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domingo, agosto 09, 2009

Só ontem soube

O pintor Nuno Barreto faleceu no dia de S. João, a 24 de Junho deste ano de 2009. Só ontem soube e quem me disse situou a sua morte há mais tempo ainda do que foi. É já o segundo amigo que morre no dia de S. João: em 2008 faleceu no dia da festa o compositor Joaquim Santos. Volto atrás e coloco Nuno Barreto nesse dia de labirinto festivo, tal como só agora descobri a sua galeria virtual e pude acompanhá-lo, neste silêncio violento que me foi imposto tanto por minha incúria da imprensa, como por falta de quem me podia ter avisado. Contactei com Nuno Barreto de algum modo intensamente nos anos de 1986-88 no Museu Nogueira da Silva, em Braga, embora o conhecesse de há muito tempo, desde antes de Abril de 74 através de quadros seus, e depois de Abril neste movimento cooperativo que deu origem à construção da Cooperativa de Construções e Habitação Bracara Augusta, portanto à casa ou andar em que vivo. Escrevi para ele um texto de catálogo de uma exposição onde os labirintos assumiram pela primeira vez uma figuração simbólica do mundo, de nós e de si próprio. Tenho três obras dele, duas serigrafias provas de artista e um acrílico, pequenos, mas bem significativos das temáticas que abordou. Se na altura falei muito sobre ele sobre a sua pintura como «cartoon» das realidades, hoje ainda mais me vinco a esta ideia: toda a sua fragmentação do quadro é uma fragmentação do real, e toda a fragmentação do real é uma vitralidade da apreensão dos sentidos. Todos os objectos da pintura são palavras polissémicas, todas as suas palavras só na pintura encontram mais densa significação. Pode a sua obra ser lida pelo cómico, mas deve-o também ser lida pelo trágico, tomando a ironia ora como movimento de aviso, ora como epitáfio, de complexidades crescentemente ameaçadoras, umas naturais, mas outras, a maioria, engenhosamente manipuladas pelos poderes económicos e políticos dominantes.
Manifesto, por este meio, o meu pesar e o de minha esposa a todos os familiares do Nuno Barreto, à sua esposa Angélica e às suas filhas, na certeza de a sua memória e a sua obra terem sido, e poderem vir a ser cada vez mais, uma luminosa contribuição para a nossa esperança de futuro.

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