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domingo, maio 23, 2010

Coração em Malaca

(Fotografias tiradas por Cátia Candeias nos dias 18 e 19 de Maio, no contexto da visita a Portugal de Manuel Bosco Lázaro, folclorista do Bairro Português de Malaca, líder do grupo folclórico de S. Pedro) 

Manuel Bosco Lázaro, ou Papa Joe como é conhecido no Bairro Português de Malaca e na Malásia, por ser um animador cultural, tem um restaurante pub no Bairro, mantém a liderança de um dos grupos folclóricos e é intérprete de cantigas portuguesas. A sua profissão desenrolou-se nas obras públicas, construção de estradas. Desde muito novo, a partir dos 12 anos, data em que participou na recepção em Malaca (1952) ao Ministro do Ultramar de então, o comandante da Marinha Sarmento Rodrigues, canta e anima o Bairro e arredores, uma actividade que ainda hoje é rentável para si e para o seu grupo, dado que o turismo é intensivo.

A recepção no Agrupamento de Escolas Dr. Francisco Sanches, em Braga, tal como fora a recepção a Noel Félix, constituiu surpresa e regozijo. Papa Joe cantou um fado de Coimbra, no seu português próprio, muito assumido e acolhedor.

Manuel Bosco Lázaro é autor de algumas cantigas que fazem parte do património repertorial do Bairro Português, umas de nítida influência portuguesa, outras demonstrando a mistura de linguagens entre o acumulado sonoro português e o acumulado sonoro da Malásia, naquele género chamado branio que traduz os ritmos de fusão.

Os grupos folclóricos do bairro português (quatro, ainda que de formação reduzida quando comparados com os daqui, mas à base de violas eléctricas e com o apoio de boas aparelhagens de som) demonstram, nos trajes e movimentos coreográficos, uma assimilação tipificada de traços portugueses combinada com posturas e ritmos próprios de influência malaia e decorrentes das práticas de exibição. São, a todos os títulos, funcionais no contexto turístico da fixação de traços gerais de identidade.

A Rádio da Escola Francsico Sanches (emite na Antena Minho, aos sábados, das 11.00 h ao meio-dia) gravou um programa com a presença de Papa Joe e da Associação Coração em Malaca, tendo a honra de contar com a sua presidente Luísa Timóteo e a sua tesoureira, Florisa Candeias, mãe da bolseira do Instituto Camões Bárbara Candeias, uma jovem licenciada em desenvolvimento comunitário que esteve oito meses no Bairro a promover o ensino de conteúdos em português e que para lá volta já em Junho próximo, dando continuidade a um trabalho deveras notável e entusiasmante da comunidade.

No dia 19, fomos a Freixo-de-Espada-à-Cinta onde nos esperava uma recepção inesquecível. Manuel Bosco Lázaro, cuja vinda a Portugal se deve a dois mecenas e ao apoio da Associação Coração em Malaca, fazia questão de visitar as irmãs do padre Joaquim Pintado, natural de Freixo e que fora missionário e pároco no Bairro Português (1948-1975), pessoa a quem ele deve toda a sua educação e toda a sua formação como animador cultural. As duas irmãs do Padre Pintado, falecido em 1997, a D. Aida e a D. Lurdes, conservam bem viva a memória do irmão e de todos os seus trabalhos pelo Oriente. A D. Lurdes viveu 20 anos em Malaca com o irmão e reconheceu o Joe Joe, como chamou a Lázaro assim que o viu e atentou nele.
D. Lurdes está à direita e tudo perguntou a Joe Joe, pela esposa, pelos filhos, pelos amigos, por casas e por vizinhos. Foi uma saudade viva, uma emoção indescritível, um momento porventura único e irrepetível.

Como foi emotivo outro momento, já naquela fase de uma visita em que o tempo se esgotava e o regresso a Braga se fazia tarde, por compromissos já assumidos, quando Papa Joe encontrou o senhor Francsico, sobrinho de outro padre, o Padre Sendim, que estivera também em Malaca e que lá falecera. Dois homens que se abraçaram em plena rua, chamando um pelo outro, reconhecendo-se após 11 anos, por este sobrinho, Francisco Sendim, profissional de barbearia em Freixo, ter ido a Malaca recolher as cinzas de seu tio e trazê-las para Portugal.

Entretanto foramos recebidos pelo senhor vice-presidente da Câmara e tirámos a fotografia. Foi uma porta que se abriu, numa cidade toda recheada de memórias do Oriente.

Fomos guiados pelo professor Jorge Duarte aos dois locais de memória urgente que levávamos: a casa de D. Lurdes e o cemitério. Mas este encontro com o guia foi outro deslumbramento, quer pela síntese de vistas e de momentos históricos, quer pelas palavras pausadas e amadurecidas de projectos passados, presentes e futuros. Jorge Duarte é um fazedor de memórias, quer organizando-lhes os espaços físicos de permanência, quer fazendo delas um levantamento sempre mais descritivo e rigoroso. Pelo meio e pelo caminho foram ficando lamentos de alguma insdisciplina contemporânea sobre pessoas, bens, serviços, ideias, pedras, cacos, que nos garantiram até hoje este tempo em que andamos. A ideia de um museu do missionário merece-a Freixo de Espada-à-Cinta, precisamos todos nós mais dela, hão-de requerê-la como urgente os governantes, por mais dados que se quieram fazer passar pelos critérios do relativismo cultural ou do jacobinismo de trincheira.
No cemitério estão os restos mortais de dois grandes missionários do Oriente, o padre Manuel Joaquim Pintado e o Padre Augusto Manuel Sendim, mas também o padre Massa, padre em Macau mas que Manuel Bosco Lázaro também conheceu pessoalmente.

Foram breves as horas que passámos em Freixo, idos de Braga e a ela regressados por imperativo de actuação do «grupo do mestre», ou seja, por causa de uma actuação que a Associação Cultural e Festiva «Os Sinos da Sé», de que faço parte, tinha marcada em Barcelos, para a ordem local dos advogados, actuação essa que Papa Joe queria  presenciar e para a qual foi mobilizado, absolutamente surpreendido, tendo tocado connosco. Apresentei-o com pompa e circunstância, momento único para todos e ele, munido da sua viola, cantou e tocou. Dançámos uma cantiga sua, o «Bira di bairu português», uma aquisição para o nosso repertório e que fazemos questão de dar a conhecer daqui para a frente.

Todas as palavras são poucas quando se está perante um projecto desta natureza, o de dar a conhecer a um português de Malaca algumas representações deste país ou chão que foi de seus antecessores, há 500 anos partidos para o oriente e ao longo dos tempos renovados por outros. Este projecto e esta associação Coração em Malaca tem uma persistente líder, uma espécie de alma da história que quer neste presente reintegrar todo o passado. Luísa Timóteo é uma torrente de entusiasmo, uma directriz de obras a fazer, uma vendaval de aproximações a tudo quanto possa transfigurar-nos, aumentar-nos a vontade, superar-nos o pessimismo.

Aqui está ela com o Jorge Duarte, afinal duas pedras cruciais das obras que os portugueses fazem e encontram e sonham pelos caminhos.

segunda-feira, maio 10, 2010

Os alunos com necessidades educativas especiais

Há limites e há casos, mas, no geral, os alunos com necessidades educativas especiais, motoras ou cognitivas, cognitiva e motoras, visuais ou meramente instrumentais, beneficiam da integração em turmas normais. Eu próprio já não sou o mesmo desde que tenho na minha turma um aluno com problemas do espectro autista, amadureci mais um pouco em alguns aspectos da teoria pedagógica e da didáctica, e até acho que renovei bastante em atenção aos pormenores, em termos de relação com todos os alunos.
Claro que não faço ainda tudo quanto acho que deveria fazer, pela simples razão de que não tenho tempo suficiente para preparar as actividades, já que a escola me pede demais para além do que já tenho obrigação de fazer. Mesmo os alunos ditos normais, e que se encontram muito bem preparados cognitivamente para as actividades disciplinares e não disciplinares, vão um dia mais tarde aperceber-se de quanto ficaram a dever na sua formação ao convívio com alunos especiais.

O futuro é que nos vai dar sentido às experiências da juventude e quando chegar a vez de esta amadurecer nas suas vidas, os jovens sem dificuldades vão perceber de outro modo algumas das suas particularidades. É esta dimensão do outro e da presença dos outros nas nossas vidas que nos faz ser diferentes para melhor, estou certo. Quem um dia for a uma cantina escolar e se puser a observar como comem os alunos com dificuldades motoras e como comem os alunos normais acabará mais depressa por estranhar os modos desintegrados destes que os cuidados treinados daqueles: por normalidade passa hoje toda uma teoria de desprezo pela comida, pelo pão, pela fruta, pelos talheres, pela mesa; por normalidade passa hoje toda a barbárie de gestos contorcionistas e de palavrões de muitos alunos bem constituídos; por normalidade passa hoje toda a irreverência verbal abusadora de jovens que vêem bem, ouvem melhor e mexem todos os músculos do corpo sem dificuldades; por normalidade passa hoje toda a bagunça de lixo que é deixado numa sala de aula ao fim de noventa minutos.

Enquanto a os alunos com NEE requerem uma observação minuciosa para verificarmos os seus progressos, os alunos ditos normais mostram-nos, sem qualquer esforço de observação, um esbanjamento de experiências e uma perda de oportunidades.

sábado, maio 01, 2010

Deixei de ser sindicalizado!


Dia 1 de Maio de 2010

Na segunda-feira, entregarei na minha escola uma carta a pedir a minha anulação como professor sindicalizado no SPZN. Fui o sócio 15250. Fim de um percurso e de um modo de o fazer. Também aqui, volto à condição de ex. As razões são simples e já estavam anunciadas desde as lutas do ano passado. Quem ler os meus textos da altura, lá encontrará uma deixa sobre a matéria. Dizia eu que ou a luta me marcava, ou eu tomaria outras decisões. Uma delas é esta e a quem me perguntar porquê só agora terei de lhe contar a demorada espera por respostas a quem de direito. Todos os processos da minha inscrição foram breves, todos os processos de desfiliação foram longos e sofridos. Vou fazer 57 anos. A minha carreira no SPZN não tem nada de relevante para além da pertença ao rebanho, ainda que eu lhe ache dois ou três momentos relevantes: quando fui delegado sindical na minha escola, quando me candidatei a umas eleições locais, quando fui a um Congresso e o abandonei por discordar da adesão à Central Sindical, quando deixei de pagar quotas e depois fui amnistiado. Considerei que a Plataforma Sindical fez um trabalho satisfatório, mas cedeu inexplicavelmente no fim, num acordo cujos contornos ainda estão mal explicados. Tal como a classe política do partido que nos governa, a classe sindicalista de poder não está à altura das circunstãncias. Não me filiarei noutro sindicato. João Dias da Silva ou Mário Nogueira são parte daquilo que eu recuso.