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terça-feira, setembro 29, 2009

Projecto Malaca XV

Fotografia com Gerard e Noel Felix a cantarem. Sobre Noel Felix e a sua obra musical e poética voltarei a falar porque ele representa toda uma história de sedimentação da cultura do Bairro Português. Vi-o no Bairro sempre envolvido com a juventude do grupo da Marina, a transmitir as suas canções e a vincar modos de interpretação. Tocámos juntos, a «Jingkli-Nona» e o «Morisco», melodia e ritmo, aprendi a dançar o branio, comprei depois um pijama para a «performance» ficar mais surpreendente.
Nas despedidas procuram-se as frases de regresso, um «até sempre» que se dê a sentir como até à próxima e esta seja já amanhã. Mas as palavras têm o sentido delas próprias e o de que podem ou não dizer, elas dão conta de tudo quanto sofrem para se exprimirem.

Mas se há pessoa de quem devo falar agora e no futuro é deste Homem, o homem «full», completo, íntegro e profundamente humano que nos recebeu, a mim e à Cátia, que aceitou a Cátia como hóspede, que nos proporcionou todas as condições de uso da NET em sua casa, que nos alimentou, que nos levou a passear, que foi um interlocutor imprescindível. Com ele de tudo falei, desde os projectos do bairro à vida política e pessoal. É um estratega, um profundo conhecedor da vida e das pessoas do bairro, vice-presidente do painel do Regedor, perspicaz no conhecimento da política malásia, marinheiro do barco, seja por flutuação de superfície, seja por aceleração em águas fáceis, seja por cautela em profundidades; acima de tudo, uma dinâmica de «portuguesidade» que é respiração: mais conteúdos de português, mais futuro; mais conteúdos de «localismo», mais futuro. Angariador de dinheiro para as festas, sabedor da burocracia para apresentar às autoridades, conhecedor de virtudes e defeitos, ele sabe navegar e tem a paciência de o saber fazer. É rico?, pareceu-me que o era por esforço denodado, pois as suas empresas na área do hardware funcionam em pleno, tem por essa via os recursos pessoais adequados à hospitalidade, as condições favoráveis ao funcionamento de vontades. Tem uma família e tem uma grande mulher, profunda conhecedora do vocabulário «kristang» ou português de Malaca, eficientíssima dona de casa, companhia de ternuras e de atenções. É Mr. Banerji.

Aqui senti uma família ao ritmo de um projecto, como senti o projecto ao sabor da vida, sem as pressas e as angústias que normalmente gente assim colocada como nós tem tendência a dar-lhes e a exigir-lhes. Conhecedores do clima, sabem como as tempestades passam, sabem como os dias correm. Bem-hajam e que Deus lhes dê o dobro do que deles recebi, que nesta palavra dobro deixo todos os multiplicativos.

Aqui está em primeiro plano Mrs. Agnes, com a Cátia. Todos os sabores de comidas várias me deu a provar, com ela toda a orientalidade gastronómica me fez sentir bem. Aquele «spicy» é um tratado de memórias e de ensaios, mas é uma necessidade. Aquele recurso do chá chinês é uma sabedoria, o seu café foi sempre uma xícara de motivação. Ó minha mãe que tanta saudade me lembrou e ali a vi presente, que ela também assim faria a outros se pudesse!
A fotografia da emoção final: a foto de conjunto na hora do adeus. Uma incontinência de lágrimas e de apertos. Foi assim e ainda não passou. Serei desta fragilidade, mas o «strong man» claudicou na hora.
Em primeiro plano a Cristiana Casimiro, a amiga da Filomena Veiga aqui de Braga, as duas pessoas que me congeminaram o mês de Setembro, este Setembro da Senhora da Peneda e da Senhora dos Remédios a que não fui ou que lá vivi. Todas as romarias me foram úteis, António Castanheira, outra presença diária nas minhas idas e vindas no Bairro Português. Sempre tiveram alguma lição as nossas caminhadas, António, só espero mesmo que sim.
Por Malaca ficam estas duas caras lindas, a Cátia no Bairro portuguêss e a Cristiana Casimiro na Universidade de KL, ambas dedicadas ao projecto, ambas motivadas para o aumento significativo dos conteúdos em português, o nosso e o de lá, que são irmãos de sangue e atravessados de experiência.

Eu fui recebido assim no aeroporto de Lisboa, pela mãe da Cátia e pela Luísa Timóteo, presidente da Associação «Korsang de Malaca», uma torrente de energia e de voluntarismo. É com estes pequenos gestos que se movem as montanhas.
Obrigado e vamos à vida que tudo continua a precisar de obra.

segunda-feira, setembro 28, 2009

Projecto Malaca XIV - Fotografias

São imagens do convívio de quinta-feira à noite, dia 24 de Setembro, uma festa que Mr. Banerji e Edward Kennedy, membros do painel do Regedor, acharam por bem fazer nos moldes mais informais e relacionais; ocorreu no espaço frontal à casa do Edward, ali pertinho do Índico, pertinho do jetty, cais que entra pelo mar dentro e onde se reúne a juventude durante a noite: ouvia-os do meu quarto, também ali na casa da Gene, a viúva de Gerardi Fernandis, um músico e um estudioso Luso-malaio. Esteve presente o regedor, Mr. Pedro Gomes, estiveram presentes quase todos os dançadores dos grupos, faltaram alguns pequenos do grupo de George Overee, ele próprio também ausente, o tal grupo do museu que já mostrei noutro lugar.














Aqui estão o Joe Lazaroo (Papa Joe), à esquerda, e Edward, imponente. Papa joe é líder de um grupo folclórico, é uma personalidade da cultura local, um músico autor, mas também um peculiar intérprete de canções portuguesas que ganham um colorido especial na sua voz. O Edward já foi o Michael Jakson nos seus tempos de juventude, hoje é um animador cultural, um performer, um comunicador nato, fala cinco línguas fluentemente, inglês, malaio, mandarim, cantonês e tamel, resolve tudo quanto é logística de som e de música, vende artesanato, maioritariamente «country», tem iguanas emcasa, tem gatos persas, tem pavões, é um homem de sete ofícios e de uma disponibilidade contagiante.














Aqui está a Marina, educadora infantil, líder de um grupo folclórico, com o marido e filhos, ela uma animadora da juventude, ele um organizador atento e gestor de boas relações, ambos incansáveis.

Aqui está um grupo especial, em primeiro plano a esposa de Edward, a faladora de português com o sotaque mais parecido ao nosso, mas cantante e alegre; à direita a Gene, minha anfitriã, logo a seguir a Cátia e a Cristiana Casimiro, professora na Universidade de Kuala Lumpur, depois a Agnes, esposa de Mr. Banerji, a seguir ele próprio, a seguir o Gerard, líder de um grupo, depois o Kevin, um dos dançadores, depois o português Manuel Vieira que ali apareceu naquele dia, depois, vindo de trás para a frente, sentado, o Noel Felix, a Marina, o marido desta, um sobrinho de Edward. Tudo o que eu possa dizer desta gente pode soar a circunstância, mas só eu sei quanto lhes ficarei a dever de gratidão e reconforto. A familiaridade constrói-se com o tempo e assume-se nos gestos e nas palavras. Não acabei a noite sem lágrimas, claro está, mas nessa noite também o Índico se desfez em trovoada e descargas de electricidade. Eu adormeci de janela aberta, ventoinha ligada e sossego de consciência. Nesta noite não se me cobraram fantasmas nem fantasias e destas precisava eu, mas tinha longe quem eu queria.

domingo, setembro 27, 2009

Projecto Malaca XIV

Escrevo no aeroporto de Amesterdão, (sem alguns sinais gráficos de escrita que me fazem falta, mas depois corrigirei). São 7.45 da manhã, cheguei aqui vindo de Kuala Lumpur, às 5.35, deambulei e conversei com o Manuel Vieira, um português da Cova da Piedade, (a residir lá porque na verdade é de Penafiel) que encontrei no Portuguese Settlement ou Bairro Português de Malaca. Ele acabou por vir no mesmo avião mercê de umas facilidades ou oportunidades de que goza e a que se submete por ter trabalhado em aviões na TAP; vai ficar na Holanda em casa do filho e depois lá seguirá para a pátria mãe quando lhe aprouver. Depois falarei mais deste homem singular ou igual a todos nós, mas com palavras mais consumidas pela vida, diz-se ele bipolar, portanto o contexto de compreensão aqui fica apontado.

Ontem, em KL o senhor Baudeville, um condutor que nos serviu várias vezes e que serve os portugueses destas paragens, no caminho para o aeroporto acabou por me dizer que havia também um grupo de descendentes de portugueses na Associação Euroasiática local que gostava de ter falado comigo a propósito de danças e cantares, foi pena que o recado só tivesse chegado na hora da despedida. Em KL ficámos dois dias, eu e a Cátia, para vermos a cidade acompanhados pela professora Cristiana Casimiro, leitora de português na Universidade da Malásia, há já sete anos. Estivemos também com a Maria Lew que nos acompanhou na visita às torres petronas, um ícone local e asiático, agora já não o mais alto, mas merecedor de atenção e visita. Subimos e o céu aproximou-se, sem deslumbramento, que esse tem-se cá em baixo, olhando para cima e vendo as linhas da arquitectura das torres. Comprei uns livros e umas revistas, para acumular os receios da bagagem no aeroporto, receios que quase se concretizaram, mas depois a funcionária la acabou por ser aconselhada a deixar-me trazer o computador e a mala de mão e maleta de tiracolo e um saquito com os livros, outros vi ainda mais pesados e os remorsos ficaram no caminho. Foram 11 horas de voo, dormindo entre duas de parecença chinesa, apertado pela estreiteza dos bancos e das filas, entretido com a música, com a leitura e a dormir, por sinal bastante, só interrompido pelas assistentes de bordo com as comedorias e refrescamentos de cortesia e obrigação.

Toda a viagem me doeu o joelho direito, dor que senti na véspera a dormir no sofá, devo ter batido com o joelho e ficou-me a doer, ou será mazela antiga, do ténis, que os meus joelhos foram submetidos a trato de carrasco estes dias, quase com prazo de validade, tal foi a certeira pontaria da dor nesta recta final. Às doze e quarenta então embarcarei para Lisboa, onde a minha menina me esperará por combinação mútua para ver se ainda vou a tempo de votar. Também me perguntaram na Malásia porque é que nós os portugueses estávamos descontentes com o governo ou estávamos sempre descontentes com os governos. Expliquei o melhor que pude e soube, sem tempo para grandes pormenores, mas com argumentos comuns à interlocutora que os tinha também associados à política local. As políticas e as crises políticas andam parecidas em todo o lado, sempre com o jogo da liberdade como limite da parada. De qualquer modo quando se tenta explicar aqui que o voto pode estar a ser condicionado por uma zanga pessoal contra uma ministra da educação, as pessoas sorriem, mas tambem apontam casos semelhantes nas suas vidas ou relações democráticas. Ou seja, a zanga pessoal como embirração poítica é uma razão plausível.

Amanhã colocarei as fotos da despedida do Bairro Português. Custou-me e as lágrimas provaram-no, um homem deixa-se fragilizar por gestos de simpatia e eu não resisti. Acabou por ser muito intensa a minha relação com esta gente, miúdos e graúdos, muito marcada pela familiaridade progressiva, pelo temperamento de aceitação dos factores imprevisíveis, por humildade de carácter.

Já o disse a minha mulher, mas agora escrevo-o aqui, porque dele tive as mais intensas saudades, se houve pessoa de quem senti falta foi de meu amigo Borralheiro, pela simples convicção de que ele haveria de me dar troco e conversa que bastasse sobre esta singularíssima experiência. Eu bem sei dar valor a todos as linhas de escrita e às conversas iniciadas e nunca acabadas, mas que o Borralheiro havia de fazer disto motivo de confissões e jorradeira de capítulos, não tenho dúvidas, tenho a crença absoluta.

Hoje, dia 28, entrei na minha escola Francisco Sanches, aqui em Braga e comecei as aulas; os alunos receberam-me com perguntas e ficaram agarrados às minhas narrativas, depois lhes hei-de mostrar imagens e filmes, tomara eu que eles sintam a «portuguesidade» daquele Bairro de Malaca. Pus as fotos possíveis.

quinta-feira, setembro 24, 2009

Projecto Malaca XIII

(Foto emblemática da entrada para a praça portuguesa, um espaço de bares e restaurantes onde está também o museu, a igreja, a sala «escola» de computadores. Tudo virado para o estreito de Malaca, o Índico. )



Está a terminar a minha presença aqui no Bairro Português de Malaca. Hoje vai realizar-se um convívio, celebrando à mesa o que se fez no terreno. Amanhã seguirei para Kuala Lumpur, com a professora Cristiana Casimiro, que lecciona na Universidade local há seis anos, com a Cátia, que depois regressará ao bairro para cá permanecer oito meses; em KL, no sábado, apanharei o avião para Amesterdão, depois para Lisboa, onde espero chegar pelas duas ou três da tarde de domingo, seguindo então para Braga. Ainda vou com a esperança de votar!
Deixo esta gente e esta terra com saudade, fiz amizades, aprendi imenso sobre mim e sobre nós. Vou mais motivado e mais entusiasmado com a vida. Espero saber comunicar a todos o que aqui vivi, levo imagens, levo recordações. Não foi um apogeu de carreira, mas foi uma etapa significativa, humilde e demasiado exposta aos outros, uma verdadeira viagem fora do meu quarto. Não fiz tudo bem, fui desafiado a fazer e a mostrar, espero ter deixado também a mesma marca de humildade que aqui encontrei, a mesma altivez de espírito que serve de resguardo às críticas e a mesma paciência de esperar pelos frutos das árvores.
(Foto tirada pelo Edward, com a sua iguana, de quatro que tem e que se passeiam por sua casa; facto absolutamento impensável para mim, aqui tornou-se possível; a mesma experiência com a comida, com 0 estilo de vida. Em Roma sê romano - princípio que é ancestral para dizer tudo sobre a nossa adaptação.)
Se amanhã ainda tiver tempo colocarei imagens e impressões da festa de despedida. Agradeço a participação dos leitores, cujos comentários apreciei. Obrigado a todos, à Associação «Korsang de Malaca», à Cátia, a Mr. Banerji e sua família, à Jenny, em casa de quem fiquei instalado, aos grupos e seus directores, ao Regedor Mr. Pedro e ao comité do Bairro, ao meu grupo, ao meu Director, ao Estado Português, à minha família, ao meu amor.

quarta-feira, setembro 23, 2009

Projecto Malaca XII

(A fotografia documenta a reunião do comité do Bairro Português, a que assistimos por cortesia do Regedor Mr. Pedro Gomes e de Mr. Banerji)

O Portuguese Settlement de Malaca é um Kampung, e esta palavra remete para campo, quase com todas as conotações que em Portugal damos à palavra: o campo como lugar exterior à cidade, como lugar onde a casa e a horta se juntam, o campo como o local íntimo e de vida entregue a si própria, o campo donde saem as pessoas para trabalhar na cidade e quando voltam têm mil e um trabalhos para fazer na casa, ou nos campos e campos aqui pode ser o mar, a pesca, a apanha de camarão, o campo com a praça central onde ficam os cafés e casas de pasto, aqui restaurantes, onde fica muito perto o mercadinho, a igreja, o campo dos vizinhos de porta, o espaço de andar à vontade, de parar no meio da rua a conversar, o campo como lugar nosso por oposição a outro campo que seja o lugar de outros, o campo que tem um comité alargado de gestão e organização, o campo que tem grupos folclóricos, com os seus cantores e dançadores e músicos, etc.
Dizer-se que no conjunto da organização política da Malásia este Kampung é um acantonamento forçado, depois de as pessoas terem sido obrigadas a optar por ficar ou partir, também estará dentro da verdade, como dizer-se que este Kampung desempenha no conjunto da organização pol´tica da malásia um caso bem sucedido de pluralidade, de liberdade, de democracia. É esta última dimensão que mais interessa aos portugueses, sobretudo ao comité de bairro ou painel do regedor, o saberem e o sentirem que, mais para o bem do que para o mal, o bairro português é um caso que demonstra a sociedade plural, o equilíbrio de gestão multiracial, o exemplo da boa vizinhança. Como em toda a parte a política está embrenhada e há os casos de partidarismo e de suprapartidarismo, hás as estratégias de conveniência e as de opção radical, mas nota-se no conjunto uma linha de bom senso e de consenso social, funcionando o folclore como factor de visibilidade desta linha.
Embora todos saibam quem nós somos,
Nas danças e cantigas que mostramos,
E saibam o sentido que nós pomos
Na língua em que também nos expressamos,
No quadro multi-étnico de Nação
Persistem as cautelas e os receios,
Que fé, língua e cultura são razão
A precisar de números e de meios.
No mar há caranguejos com a cruz
Do padre S. Francisco Xavier
A lenda faz as vezes de outra luz,
Ruínas, só as guarda quem quiser!
No intervalo vai-se até ao mar.
Por toda a parte há gente boa e fraca,
Ninguém é proibido de sonhar
Aqui, no largo Estreito de Malaca.
No período da minha vida política e partidária activa ouvia falar muito na estratégia chinesa de saber lidar com os inimigos e saber tratá-los como tigres de papel, mas longe de mim fazer a ideia concreta a que poderiam corresponder na prática estas palavras, mas agora talvez as comece a perceber. Ao fim e ao cabo uma viagem é em si própria uma aprendizagem e só o fuuturo me dirá em que trabalhos me vim meter. Estou satisfeito, sinto-me bem, aprendi mais do que ensinei.

segunda-feira, setembro 21, 2009

Projecto Malaca XI - Singapura

(Foto que mostra o Palácio do Governador de Singapura. Os espaços verdes que o rodeiam são um campo de golfe, para funções diplomáticas, claro está, penso eu.)




Peço desculpa aos leitores por não ter postado nada nos três últimos dias. Estivemos ausentes do Bairro Português, fomos passear até Singapura, esse estado-nação-cidade que fica aqui mesmo ao lado, ou seja, após umas quatro horas de viagem para lá e cinco no regresso, todo feito no mesmo autocarro, mas com problemas de tráfego, porque hoje e amanhã são feriados. As formalidades de fronteira foram mais demoradas à ida do que à vinda, deu para notar a diferença de estilos de organização dos países de um lado e do outro, deu para ver o gigantismo crescente da cidade, a sua arquitectura de arranha-céus, a sua ocupação do solo, a sua limpeza, a sua organizadíssima rede de transportes, a amabilidade de taxistas e de toda a gente contactada para isto e para aquilo.
(Fotografia que traduz, penso eu, a metrópole de arranha-céus que é Singapura; foi tirada do barco, passeio que se dá no rio para espanto de olhos e abertura de bocas: os contrastes são todos de arquitectura.)

O comércio está em toda a parte, os centros comerciais colam-se uns aos outros e fazem autênticos corredores de ar condicionado, daí a sua ocupação permanente. Mas se dentro tudo parece cheio, fora a sensação é igual, como vimos na china town e na little india, que de pequena não mostra nada, pois é uma acumulação continuada de «desordem« organizada, uma acumulação de cheiros e uma autêntica interacção de sensações. Houve passeio no rio, houve ida às zonas dos bares que são quase todas as ruas, houve ida e experimentação de restaurantes, comida vietnamita, chinesa, indiana, americana, houve conversas formais e informais, as primeiras na Associação euroasiática, edifício que é gerido pelos associados descendentes de europeus e cruzados com os outros povos, associação onde pontuam descendentes de portuguses, com um grupo folclórico também, à semelhança dos de Malaca e de Macau. Vimos alguns minutos de ensaio em sala de fazer inveja a todos os que praticam estas danças, pois tinha ar condicionado e espelhos ao fundo, soalho flutuante, um luxo, mas bem aproveitado. A minha pretensão de ver um espectáculo de ópera de rua chinesa não se concretizou porque não havia nada organizado, também se gorou a minha busca por um livro de lendas e histórias da Malásia, Singapura e Burnei, mas tudo correu bem e o passeio de três dias compensou a megatrópole que nos obrigou a proezas de pescoço.
Existe uma escultura (ver foto acima) que traduz bem a evolução e o desejo dela: de um lado, interior da ilha, está a construção arquitectónica da megaciodade, do lado de fora estão pequenos quadros da Singapura marítima, piscatória, comercial, urbana e rural, mas naquela escla que o século XIX e mais de metade do século XX cultivaram como nostalgia do progresso.
Dizem que Singapura é a cidade das multas e será, dizem que é uma ditadura e será, dizem que o indivíduo se sente abafado e sentirá, mas quem lá passeia e vê as pessoas e fala com quem tem necessidade de falar, desde taxistas a logistas, desde empregados de restauração a pessoas amáveis, desde guardas de museu a polícias, quem lá passeia, dizia eu, fica com a percepção de bom viver e feliz organização social. Mas isto é sempre asssim, até um lençol pesa na cama quando se não gosta dela ou não se tem sono por qualquer motivo.

Agora aqui vai um soneto que me saiu na Eurasian Association e que me andava a mastigar as ideias desde que aqui cheguei e ouvi falar português.

No Bairro Português ouvi a voz
De meus antepassados destemidos,
Em danças e cantares agora unidos
Num voto de futuro a todos nós.

O tempo acumulou muitos sentidos,
Pressões e compromissos de vontade,
Vincando sempre o dom da liberdade
Na busca dos recursos pretendidos.

Preservam-se as raízes da mistura
E criam-se outros modos para as ver
Em casos de confronto ou de ternura.

E assim vamos seguindo dia-a-dia
Com outros a fazer-nos companhia
Na arte e no engenho de viver.

José Machado/Singapura/2009

quinta-feira, setembro 17, 2009

Projecto Malaca X

(Aqui está a foto prometida de Noel Felix, um cantautor muito conhecido e muito responsável pelo encantamento musical, performativo, folclórico, desta terra. O simples facto de lhe ter transmitido o meu entusiasmo de em Portugal o meu grupo cantar e interpretar as suas composições já diz tudo. Como sabeis, trouxe o meu clarinete e temos feito uns ensaios conjuntos. )

Ao fim e ao cabo de que projecto se trata aqui? Vejamos assim o estado da questão: existe uma comunidade alargada de gente que se diz portuguesa, ainda que tenha a nacionalidade natural do país em que reside; mas existe aqui uma comunidade específica de gente que se diz portuguesa e que está acantonada num bairro, o portuguese settlement; esta comunidade tem uma língua, uma religião e uma cultura específicas por via das quais três dimensões juntas se dizem portugueses e reclamam a atenção natural do Governo e a comunidade internacional para serem o que são sem precisarem de ser «outros» em nenhuma circunstância.
(Esta fotografia foi tirada na festa de Santa Cruz, em Malim, no domingo passado: fixei as velas porque numa delas é bem visível um nome português e sua família, creio, deduzo.)
Para os portugueses serem quem são precisam de desenvolver as três dimensões que os identificam e lhes dão consistência social; uma das dimensões, a cultural, tem sido alicerçada nas práticas folclóricas que podemos considerar de dois tipos: práticas musicais e folclóricas tomadas de empréstimo das portuguesas, quer em termos de coreografia quer em termpos de vestuário, e práticas musicais que são criações próprias dos sujeitos. estas duas dimensões andam quase sempre a par, têm muita visibilidade porque se prestam ao espectáculo e são desempenhadas com arte, estão bem adaptadas, já entraram no imaginário dos próprios e dos «curiosos». É este acervo de documentação vivida que precisa de ser alargado, que requer alimentação: quer em termos de novo repertório, quer em termos de motivação para a criação. A vinda para aqui da minha pessoa trazendo na bagagem conteúdos de índole folclórica, musical, poética e espectacular visa a alimentação do corpo cultural performativo. A vinda de outra pessoa, a Cátia Candeias, para sustentar práticas de ensino e divulgação do português, seja o nosso seja o de Malaca, visa a alimentação das dimensões língua e cultura. A receptividade das nossas simples vindas e presenças já diz muito sobre as vantagens deste trabalho, mas os frutos concretos serãoi só no futuro mais visíveis. De qualquer modo, a troca cultural entre nós e eles já é um ganho assinalável. Nesta comunidade, como em todas, não existe a paz de deus ou a ausência de conflitos e rivalidades, existem as mesmas nervuras de conflito e existem as mesmas adrenalinas de sobrevivência, portanto mais mistura significará sempre mais motivação, mais riqueza, mais recursos.

Desculpem os leitores este desabafo reflexivo, mas teve de ser até para eu me ir clarificando a mim próprio, já que aqui clarificar quer dizer precisamente misturar.



terça-feira, setembro 15, 2009

Projecto Malaca IX

(Foto de Papa Joe, o cantor mais conhecido pela divulgação de cantigas e de danças; é dono de um restaurante e Pub, tem um grupo folclórico, é autor de cantigas e um divulgador da música portuguesa).

Duas cantigas adaptadas já aqui por nós, num processo de interacção com os falantes: dizer as coisas no português de Malaca e escrever o sentido das coisas ditas é uma verdadeira pesquisa ao fundo das línguas (ainda não estabilizou a grafia do português de Malaca): hoje parece bem a uns, mas amanhã há alguém que diz que há outras palavras para o sentido pretendido. A Cátia está a mergulhar na raiz da língua, cheia de entusiasmo. Aqui ficam os dois exemplos:

S. Juan (Com a música do S. João de Cervães, mas o coro é com a melodia instrumental do clarinete - adaptação dentro da nossa adaptação)
Jenti gosta San Juan
oh San Juan, oh San Juan
Tudu adora San Juan
Nusa korsang,
limpu korsang!

Padri ja benze kandia
oh San Juan, oh San Juan
Jenti di bairu alegria
Nusa korsang, limpu korsang

Nus kung padri reza rentu greza
Lo benze kandia munto nechas
Fila fila sibri ropa bedri
Lo cende na potra di janela
Regidor cende kandia grandi
Noel Felix canta nobu kantiga
Kanjimingu ja lesti riba mesa
Tudo jenti bai enche barriga.

Malhão (Com a música do malão de Parada de Gatim)

Ó i ó ai, beng nos bala
Beng nos canta, ai ai ai
Beng nos canta
Ai ai ai, beng nos bala

Jenti ja beng nusa bairu
Jenti ja ben nusa bairu
Ja kume, bebe, santa.

Ó i ó ai, beng nos bala
Beng nos canta, ai ai ai
Beng nos canta
Ai ai ai, beng nos bala.

Ja kume, bebe, santa.
Fila fila, filu filu
Nusa stradu ta bala

Jenti ja beng nusa bairu
Jenti ja beng nusa bairu
Kum nus ja beng alegra

Kum nus ja beng alegra
Tudu kunece nos bida
Tudu nos pode canta

São exemplos. Também há o exemplo de Papa Joe, talvez o cantor mais conhecido aqui do Bairro e arredores, ele e Noel Felix foram e são duas referências musicais da comunidade; pois Papa Joe canta em português e faz questão disso, embora sempre com uma palavra ou outra a querer sair na raiz de Malaca. Foi assim que transcrevemos para ele o Pezinho, tal como nós aí o cantamos. Agora é só esperar e o futuro dirá como vai andar nas bocas do mundo.

segunda-feira, setembro 14, 2009

Projecto Malaca VIII
















































































Algumas fotografias que demonstram o trabalho de um ensaiador. A pergunta inevitável: ensaiar uma dança ou o passo de uma dança? Opção: ensaiar passos (steps): o passo de vira, o passo de chula, o passo de marcha. Depois, ensaiar pequenas sequências coreográficas. Depois, já será mais com eles, a escolha: que dança para este passo? Depois outra escolha: que coreografia para esta dança? Os discos e os vídeos que trouxe têm sido suficientes, mas é óbvio que se soubesse o que sei agora, teria trazido mais materiais, materiais que não existem à mão de semear, mas que é necessário fazer, construir, para projectos deste género.

domingo, setembro 13, 2009

Projecto Malaca VII

Romaria de Santa Cruz, em Malim, Malaca, hoje às 8.00 da manhã, saímos de casa às 7.00, depois de uma noite de chuva intensa e trovoada, portanto noite mal dormida, mas boa viagem. A romaria tinha imensos chineses e assistimos à missa em chinês. A Santa Cruz está protegida por vidro, aparece «ratada» porque quando era acessível toda a gente gostava de tirar um pedacinho. Tem uma história que não vou contar aqui. No fim da missa chinesa houve distribuição de um pão e uma fatia de bolo e água, tudo devidamente acondicionado, a fazer lembrar as nossas festas com igual costume. Velas enormes, fotografei depois uma que tinha um nome português, provavelmente seguido de todos os familiares.


Agora a foto do pequeno almoço em restaurante indiano.









Começo a compreender melhor como se dança aqui e como se tem de ensaiar. As danças que os 4 grupos aqui apresentam estão bem concebidas para os desempenhos que têm de fazer, para o clima e para os esapços em que actuam. Os trajes são uma escolha dos grupos e se reflectem a parecença com os do Minho é só porque essa nossa região foi a que mais e melhor se impôs no turismo de consumo, mas os grupos, ou melhor, os seus responsáveis, estão a fazer caminho de mudanças, a aproximar-se da cultura local, portanto é possível que no futuro haja diferenças, mas o que os elementos dos grupos vestem está em boa conformidade com o que precisam para actuar, porque aqui actuar significa ganhar dinheiro.
Então o método consiste em apresentar a coreografia como esquema que pode ser realizado por fases, ou melhor, com pausas entre cada uma das execuções, pausas mínimas, ritmadas, equilibradas, mas necessárias para retemperar forças e evitar os excessos de calor. Outra questão é a dos braços, que em Portugal têm uma história de movimento e postura e aqui têm outra, menos levantados, mais conformados ao movimento do corpo na relação imediata com os outros, portanto dentro da esfera que o corpo realiza, sem ultrapassarem a cabeça.

sexta-feira, setembro 11, 2009

Projecto Malaca VI

Os ensaios começaram em força, com o suor a deixar-me alagado. O primeiro ensaio no Museu ainda foi mais ou menos regulado pelo ar condicionado, mas o segundo ensaio deixou-me a escorrer, o calor foi muito e as ventoinhas não compensaram o clima.


Por falar em ventoinhas, até as igrejas estão cheias delas, há sempre o ruído de fundo das ventoinhas durante a missa, são colocadas no tecto, são de vários tamanhos, ficam quase de metro em metro, é um espectáculo de correntes de ar, mas se não for assim, nada funciona. Nos carros, o ar condicionado é ligado logo de imediato e quando saio do carro os óculos embaciam imediatamente, tal é a diferença de temperaturas; nas casas, fora, está-se bem, mas a ventoinha também é utilizada.
Todas as diferenças são a nossa distracção imediata, é impossível não reparar, é impossível evitar o ar «basbaque» de curioso impertinente; as fotografias ajudarão mais tarde a fazer uma ideia do espanto, mas ficarão sempre aquém dos sentimentos experimentados. Ainda hoje, escrevo às 12.00 horas, eu cheguei aqui a casa de Mr. Banerji às 11.00, imediatamente me foi servida uma chícara de café e disponibilizado bolo de chocolate e mais comida que estava na mesa; mas de imediato nos levantámos, eu e a Cátia, que estava a acabar de se levantar e ainda não tinha iniciado a sua chícara de café (nescafé com água e açúcar escuro de Malaca), porque a senhora Jenny, em casa de quem estou hospedado, chamou a senhora Agnes, esposa de Mr. Banerji, e fomos almoçar, eram 11.15 a um restaurante chinês onde ela pediu umas posodorias variadas e ainda não experimentadas, para comermos com os pauzinhos, ou o garfo e a colher: vegetais, carne de porco, massa e sopa, ovos escalfados, pão com manteiga, tudo com um nome adequado que não sei reproduzir, e tudo acompanhado de chá, que parece café com leite, mas que sabe bem, aliás tudo me sabe bem, e começo a comer ou a querer as coisas com aquele picante ainda regulado, qualquer dia será no grau máximo da especiaria. Surpresa atrás de surpresa, tudo porque estamos hospedados em casa de gente que nos pode proporcionar a deslocação em automóvel e sabe levar-nos aos sítios apropriados sem perder tempo, mas no ir e no vir ainda não seríamos capazes de acertar o caminho.

(Intervalo: a foto ilustra o momento em que a Cátia foi incentivada a fazer o «dodol», um doce que assinala a Aria-raia, a festa do fim do Ramadão: doce à base de coco, glúten de arroz e caramelo de açúcares vários. A foto foi tirada num espaço comercial fora de um centro comercial enormíssimo; os centros comerciais aqui engolem três ou quatro dos nossos. Entretanto nos espaços comerciais vêem-se muitos empregados e clientes de máscara, por causa da gripe A.)
Entretanto vamos ouvindo o português de malaca, o chinês, o inglês, o malaio, passando algumas pessoas de um registo para outro e misturando as palavras e as frases.
Tudo isto está a ser acumulado a uma velocidade que já penso estar aqui há um mês e tal e ainda se passou apenas a primeira semana.
Uma dor muscular na perna direita começou a atrapalhar o ensaio, à noite apliquei «geliga» um bálsamo ardente que me fez bem; espero hoje não ter problemas com a chula. Uso nos ensaios o disco «Vamos Bailar à Senhora» porque as melodias são extensas e assim dá para parar, recomeçar, parar de novo e avançar. Bem dizia o senhor cónego Melo que este disco ainda havia de fazer «milagres». Entretanto, como estou hospedado em casa de Mrs. Jenny, uma convertida, porque inicialmente não era cristã, começo a achar piada às suas palavras de que tudo está relacionado e tudo tem a ver com tudo: quando conto a estas pessoas que nunca pensei vir a Malaca, mas que já em 85 tinha estudado um disco com música portuguesa de Malaca, que em 98 comprei uma colecção ao Moças com 10 discos sobre sons da lusofonia, um dos quais de Malaca, todos eles apontam e dizem: vês, já havia sinais de que tinhas de vir aqui!

quarta-feira, setembro 09, 2009

Malaca V

O vídeo produzido pela Cátia: tratou-se de uma sessão «jam session» para ver um vídeo e depois praticar. Mostrei o video do Augusto Canário «Celebrar a Amizade» que causou um espanto enorme: pelos instrumentos utilizados, pela junção de música tradicional e orquestra de instrumentos, pelo ritmo e pelos momentos de dança que inclui. Todos perceberam a riqueza motivacional do vídeo e os frutos acabarão por se verificar. Depois, durante os cantares ao desafio (aqui «matá kantiga») foi só dançar à roda, no Museu.

Agoras, as fotos: o menino mais gordo que vocês vêem a tentar ensaiar as castanholas, Edward, é indiano e está casado com uma descendente de portugueses, e foi, espanto!, durante a sua juventude uma verdadeira cópia de Michael Jackson, conhecido em toda a Malásia e América, um verdadeiro performer do MJ, até organizou uma efeméride há pouco tempo; tem uma loja de artesanato, é um manager de todas as artes, uma simpatia de pessoa e tem em casa uma iguana enorme, e quer que eu tire uma foto com ela!!!
Em inglês e em português, toca a dançar. Primeiro a andar, depois a saltar e a coreografar.
O suor encharcou a camisa, mas valeu. Amanhã há mais. Isto vai, rapazes!
O importante é os pequenos grupos passarem a mensagem e ela está a passar. Michael Banerji é um dirigente paciente e sabe esperar, creio que a sua metodologia vai acabar em saudade.
Os jovens acham piada aos meus movimentos, as minhas instruções em inglês acabam por ser eficazes e até engraçadas, mas a prática é que interessa.
As castanholas e as castanhetas podem entrar nas próximas performances. É pena não haver nestes grupos um instrumento melódico, tipo acordeão ou concertina ou flauta, ou clarinete - já mostrei o meu; já houve acordeão e gaita de beiços, mas agora não há, é só com guitarras, voz solista e coro e pandeireta e «rebana» um tambor próprio.


terça-feira, setembro 08, 2009

Projecto Malaca IV

A primeira apresentação formal de danças e cantigas. Mostrei o que o nosso grupo fez e faz, descrevi os trajes e expliquei usos e costumes. Depois mostrei também as fotografias do desfile da mordomia e da «parada» ou cortejo histórico-etnográfico das festas da Agonia em Viana do Castelo. A parte relativa aos barcos, ou seja, o desfile dos barcos pelas ruas, é uma aproximação aos festejos de S. Pedro aqui, mas o que surpreendeu foi a reconstituição histórica e o transporte do barco pelos próprios pescadores ao longo da parada.

Hoje fui ao mercado chinês comprar vidrilhos de vários tamanhos, mas pretos. Vi umas chinelas com a biqueira em missanga que são um espanto; cada par custa entre 60-70 euros; são feitas pelos chineses.

Aqui está o pormenor que explica o modo como as raparigas de Viana suportam todo o ouro que levam ao pescoço: ao invés de pensarmos que o pano onde agarra o ouro é ocasional, podemos pensar que ele é afinal o mesmo «bib» ou «buche» que mostra o ouro da mulher portuguesa na Malásia.


domingo, setembro 06, 2009

Projecto Malaca III

Aqui vai uma série de imagens obtidas na máquina de Cátia Candeias, a responsável pelo projecto do crioulo «kristang» falado em Malaca; caber-lhe-á registá-lo, «literalizá-lo e gramaticalizá-lo», se assim se podem nomear estas funções; estará em Malaca por oito meses. A Cátia é licenciada em desenvolvimento comunitário, o que justifica por si todos os trabalhos em que se quis meter. A primeira foto é sobre tecidos para blusas e para lenços, padrões que encontrei por aqui, com a dedicação exclusiva da Agnes, esposa de Michael Banerji, depois de muito tempo de procura por tudo quanto era loja de chineses, os tais que até conheciam os lenços «tapete» por chineses.
A segunda foto tem a ver com a curiosidade da pesquisa.
Efectivamente, as sociedades não andam todas à mesma velocidade, o que faz com que o que se vende aqui já não se encontra por outros lados e o que custa aqui a procurar custa bem menos a pagar.
Há por aqui toda a variedade de tecidos que os grupos folclóricos portugueses compram, retalham e vestem.

A terceira, que foi tirada antes das duas primeiras é uma curiosidade fónica: a palavra que o leitor pronuncia, como dizendo aquilo que não parece ser quer dizer independência e a Rua (Jalan) é dedicada à Independência da Malaca. Eu e Mr. Banerji estamos maliciosamente coniventes como se pode deduzir. Mr. Banerji é um verdadeiro líder da comunidade, um autêntico e genuíno suporte humano do projecto em que estamos envolvidos, eu e a Cátia, aquela menina sorridente da última foto, tirada sob a abóbada da «Famosa», fortaleza que Afonso de Albuquerque mandou construir, que os holandeses destruíram para apagar todos os elementos decorativos dos portugueses e que os ingleses quiseram fazer desaparecer do mapa de uma vez por todas. Restou isto e pouco mais, um mínimo que é o máximo para turistas e que representa tudo quanto os povos hoje pensam que sabem sobre patrimónios conquistados, transformados, herdados e assumidos.
Malaca é uma cidade património da Unesco e aqui, correndo ruas e edificados, percebe-se bem que seja e que por isso mesmo dê trabalho a todos.
A jovialidade é um sentimento que se tem, mas é também uma dimensão que se procura.
Estava connosco neste dia quente e húmido de passeio uma outra jovem, a Maria Liew, funcionária do nosso Comércio externo em Malaca.
Mr. Banerji sabe os antos à casa e o Cendol (chendol) apagou-nos a sede: uma bebida parecida com uma sopa gelada, constituída por água, açúcar queimado de Malaca, farinha de arroz transformada em canudinhos verdes como massa, feijões vermelhos e muito gelo, de proveniência mix entre a China e a Malásia, chamada peranakan: mata a sede e deixa as conversas com melhores disposições de sentido.

terça-feira, setembro 01, 2009

Projecto Malaca II

(Da esquerda para a direita: A Tininha, minha mulher, a Manuela Serafim, o Aurélio, a Ana Paula, a filha da Ana Paula, a Conceição Tinoco e a Helena Borralheiro; foi tirada por mim em Viana do Castelo no dia da Mordomia, em frente à Câmara Municipal.)

José Maria Cabral Ferreira, no livro de co-autoria com João Pedro de Campos Guimarães, O Bairro Português de Malaca, Edições Afrontamento, Lisboa, 1996, confere aos movimentos de folclorização das formas tradicionais da vivência cultural um estatuto de perda nas estruturas culturais que podem sustentar a sobrevivência dinâmica de um grupo populacional, como no caso do Bairro Português de Malaca. Eu li e pensei que é precisamente nesta dimensão que vou para lá trabalhar. Levo portanto este desafio de demonstrar que a folclorização não é perda cultural. Senti na construção de projecto que é de conteúdos folclorizados e da folclorização de conteúdos que a comunidade do Bairro precisa, para se sustentar com aquela identidade virtual de portuguesidade. Vou mais acalentado, não só pelos sorrisos dos meus fotografados, mas também pela leitura acauteladora de meus juízos daqueles dois autores, um deles foi meu professor na faculdade de Filosofia. Outros conselhos tomei de amigos turistas que passaram por Malaca e pelo Bairro, também do colega Queiroga que me fundou uma visão muito simpática e compreensiva das gentes do Bairro, sobretudo das suas práticas folclóricas, e das leituras que fiz, em livros e na Net. Sem esquecer as pessoas que me fazem ir a Malaca, as entusiastas senhoras Luisa Timóteo, Cristiana Casimiro, Maria João Liew e os demais membros da Associação «Korsang di Melacca». Darei notícias neste blogue. Parto dia 3 de Setembro, de comboio para Lisboa onde tomarei o avião para Amesterdão e de lá para Kuala Lumpur.