Pesquisar neste blogue

segunda-feira, agosto 17, 2009

Leituras em férias

(Fui aos meus arquivos de viagens buscar esta foto, tirei-a em Maiorca, tomei-a como representação da nora ou sucessão de ciclos na corrente.)

1. Terras da Nóbrega e Memória Social I, de Fátima Lobo, Edição da CM de Ponte da Barca, 2005 - comprei-o nos escaparates do Turismo barquense; li-o de vessada, desculpei as gralhas, tirei duas notas de influência, uma de Estrabão, que é citado assim a p.33: «Os Lusitanos... são alegres e galhofeiros, dançam e cantam aos seus deuses a noite inteira, com toda a família...): fiquei-me por esta referência ao facto de até as festas aos deuses terem um carácter de empresa familiar, o que pode ser um bom incentivo à leitura dos nossos eventos populares e à compreensão do nosso folclore. Outra, na p. 93, é uma citação de peso para fazer compreender melhor as leituras da homogeneidade cultural, a autora invoca os seus autores Fentress, J. & Wickham para com eles dizer a propósito dos povos das terras da Nóbrega: «há grande homogeneidade nas ideias expressas; as ideias pouco convencionais correm o risco de não serem de todo compreendidas. Assim, a inteligência manifesta-se, não enunciando novas ideias, mas usando a reserva tradicional de provérbios e ditados de forma expressiva e compondo canções cuja forma e conteúdo são rigorosamente ditados pela tradição

2. Jesusalém, de Mia Couto, Editora Caminho, 2009 - Li-o de três serviçadas na praia de Esposende, entre idas aos bares e demoras na areia. O velho e novo drama dos indivíduos e das nações que querem esquecer um passado e construir um futuro, a revelha neura do homem contra si próprio, entre apagamentos da memória e espasmos dela própria para se explicar. Fiquei com a ideia de que Mia Couto continua um inventor de palavras e de narrativas, com esta a bater mais no fundo do drama humano: o homem a debater-se com as consequências e os pressupostos da sua liberdade: fugir sem ter para onde e para encontrar sempre o que se não quer, ir à procura de certezas e construir dúvidas, adoptar um estilo de vida de plena confrontação com todos, tomar a natureza total por mestra e madrasta, tudo com um jovem narrador que entretanto vai fazendo entre destroços a sua peregrina educação.

3. Portugal, Ensaios de História e de Política, de Vasco Pulido Valente, Aletheia Editores, Lisboa, 2009 - uma prosa que é um espanto, geradora de interesse, espevitadora da análise, desafiadora da compreensão; mais do que a história, interessa a leitura ou interpretação do autor e mais do que estas interessa a linguagem da escrita: uma vernácula torrente de bem escrever. Já num livro anterior, Glória, ficara convencido de que a linguagem estruturada em discurso é o desafio do autor: o que sobra é que além do estilo há muita ideia fresca a fazer caminho. Ficaram-me apenas na reserva as omissões àquele movimento de que fiz parte e que acho que teve algum papel no empurrão de Soares para a Fonte Luminosa, qualquer coisa parecida com uma boca do grande educador da classe operária da altura «de leste não vem nada que preste», mas VPV não faz fretes destes a ninguém, de facto.

4. A propósito das listas dos partidos:

Os lugares de assento
São de acento esdrúxulo:
Uns por herdamento,
Outros, osso e músculo.
Uns de brilho intenso,
Outros de crepúsculo.

Os lugares de assento
São de acento grave:
Alguns com tormento,
Outros sem entrave.
Uns de comedimento
Outros de alarve.

Os lugares de assento
São de acento agudo:
Alguns dão sustento,
Outros gastam tudo.
Nuns sobra o talento,
Noutros o descuido.

quinta-feira, agosto 13, 2009

Projecto MALACA

(Esta foto veio de Malaca e representa uma parte do Painel do Regedor com a vice-presidente da Associação «Coração de Malaca» Maria João Liew; ao centro Mr. Michael Banerji, vice-regedor).

Dizem-me que a foto documenta bem o entusiasmo que existe no Bairro com a chegada em breve de dois colaboradores, a Cátia Candeias, que vai para ficar oito meses numa missão de ensino de Português, Kristang e Inglês, apoio ao projecto de Folclore, etc. e eu que vou por vinte dias para uma oficina intensiva sobre o «nosso» folclore, o nosso de cá e o deles que tomarei como nosso e o nosso que desenvolveremos juntos certamente, ou não fosse o folclore uma linguagem de contactos civilizacionais.

domingo, agosto 09, 2009

Só ontem soube

O pintor Nuno Barreto faleceu no dia de S. João, a 24 de Junho deste ano de 2009. Só ontem soube e quem me disse situou a sua morte há mais tempo ainda do que foi. É já o segundo amigo que morre no dia de S. João: em 2008 faleceu no dia da festa o compositor Joaquim Santos. Volto atrás e coloco Nuno Barreto nesse dia de labirinto festivo, tal como só agora descobri a sua galeria virtual e pude acompanhá-lo, neste silêncio violento que me foi imposto tanto por minha incúria da imprensa, como por falta de quem me podia ter avisado. Contactei com Nuno Barreto de algum modo intensamente nos anos de 1986-88 no Museu Nogueira da Silva, em Braga, embora o conhecesse de há muito tempo, desde antes de Abril de 74 através de quadros seus, e depois de Abril neste movimento cooperativo que deu origem à construção da Cooperativa de Construções e Habitação Bracara Augusta, portanto à casa ou andar em que vivo. Escrevi para ele um texto de catálogo de uma exposição onde os labirintos assumiram pela primeira vez uma figuração simbólica do mundo, de nós e de si próprio. Tenho três obras dele, duas serigrafias provas de artista e um acrílico, pequenos, mas bem significativos das temáticas que abordou. Se na altura falei muito sobre ele sobre a sua pintura como «cartoon» das realidades, hoje ainda mais me vinco a esta ideia: toda a sua fragmentação do quadro é uma fragmentação do real, e toda a fragmentação do real é uma vitralidade da apreensão dos sentidos. Todos os objectos da pintura são palavras polissémicas, todas as suas palavras só na pintura encontram mais densa significação. Pode a sua obra ser lida pelo cómico, mas deve-o também ser lida pelo trágico, tomando a ironia ora como movimento de aviso, ora como epitáfio, de complexidades crescentemente ameaçadoras, umas naturais, mas outras, a maioria, engenhosamente manipuladas pelos poderes económicos e políticos dominantes.
Manifesto, por este meio, o meu pesar e o de minha esposa a todos os familiares do Nuno Barreto, à sua esposa Angélica e às suas filhas, na certeza de a sua memória e a sua obra terem sido, e poderem vir a ser cada vez mais, uma luminosa contribuição para a nossa esperança de futuro.

quinta-feira, agosto 06, 2009

Em férias!

A foto foi tirada no jantar de anos do António Castanheira, na Casa do Professor, bom lugar para estes eventos (4 de Agosto). Vão-nos pesando os anos, mas tudo temos feito para os merecer. Aqui estamos nós, eu e a Tininha, velhos amigos do António e da família, que entretanto foi crescendo e agora já tem a netinha Matilde. Foi uma festa feliz!

As férias são tempo de descanso, de sonos reparadores e de viagens ou passeios provocadores, coisa que se tem conjugado de modo muito livre, à volta de nós próprios e um dia ou outro para o pé do mar ou até Raiz do Monte, já ali. Não falta que fazer nem falta para onde ir, mas nem se faz nem se vai e onde se fica, a conversa ocupa-se de fazer as vezes. De qualquer forma o tempo fica cheio e corre favorável: pelo correio chegou um apelo quase irrecusável de ir eu até Malaca no próximo Setembro, coisa de que ando a tratar e, se for o caso, de que falarei depois.

Ao mar, ali a Esposende, já fui por horas, branquinho de interior, mas já de lá vim corrido com o vento. Entretanto fui a Guimarães ver a Marcha Gualteriana, coisa que eu andava há anos para saber o que é e como corre: vi que chegue para anos futuros, um misto de pagode e de crítica, bem organizada, é certo, vivida com empenho de actores e multidão de curiosos, mas isso mesmo: um intervalo urbano. Fui também a Vila do Conde ver a feira de artesanato, peregrinação quase obrigatória e sempre bem achada: gostei de todas as peças a concurso e apreciei sinais de renovação artesanal, dei apreço à teimosia e repetitividade, entusiasmei-me. Passei por Ponte da Barca, evoquei o fado de Coimbra na voz de um amigo recentemente desaparecido, advogado, cujo nome não consigo lembrar, animador que era das melodias populares e das quadras nos salões da velha canção do Mondego, depois passei pelos Arcos e por Ponte do Lima, terras que espelham um país em desenvolvimento, terras que são sempre lugares a descobrir.