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sábado, abril 10, 2010

Voltando às palavras como pedras...


(Fotografia tirada por meu irmão António, na Rua do Anjo, em Braga, no decorrer da procissão do «Ecce Homo» - os fogaréus iluminam a noite, ou seja, são a pequena luz nas trevas.)

Volto ao tema, aqui trazido pelo comentário ao meu último artigo, comentário esse que se interroga sobre se a exigência de «ser o melhor» está inscrita no espaço público contemporâneo, concretamente na escola, mas aqui já o comentador passou de «ser melhor» para «dar nas vistas».

Eu não creio que esta exigência faça parte da sociedade do espectáculo, ou seja, no espaço público contemporâneo não descubro a presença de uma ansiedade de ser melhor, de ser mais profundo, de ser mais reflexivo, de ser mais descobridor ou mais criativo, mas sim, e antes de mais, descubro a exigência de «ser mais visível». A exigência de «ser melhor» opera nos limites morais íntimos de cada ser humano e quando se exterioriza, manifesta-se em resultados que nem sempre obrigam os outros a notá-los. Hoje, concretamente na escola, por força destas lógicas de liderança individualizada e de apresentação de dados exteriores positivos, a existir, ela aparece, de facto, transmutada na exigência de «ser o mais visível». O problema começa então em saber se à visibilidade corresponde a qualidade intrínseca ou extrínseca de ser melhor. Não creio. Pego no exemplo da violência escolar, no caso da morte do professor de música, até para comentar uma pequena passagem da entrevista recente feita ao professor Daniel Sampaio (já pode o leitor começar a ver a minha visibilidade de implicação).

Toda a visibilidade contemporânea visa desculpar, compreender até ficar sem razão para julgar. Dar nas vistas é em primeiro lugar arranjar uma explicação que não traumatize. O professor de música deixou escritas palavras acesas sobre o seu sofrimento. O seu acto de pôr fim à sua vida, deixou-o ele inscrito violentamente na sua situação escolar: o seu grito, a ser ouvido, dever-nos-ia comprometer com a compreensão da sua «doença». Ora, e deduzo que é isto que DS quis dizer, a sua doença é um obstáculo à sua comprensão. DS torna-se mais visível do que eu, e do que todos os que quiserem compreender a tragédia pessoal daquele professor, ao retirar-nos precisamente o argumento da doença: o professor era um doente, andava em tratamento psiquiátrico, já tinha 50 e tal anos... logo, a associação entre o ambiente escolar e a sua morte não pode ser feita. Se formos atrás das explicações para outros problemas, como o caso da morte do jovem Leandro, vamos encontrar esta mesma «razão da visibilidade», uma espécie de razão estratégica da sociedade do espectáculo: fazer aparecer uma explicação que não traumatize ninguém, nem a vítima, nem o carrasco, nem a assistência.

1 comentário:

Anónimo disse...

Li com atenção a entrevista de DS, e tb costumo ler alguns dos seus livros, até porque muitos temas abordados me dizem directamente respeito uma vez que no dia-a-dia educo/ensino crianças/jovens.
O meu comentário ao texto foi apenas uma visão actual e pessoal de algumas vivências escolares dos últimos anos. Talvez deixe escapar alguma mágoa de tanto fazer e ás vezes parecer tão pouco...