douro em Braga, com a presença do autor GIL SANTOS, sob a direcção do presidente Engenheiro Correia Vaz e com leituras e notas críticas de José Machado. A Casa encheu. No fim houve pão de ló, porto de honra e bolo com a capa do livro oferecido pelo autor. Venderam-se os 20 livros disponíveis.


quinta-feira, julho 07, 2011

Zerbadas em Chaves

Dia 8 - Na Casa de Trás-os-Montes, em Braga, às 21.30.


Zerbadas em Chaves
, um livro de Gil Santos, que eu fui apresentar ontem, dia 6 de Julho, em Chaves, dia em que meu pai festejou os seus 84 anos e junto de quem não pude estar por ele se encontar em Lisboa, onde foi colocar um pacemaker. Toda a minha alegria de apresentação da obra foi-lhe dedicada, ele tem histórias que davam um livro de zerbadas ou de barbeiro, aquele vento frio e cortante das minas de jales em certos dias. As histórias de Gil Santos remetem-nos para aquele «mundo às avessas» que nos rodeia no dia-a-dia ou que povoa a nossa memória dos lugares, aquele caos de sentidos desbulhado nas palavras menos «correctas» ou mais oralizadas a gosto de tradição. Hoje, todo esse vocabulário é cada vez mais um género literário, inspirador de histórias, referente de personagens incríveis, os tais «cromos» de que fala Gil Santos. A literatura, então quando praticada por escritores que ainda se não consideram na corrente, é um lugar de redenção. Retirei esta fota de www.eurocidadechavesverin.eu/.../apresentacao-de-livro-%

domingo, julho 03, 2011

Parabéns, meu irmão João!

Hoje faz anos o meu irmão João Manuel da Costa Machado, «João Miguel» para os amigos de infância e para muitos mais que entretanto se foram acumulando. Também lhe chamaram o «smile» por aquele sorriso contagiante. Em homenagem a ele, eu e minha mulher pusemos a nosas duas filhas o nome «Miguel» e se elas vivessem se calhar era assim que lhes chamaríamos. Vive e trabalha em Lisboa. É médico, especialista de medicina interna e infectocontagiosas; recentemente foi nomeado director clínico do seu hospital. Na fotografia, estamos todos os irmãos, filhos da Sra Ana Maria Gomes e do Sr. João Maria Machado, ela natural de Raiz do Monte, Vila Pouca de Aguiar, e ele natural de Nogueira, Vila Real, ambos ainda vivos. Meu pai vai fazer 84 no dia 6; depois, no dia 18 fará anos minha irmã São, a primeira do lado direito da foto; no dia 25 de Agosto será minha mãe a fazer 87.


segunda-feira, junho 20, 2011

58!


Cumpro e vou cumprindo
este destino curioso;
segundo uns, progredindo,
na voz de outros, tortuoso;
mas eu estou concluindo
que na arte de tentar,
modificar e errar
até estou evoluindo.

segunda-feira, junho 06, 2011

Parabéns!



Hoje faz anos. Amo-a mais ainda. Já fazemos anos juntos há quarenta. Conheci-a aos 15, eu tinha 18 e ela tinha todas as graças que meus olhos sonhavam ser mulher. Não merecia todo o sofrimento que lhe veio, mas soube superá-lo e foi-se encantando com a vida. Tudo o que não temos nos faz sofrer, mas a vida foi assim. Todos os meus dias têm sido dela e os dela meus. Os caminhos daqui para a frente irão estreitando, mas hão-de ter flores a acompanhá-los. Que Deus nos ajude!

terça-feira, maio 31, 2011

As intimidades políticas

Confesso que as de Paulo Portas me surpreenderam e avanço algumas hipóteses de compreensão:

1ª hipótese: Churchill, Sofia Loren, Corto Maltese e Sharon Stone, mais a ideia de decorar a casa, mais a ideia de se sentar na relva, mais a ideia de cear, mais a ideia da secretária ser uma asa de avião, mais a ideia dos domingos à tarde no escritório, mais a ideia da desordem pessoal nos livros - tudo aponta para o espavento da personalidade em contínua surpresa com o mundo, num ir e vir de instabilidade vistosa, sugerindo ansiedades e rupturas, mas também estabilidades e compromissos... sem a pressão do tempo...

2ª hipótese: as mesmas coisas anteriores mais a referência contínua à mãe e ao irmão apontam para o homem viril e feminino, esse homem da rua e de casa, fixador de erotismos de visão, manipulador de sentimentos de pertença e de fuga, uma espécie de viajante inconsolado... sob a pressão das câmaras...

3ª hipótese: tudo junto para uma oportunidade de gozar a vida: beber e discursar, ver e apreciar umas boas pernas, viajar à procura de casos e de causas, estar receptivo a todos os encontros de ocasião... com a impressão do poder...

4ª hipótese: o acumulado, deste e dos outros, sugere que esta geração de políticos - Sócrates, Passos e Portas - é um espelho geracional: instáveis, ansiosos, apressados, iconoclastas, destemperados, conservadores, medrosos, calculistas... duplos, bipolares... É BOM QUE A CRISE LHES CAIA EM CIMA... pode ser que sobre para uma viagem de Maltese... com depressões...

(declaração de interesses: eles precisam de amigos e eu voto Passos)

sexta-feira, maio 20, 2011

O debate conclusivo

1. Eu já estava convencido de que não devia votar no PS.
2. Hoje convenci-me de que posso votar PSD.
3. José Sócrates convenceu-me hoje de que nunca mudará para melhor; o homem não se apercebe mesmo de que defende o «miserabilismo social» como solução colectiva.
4. Passos Coelho convenceu-me de que é portador de outra dinâmica, só lhe faltou responder ao descaminho de Sócrates: «sei que não vou por aí».

quinta-feira, maio 12, 2011

A propósito de andorinhas...

Quando a atmosfera começa a saturar de fumo ou de humidade, de ar poluído ou de ruído, desse incómodo de olhar e não ver ou dessa precisão aflitiva de bocejar, é tempo de abrir portas ou janelas, deixar entrar correntes de ar ou então sair para o exterior.

Um homem pode andar cansado de si próprio. Neste caso, a pergunta óbvia é a de saber que janela ou portada vai ele abrir em si mesmo se o ar que consome e o satura lhe bloqueia as entradas e saídas.

Por falar nisto veio-me ao espírito uma história contada por um escritor, Alberto Braga de seu nome, em Contos da Aldeia, um livrinho com mais de cem anos de edição: conta o narrador que indo de visita a uma senhora de bens e de dotes a encontrou, já em tempo de as andorinhas chegarem aos beirais, ainda de braseira acesa na sala para se aquecer, alegando que a primavera entrara fria e caprichosa de agasalhos. A forma de convencer uma senhora tão distinta a abandonar semelhante desiderato de aquecimento interno foi o narrador e visitante contar à dita que um dos reis Filipes de Espanha, numa altura em que também era nosso, se sentiu congestionado com a falta de ar puro, por estar submetido a aquecimento de braseira, e, ao ter pedido que lha retirassem, os ministros que o rodeavam terem entrado em tal conflito de interesses e burocracia de estado que demoraram todo o tempo do mundo a fazê-lo, o suficiente para o rei morrer asfixiado com a falta de oxigénio. No instante em que se despedia de tal senhora, que lá não fora somente por este caso de aconselhamento, mas movido pelo estado alegre e animador em que vira as andorinhas nos beirais de sua casa, o narrador e visitante ouviu-a recomendar a um criado que não mais lhe trouxesse para a sala a braseira e de imediato abrisse de par em par as portadas da sala.

Pois que seja por amores repetidos, por palavras cansadas, por hábitos enquistados, um homem ou uma mulher podem testemunhar a falta de ar. Como nas salas de aula o mesmo pode acontecer, e também nos gabinetes de trabalho e já agora, por extensão, no próprio país.

As situações de ar empestado resolvem-se com o afastamento radical das fontes empestantes, escancarando portas e vidraças, ou subindo montanhas ou mudando de horizontes.

As andorinhas chegaram, essas aves migradoras, vestidas de preto e banco, nesse fato cerimonial de estado ou de representação diplomática, mediador de conversas e legitimador de protocolos. Dizem que uma andorinha não faz a primavera, mas três já fazem com certeza. E foi assim que a nossa primavera se notou também, estando nós ainda de braseira ligada num aconchego viciante.

Pode agora a imagem já estar a induzir os leitores de que entrei em campo de pragas e de minas, espaço que se distancia de uma casa apalaçada. E ao mais não vim visitar senhora solitária. Ainda que esta mesma senhora burguesamente adormecida ao calor de uma braseira possa servir de imagem à nossa situação política, muito melhor se o criado da casa entretanto nos disser que era a última lenha que se consumia em brasas. De facto a imagem tomou conta do texto e agora é tarde para a não concretizar em corrente de ar. Os ares viciados da nossa política social requerem lufadas de frescura. Pois então vamos a tratar de abrir janelas, não se vá dar o caso de morrer outro rei asfixiado, o que nem se lamentaria por aí além.

segunda-feira, maio 09, 2011

Assim haja ventos favoráveis...

(deste lenço vos falarei mais tarde)

Mas busquei-lhe parte para dizer quanto desejo que o futuro comprove esta ansiedade de mudança. Olho para trás e vejo que a juventude me fez errar à procura de futuro. Olho para este presente e vejo quanto me terei enganado, mas reparo, de cada vez que volto às minhas criações e aos meus papéis, que ali se guarda ainda alguma força desse tempo primaveril.

Na minha escala, o percurso de rebeldia somou mais decepções que vitórias: a maior, porventura, o ter-me sentido mais liberto depois que me dei conta que fracassara como «revolucionário marxista-leninista-maoista». Esta ironia sobre mim próprio ainda me resta como ânimo. É um sarro vinificador!

segunda-feira, abril 18, 2011

Causas nobres e passos curtos!

(Da minha janela, quando os cactos florescem, todo o chão me parece corredio)

1. Eu consideraria que a humildade do jogo, num país em crise, deveria levar os jogadores a mostrarem determinação independentemente dos lugares. Mas já não conseguiremos sair deste hábito de juntar o estatuto e o poleiro.

2. Acho ridícula a treta que afirma a dificuldade de uma função e não a capacidade da aprendizagem para a exercer. Quem está no poder afirma sempre que a sua função é de difícil aprendizagem para quem começa! Já ninguém se lembra de como aprendeu!

3. Ontem não precisávamos, ontem não queríamos, hoje pedimos. O nosso azar é esta «coerência» discursiva. Quem avisou, quem esclareceu, quem fez as contas, quem previu... ou seja, quem estudou, quem aprendeu, quem demonstrou, é de quem não ouvimos falar.

domingo, abril 03, 2011

Haja soluções!

Vamos entrar em campanha eleitoral. Vamos voltar a observar os gigantones, os cabeçudos, as amazonas, os peralvilhos e os «almários» da casa.

Por alguma razão as festas populares fazem desfilar estas figuras míticas à cabeça: para libertarem os medos, para espantarem os maus espíritos, para desanuviarem ps ares, para «aterrorizarem» os mirones...

Mas há gestos e ritos na cultura dos povos que devem bater certo: usar gravata preta em funeral, chorar nas tragédias, rir nas comédias, pedir auxílio na casa ardida, aceitar ajuda na desgraça, arregaçar calças e mangas na rega dos campos.

Porque é que nenhum dos líderes políticos tem esta coerência de gestos, ritos e sinais e andam todos como se estivéssemos em festa?

quinta-feira, março 24, 2011

E agora, José?

A festa acabou?
Ou mudaste simplesmente de estratégia
Para teres as desculpas da miséria
e cuidares que fez mal quem te apeou?

Vais voltar à terra?
Vais regressar aos trabalhos de renovo
ou vais preparar a sepultura do teu povo
que saturadamente te fez guerra?

Se não ganhares juízo,
cuida ao menos de tua boa imagem
e continua a correr pela paisagem
de teu próprio paraíso.

segunda-feira, março 07, 2011

Caretos e más caras.

(Tirei da internet:caretosdepodence.no.sapo.pt)
1. «A luta é alegria» - uma canção para nos representar naquela dimensão obtusa em que somos pantomineiros: o arremedo esquerdista inconsequente: decorreu da liberdade, é certo, mas também decorreu da subversão «igualitária» dos votos. Falta-lhe ironia e sobra-lhe «palhaçada» identitária. Musicalmente, é um sincretismo de empréstimos com um refrão verbal, cultural e politicamente «incómodo»: os preços do pão, do queijo e do vinho estão a trepar!

2. A avaliação docente: o excelente deve obter-se por simples cumprimento do serviço atribuído, ou haverá «iluminados relatores» que esperam encontrar mais evidências?

3. Os caretos do governo não usam más caras, são autênticos: assustam, enganam, abusam, estragam.

4. Apreciei a justificação «pedagógica» da nossa ministra da educação: todas as medidas de corte na despesa tinham sido afinal pensadas para melhorar a educação, não para poupar, não para corrigir o déficit das contas públicas nem para despedir pessoal. Só lhe falta mesmo dar o exemplo e poupar-nos a figura!

quinta-feira, fevereiro 24, 2011

A chamada à praça!

Anda aí a correr uma petição para os cidadãos saírem à rua a reclamarem contra a classe política, justificando-se deste modo a vantagem das redes virtuais e demonstrando-se também o encanto das praças urbanas como espaços de cidadania, como fóruns do debate político.

Não comungo deste interesse imediato, nem me associo à transmissão dos recados, o que não quer dizer que me dissocie destes fenómenos contemporâneos. De facto, na sociedade contemporânea que anda a maior velocidade, torna-se urgente a criação de mecanismos de pressão que, sem caírem na demagogia e na injustiça, traduzam a vontade política dos cidadãos. Nós estamos ainda habituados aos partidos e às suas lógicas de instalação e funcionamento e ainda que possamos dispor de mecanismos de reclamação individual não nos habituámos à ideia de que sejam eficazes, de modo que começamos a ver com bons olhos estes movimentos de mobilização por causas, por emoções, por sentimentos de partilha pontual de alguns valores.


As recentes convulsões nas praças de alguns países árabes conquistaram a nossa simpatia poética, aumentaram a nossa crença na expressão colectiva, mas também nos deixaram inquietos e apreensivos. De qualquer modo, quer pelas formas de convocação, quer pelas condições de resistência e de difusão, estes movimentos afirmaram-se num sentido libertário e catártico, mas também num sentido de eficácia reclamativa, ou seja, conseguiram fins imediatos, fosse a destituição de governantes, fosse a mudança de opiniões, fosse a contaminação de sensibilidades. Nada disto os salvaguarda no futuro, até podem ser negados e cair em fundamentalismos, mas para já deixaram um rasto de simpatia antiditatorial, anticorrupção. Deixaram um fulgor de coragem!

Mas será que nós, os portugueses desta praça lusa, precisamos de ocupá-la fisicamente numa das suas capitais para exprimirmos desagrados, saturações, repulsas, e provocarmos mudanças de opinião, de sensibilidade e até de governantes? Tudo me leva a crer que sim, mas tudo me leva a esperar para ver, pois este é um daqueles casos em que eu não assumiria a liderança, mas que eu não deixaria que se não fizesse.

Vejamos: quando os partidos se confrontam com programas que eles próprios não submeteram a sufrágio, quando os cidadãos já se manifestaram massivamente contra algumas medidas ou filosofias de governação, quando as leis se fazem para todos mas só se aplicam a alguns, quando os vencimentos de uns atingem níveis escandalosos se comparados com os de outros, quando se ouvem responsáveis afirmar que não têm poderes para mudar o que quer que seja e responsabilizam o sistema pelo que não querem mudar, a gente fica em stress cívico: espera pelas calendas para que as coisas mudem ou age, ainda que emotiva e até irracionalmente?

Os desabafos perturbam as discussões, mas aliviam as atmosferas e estas é que garantem a renovação do ar que respiramos. Hoje assistimos em directo à recusa de mudança de opinião por parte de quem nos governa e de quem nos quer governar, hoje assistimos em directo a todos os mecanismos de ilusão, demora, atraso, ineficácia, hoje assistimos em directo à exibição dos luxos e das manias, hoje presenciamos ao vivo roubos, assassínios, ataques, explosões, hoje ouvimos de manhã a promessa e de tarde verificámos o engano. Este acumular de frustrações acaba por olhar as novas redes virtuais como escape a experimentar, para testar a eficácia, como janela de oportunidade cívica. Podem então os nossos governantes perante estes fenómenos manter o distanciamento e a sobranceria ou deverão tomá-los como apelo à revisão de procedimentos?

Se alguém disse que só os burros não mudam e haja porventura quem lhes admire a teimosia, estamos em boa maré de pensar melhor quanto temos feito e mudar de agulhas.
Ar livre, digo-vos eu! - escreveu Torga.

sexta-feira, fevereiro 11, 2011

Ouvir a banda tocar!

Hoje, dia 12 de Fevereiro, de manhã, estarei em Parafita, freguesia do concelho de Montalegre, na inauguração da nova sede da banda de Música, uma construção de raiz em terreno cedido pelo grande mecenas da banda, o padre Manuel Alves, natural da terra, mas vigário de Valpaços, homem escritor de muitas obras sobre o património local, polemista fecundo, pároco da palavra de Deus e dos homens.

A obra foi levada a cabo pela direcção da banda liderada pelo dr. Avelino Lestra Gonçalves, procurador-geral aposentado, também filho da terra, homem de palavra sonora e assertiva, entusiasta de sons e de viagens, barrosão de quatro costados, jogador sábio de sueca, pregador de palavras aos homens seus contemporâneos e aos seus netos quando forem grandes. Outro dirigente já teve a banda, também do universo jurídico, o dr. Custódio Montes, juiz do supremo, aposentado, agora a conquistar as graças das musas e a investir os cabedais em suas ditosas e promissoras terras. Se há graça fulgurante da presença destes líderes da banda é aquela que mantenho na memória de sempre os ver a seguirem os passos dos músicos nos desfiles, nas procissões, nos concertos, como se fossem também eles a soprar e a suar as estopinhas.

Da banda e do seu mestre deveria eu manifestar o meu entusiasmo pela dedicação e pelo arrojo de novidade que praticam! Ouço-a sempre com aquele sentido infantil de assistir ao nascimento dos sons, lembrando-me do tempo em que segurava as pautas musicais a outros músicos por uma coroa, tocassem eles no terreiro em frente à igreja, ou até no coreto improvisado. O associativismo musical, no nosso país, é um exemplo de persistência, a ver ainda pela quantidade de bandas que temos no activo e pelas que são memória de arquivos emergentes. A de Parafita é um caso de resistência, uma causa que todos têm sabido defender, desde o senhor padre Manuel Alves ao município de Montalegre e às empresas da região, desde os músicos já retirados aos actuais componentes, desde o mestre aos dirigentes. O escritor Bento da Cruz já estampou em literatura vernácula, ridente e justa, todo o carinho que a região nutre por esta banda, com uma narratividade de emulação absolutamente notável, quase mítica.

O meu programa da tarde será um misto de festa e de saudade, uma ponte entre a alegria e o sofrimento: hoje assistirei ao casamento de uma amiga, filha de meu saudoso companheiro de festas e trabalhos, o professor Rogério Borralheiro, já falecido há dois anos.

Toda a memória é uma ressurreição e este casamento mais a confirmará. Há-de compreender o leitor que o recheio desta crónica com pormenores de vida pessoal é uma necessidade de conversa, uma espécie de cerimonial de um luto contínuo, ao mesmo tempo que uma espécie de celebração da vida. Emocionam-me os casamentos dos filhos de meus amigos e colegas, vejo-os como empréstimos de personagens para as minhas compensações, anseio que eles continuem nos mesmos sonhos de futuro que seus pais e eu comungámos em muitas ocasiões.

É assim a vida e assim a não consigo evitar deste texto que é escrito de um lugar que é a escola, lugar por direito dado ao estudo das histórias de vida e à aprendizagem das linguagens que melhor a contem, que mais vivamente a exprimam, que mais a emocionem também. Nem tudo são rosas e flores de cheiro na escola, neste momento, antes pelo contrário, tudo nela está a apontar para uma negatividade excessiva e, se calhar, é por via disso que estas conversas resvalam para a festa e para as celebrações de tradição, de renovo, de esperança, como é a inauguração de uma sede da banda de música de Parafita e como é o casamento da filha de meu saudoso amigo Borralheiro. Todo o futuro precisará de músicos e aqui estão dois acontecimentos a provocá-los. Que Deus providencie os frutos merecidos, a quem tanto se entusiasma hoje em dia.

quarta-feira, janeiro 26, 2011

A biodiversidade política depois das eleições

Ora aqui está uma imagem que dá para tudo e para todos, creio eu. Meu irmão António trouxe-ma de Raiz do Monte, são as ovelhas da Irene que pastam no campo de outro vizinho, são o rebanho da proximidade, uma parte simbólica de outros rebanhos e de outros tempos e de outros campos e de outros vizinhos, mas uma realidade incontornável.

Andamos na escola com a biodiversidade às voltas, uma grande temática, uma politicamente correcta grande temática. Por isso me lembrei de a trazer para a política, mesmo sem cuidar de saber quem é rebanho, ou para que serve este, nos tropos que a política requer para se falar.

Mas o certo é que os rebanhos existem, alguns pastores sumiram-se e deixaram as ovelhas entregues à baliza dos campos, convictos de que não as haja que se atrevam a saltar e a procurar outros rebanhos.

Cada um explica o seu rebanho como pode e como lhe convém e todos se mexem e remexem em relação a um rebanho suposto maior e mais ganhador de terreno de pastoreio; todos se declaram perturbados com a presença de pastores, uns aguardam mesmo o conflito entre eles.

Pois eu assim penso: não há melhor parábola que a do pastor e do seu rebanho; não há pior tormento que o de um rebanho tresmalhado; não há melhor solução que a da recomposição dos rebanhos; não há maior necessidade que a do afastamento de alguns pastores.

terça-feira, janeiro 18, 2011

Os meus pais



Este trabalho resultou da aprendizagem em eportefólio, na minha escola, uma acção de formação que frequento para progredir na literacia electrónica.

sábado, janeiro 15, 2011

As presidenciais e o que mais vier!

Fotografia tirada por meu irmão António, na casa de nossos pais, no Natal, com as panelas no fogão de lenha.

Estamos em tempo de campanha eleitoral para a presidência da República e desde já faço a declaração de interesse de que aposto na continuidade do actual presidente, deixando assim expresso o meu sentido de voto.

Posto isto, saio-me a dizer que aguardo os abanões da crise com muita preocupação e só desejo enganar-me sobre a gravidade das repercussões que a mesma dita crise vai trazer às escolas e ao ensino. Quando digo que me desejo enganar é porque pressinto uma corrente subterrânea de frustração a crescer, sinto um movimento de toupeira irreverente a esburacar-me este chão profissional onde enterrei sonhos e projectos de trabalho ao longo já de trinta e seis anos. Desanimar agora, e desanimar seria pedir a passagem à reforma com as penalizações consequentes, parece-me fuga, receio de sofrimento maior no futuro. Fuga e receio de gente e a gente que é mais importante desafiar do que fugir dela.

Verdade se diga que eu nunca vi a escola nem o ambiente escolar em berço doirado, antes, e concretamente aqui deste lugar que é a Francisco Sanches, sempre em situação de crise, de dificuldade, sempre com problemas para resolver, fossem de instalações, fossem de falta de recursos, fossem de alterações sociológicas, fossem de reformas curriculares, fossem de mudança de lideranças, fossem de entrada e saída de pessoas. Nunca trabalhei folgado, nem de costas direitas, andei sempre em esforço intelectual, em crise de ansiedade por encontrar respostas adequadas, andei sempre em formação, fosse eu a procurá-la, fosse eu a dirigi-la, andei sempre em polémica de ideias e debate de soluções. Mas uma coisa é ter andado em crise, mas sem cortes no vencimento, e outra coisa será andar com as duas juntas ou em risco de junção e agravamento.

Vêm-me à memória as palavras de Amália Rodrigues, logo a seguir ao 25 de Abril, quando quis dar um exemplo de como se sentia por estar mal vista pelos revolucionários do país: sentado à porta da escola / onde a instrução o deixou / o professor pede esmola / aos alunos que ensinou.

Uma vez encontrei um colega em Lisboa, também já calvo como eu, que teve a feliz ideia de se referir a cada ano de docência como década de queda capilar, contando já ele ao tempo 450 anos de desgaste e achando que, pelos mesmos parâmetros, eu deveria estar a chegar aos 350 anos. Agora estarei, segundo ele, nos 570 anos de consumição, já que um ano para os humanos equivale a dez no envelhecimento de uma árvore. Na altura senti-me elogiado por estar com o aspecto dos velhos castanheiros de minha terra, ou seja, por partilhar em aspecto essa ideia mítica de que todas as árvores morrem de pé.

Um homem faz-se velho a esperar pelas novidades, um professor consome-se a esperar pelo dia em que só a sua presença desencadeie aprendizagens e só o sopro de sua voz esclareça os espíritos, e tudo em redor seja limpo, bem cuidado, equilibrado, consensual. Ó tirania das utopias, ó verdade das ilusões: a escola foi e será sempre dura de roer, a juventude será sempre perturbadoramente resistente a bons conselhos e sermões, as aprendizagens deixarão sempre o rasto de azias, de indisposições, de trambolhões e esfacelamento de joelhos.

Mas deixe-me eu de tretas que a crise se encarregará delas, reduzindo-as por certo a ninharias. Não nego que me faz sofrer esta fuga de meus colegas mais velhos para a reforma, eles, muitos, que estão com melhor aspecto do que eu! Agora é que nós vamos sentir a falta uns dos outros, agora é que nós deveríamos estar juntos para aguentar esta juventude. Lembro-me de uma história que li a respeito desse professor e folclorista que foi Gonçalo Sampaio: um dia, nesse tempo conturbado da I República, no contexto da crise que levou Sidónio Pais a assumir a condução ditatorial da chefia do Estado, Gonçalo Sampaio foi preso por ter sido denunciado como apoiante da facção sidonista, tendo-se ele defendido que só participara nos movimentos de contestação social por ver neles envolvidos os seus alunos, os jovens, entre eles os seus filhos, e precisarem eles de uma orientação avisada.

Não andaremos longe de que isto volte acontecer e todos nos vejamos em campos opostos de contestação, mas é neste aspecto que eu bem desejo enganar-me. Os mais velhos sempre foram mobilizados para as causas públicas para assegurarem melhor futuro aos mais novos, mas estes nem sempre acolhem os conselhos da moderação. Se por qualquer motivo a minha idade não for útil, procurarei lembrar-me também de quanto fui irreverente e atrevido enquanto novo. A vida é sempre esta aflição de perspectivas. (Crónica lida na Rádio Francisco Sanches, em 15.01.2011).

domingo, janeiro 02, 2011

Novo ano - nova repetição!

Repetir é voltar a pedir, repetir é tornar a fazer, mas neste voltar e tornar pode estar a novidade, até do velho e que já se considera repetido vezes sem conta. Repetir é regressar ao que já se pediu, olhar de novo e outra vez o que já se viu, dirigindo de novo a voz da reclamação, estabelecendo de novo o preço, reivindicando outra vez a necessidade, e também voltando a rezar ou orar.

A melhor imagem para toda a novidade da repetição é o nascimento de um filho e neste deslumbramento se diz tudo quanto já foi dito, reclamado, fixado, marcado, estabelecido. Aqui se canta e se rejubila por este nascimento de um menino, o filho do João Miguel e da Eliana, nossos amigos, ele irmão de nosso afilhado José Carlos, falecido há quase um ano, eles, um casal com toda a esperança de futuro. Começou bem este Natal, a 22 de Dezembro, começou bem este ano e assim esperamos que continue esta vontade de renascer, de repetir a novidade de viver, reclamando o preço a pagar.
O rapaz chama-se Francisco!