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domingo, outubro 03, 2010

O Folclore e a República

A questão de saber se o folclore (como hoje é assumido pelos grupos folclóricos) ganhou ou perdeu com o 5 de Outubro de 1910 é uma discussão interessante, embora complexa, é polémica, mas frutífera.

As perspectivas teóricas e pragmáticas que chegam ao poder em 5 de Outubro são as perspectivas republicanas e podem ser bem tipificadas a partir do pensamento dos intelectuais da Geração de 70 e, concretamente, através do pensamento de Teófilo Braga, para dar um exemplo muito significativo. QUE PERSPECTIVAS SÃO ESTAS? São as que decorrem de uma perspectiva positivista e que em matéria musical se pode traduzir por esta ideia: o acumulado musical popular é susceptível de motivar, inspirar e determinar a nova linguagem musical do progresso, do desenvolvimento, da aculturação, enfim, da nova identidade que se espera para o país: ser cada vez mais civil, mais independente e autónomo dos poderes religiosos, ser cada vez mais escolarizado, ser cada vez mais democrático, ser cada vez mais europeu, o que queria dizer no tempo ser alinhado pelos países mais progressistas da Europa. O Portugal dos descobrimentos, cantado por Camões e inspirado pela riqueza e diversidade da música popular, deveria catapultar-se para novos rumos musicais, rumos estes que já estavam a ser concretizados na música erudita de Alfredo Keil e de Viana da Mota, para citar apenas estes compositores, ou nos projectos de formação de uma Grande Orquestra Nacional e de um museu da música que tinham em Michel'ângelo Lambertini uma liderança incondicional.
 
A formação de grupos folclóricos já estava a fazer um caminho quando se deu o 5 de Outubro, fruto das «exposições» industriais que iam acontecendo por todo o lado e fruto de práticas de exibição popular da «identidade» local em procissões, desfiles, cortejos, recepções, etc.  Alguns grupos, poucos, formam-se antes da República, mas muitos que se formam depois vão buscar raízes a iniciativas anteriores.

Só que... os ideais republicanos fortemente anti clericais e persecutórios das ordens religiosas, os programas de governo mal implementados, os excessos de poder e os casos de corrupção, as diatribes políticas entre republicanos e monárquicos, as polémicas sobre o sentido do progresso e da identidade pátria, as frustrações de expectativas de desenvolvimento social, (como hoje!)... geraram muitas reacções «populares» anti republicanas e o folclore espelhou-as de um modo subtil: os trajares recuperaram modas e símbolos da monarquia, os cantares mantiveram a religiosidade, os costumes espelharam a resistência à mudança programática republicana.

Mas as coisas moveram-se: museus, grupos de animação, compositores, estudiosos e críticos, fizeram caminho e dispararam em várias direcções, logo aparecendo correntes de opinião e poderes públicos e privados a falar na necessidade de controle do povo e dos indivíduos e das suas iniciativas, o que veio a acontecer no regime do Estado Novo.

Os movimentos de recolha e de estudo das criações e produções populares experimentaram  com a República uma tensão que ainda hoje se mantém: a tensão entre o fixismo ou a reprodução mimética e a evolução criativa e dinâmica.

Uma lição a tirar nestes cem anos: os programas de ilustração do povo nunca vão na direcção dos seus promotores, mesmo quando impostos à metralha. A arregimentação é uma factura pesada!

Fotos: a 1ª refere-se à espadelada organizada pelo Grupo Folclórico de Marrancos, Vila Verde, no passado mês de Setembro, no âmbito das festas das colheitas do concelho; a 2ª dá conta da actuação da banda musical de Parafita, Montalegre, no dia 12 de Agosto, em S. Bento da Porta Aberta; a 3ª foi tirada na noitada do S. Miguel, a 28 de Setembro, em Cabeceiras de Basto.

1 comentário:

Anónimo disse...

Para além da bandeira e do hino que ensinamos aos alunos serem os principais símbolos da República identificando-nos em toda a parte do Mundo, tb o folclore,o fado e muitos outros elementos culturais ajudam a divulgar a nossa identidade.