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domingo, julho 12, 2009

Senhora da Serra - Alto do Marão

Saí de Braga às 4.02 da manhã, com destino ao alto do Marão, para presenciar a festa de Nossa Senhora da Serra, que ocorre sempre no segundo domingo de Julho depois do S. Pedro. Meus compadres do Porto, o João e a Ana, já me tinham falado desta romaria há uns anos, mas eu ainda não tivera a oportunidade de lá ir.

Aconteceu que no 23º aniversário da Casa de Trás-os-Montes estivemos a apresentar o Grande Cancioneiro do Douro, de Altino Cardoso, obra onde se refere esta romaria como ocasião para a demonstração de música e dança tradicionais, concretamente para ouvir as chulas de Gestaçô ou das terras limítrofes, agora tocadas com violino.

Fui eu e a Tininha, minha esposa. Chegámos lá às 5.12, quase sempre sem trânsito até à subida para o alto da Serra, mas depois com a grande surpresa de ver que já lá estava um mar de gente, um mar de tendas e de tendeiros. Estacionámos e fomos à capelinha, agasalhados, por ali acima, até às antenas. Estava ainda fechada. A resposta sobre o horário da missa foi de que ela seria às nove ou nove e meia, que agora o padre é novo e levanta-se mais tarde, com toda a ironia do frio e da noite neste aparte. Meus compadres tinham assistido à missa, em tempos, às seis da manhã e às sete estavam a comer frango no churrasco e a ver os grupos a actuar. As mudanças, como se vê, estão em curso. Fomos ao carro buscar uma manta, das duas que leváramos e toca a ir arranjar lugar para ver nascer o sol.

E vimos. E aquela subida rápida para a crista do horizonte mal aflorou na linha do mesmo fez soltar aplausos e festejos. O culto solar ali na plenitude e nós a assistirmos, a participarmos nele. Lembrei o meu professor Moisés Espírito Santo e a sua interpretação de vel para o sol, sendo este o Velho, e fiquei com as ideias arrumadas sobre este mistério em que me envolvia directamente. Já o malhão velho e a chula velha ganhavam outra interpretação.

E visto o nascimento, foi vê-lo crescer, experimentando empirica e gostosamente essa teoria secular de pensar que é o sol que vai girando sobre nós, que foi tudo quanto vimos o sol fazer, ali em poucos minutos de esplendor.

De novo até à zona da capela para encontrar um lugar de espera, sem vento, aconchegado, que permitisse dormir um pouco. Que era o que víamos fazer, posto que acordados e despertos e sem frio fossem muitos e novos, mas também os vimos como justos a ressonar debaixo do céu.

Assim passou o tempo, num crescer de gente à volta. Na capela, a Senhora tem tratamento de imagem e esta foi outra surpresa: então não é que lá fui encontrar a pajela da Senhora com o poema de António Correia de Oliveira «Louvada seja na terra» escrito recentemente no verso?, esse poema que musiquei para «Os Sinos da Sé», a que acrescentei até mais letra, e que faz parte do nosso disco «Queremos dar-Te graças». Que pena tenho de não saber postar aqui e agora essa música.

O encantamento do altar, na sua simplicidade e «tosca» decoração, deixa ao visitante e ao devoto uma experiência singular de acolhimento: ali se deixa a esmola, ali se depositam os cravos e ali se pagam os cravos ou as flores e logo se deixam ali, ali se conversa e se reza, ali se vai e chega com a postura de dever. Ali se anda de joelhos e a pé à volta da capela, pelo corredor, que se varre a espaços para evitar as areias, ali foi o grupo de bombos «Os Borgas» de Ovil, Queimada, Baião, ali foram os dois grupos folclóricos, o de Carneiro, Amarante, e o de Gestaçô, Baião. A missa foi campal. O padre era novo, o coro esforçou-se, as pessoas ajuntaram-se, o rito funcionou. Já o Sol queimava, já o corpo pedia o farnel e nós, de ouvidos cheios de chulas, verdegares, viras e malhões, fados e valsas, as mesmas quadras à Senhora em todas as peças, corpos suados e trajes de compostura variada, viemos dali felizes, com a ideia de termos ido a ganhar a plena consagração.

3 comentários:

Anónimo disse...

Como são lindas essas terras, não são?! Tb as conheço bem e as guardo com carinho e saudade no meu coração.Quantas recordações do tempo das minhas férias de infância...
Não esqueço uma placa num fontanário público no centro da vila de Baião
"Quando cheguei a Baião
da tua água eu bebi
fiquei louco de paixão
não posso viver sem ti."
A freguesia, depois vila, onde passávamos as férias, terra natal do meu paizinho, chama-se Sta Marinha do Zezere, fica a cerca de 10 km de Baião. Ainda me recordo que nos dias 11 e 25 de cada mês era dia de feira!
Já há muitos anos que não lá vou, ando sempre a adiar...
quem sabe este Verão finalmente o neto que não conhecera aprecie a terra do avô, já que só quase a cidade conhece.
M.A.

Anónimo disse...

Há já vários que calcorreio o terreno acidentado e agreste da Serra do Marão. Sem falsas modéstias, conheço bastante bem esta Serra, pois a ela dedico muito do meu tempo livre. Apesar disso, sempre que preparo mais uma saída para o Marão, faço-o com ansiada espectativa, pois o Marão tem sempre algo para me mostrar e ensinar.
Vem este meu comentário a propósito da festa da Senhora da Serra.
Em 2009, resolvi passar mais um dos meus fins de semana na serra, precisamente o segundo do mês de Julho, desconhecendo eu a data desta festividade. Aquilo a que eu assisti, é digno de figurar em qualquer "Almanaque do Incrível": barracas de "comes e bebes" com o aspecto mais sabujo que se possa imaginar; fogueiras espalhadas por toda a área envolvente ao arraial, desrespeitando tudo o que a lei prevê em matéria de prevenção de incêndios florestais.(não chegou o incêndio de 1985?).A noite estava bastante ventosa e só por milagre a tragédia não aconteceu. A junatar a isto, foguetes não faltaram.Autoridade, nem vê-la durante a noite. Um jipe da GNR desceu da serra p/volta das 21h.Não os voltei a ver; muitas pessoas alcoolizadas, sem qualquer control; dois energúmenos pendurados no que resta da rede de vedação do Observatório Astronómico, tentando derrubá-la;durante toda a noite, literalmente toda a noite, uma corja de pseudo corredores de moto4, visivelmente embriagados, transformaram a serra numa pista de corridas, pondo em perigo a integridade física de todos quantos por ali acampavam ou circulavam. 7h30 de domingo, já farto desta "romaria", levantava o meu acampamento quando o último anormal, com o ar mais boçal e estúpido deste mundo passou, fazendo questão de derrapar ao meu lado, enchendo-me de terra e provocando o embate de pedras no meu carro, como aliás o fizeram os seus comparsas.
Duas semanas depois voltei à serra e por lá continuavam alguns esqueletos das ditas barracas, alguns até com o nome dos seus proprietários. Toda a zona era uma autêntica lixeira a céu aberto e muito do lixo (sacas plásticas inclusive) já tinham sido espalhadas serra afora pelo vento. Será que as Autarquias e Autoridades envolvidas não deverão ser responsabilizadas por este autêntico atentado ao ambiente, ou será que é preferível "assobiar para o lado", para não mexer com certa tradições mesquinhas deste povo que se quer igual aos países civilizados da Europa?
Deixem estar a imagem da Santa na Teixeira, façam aí a romaria e deixem a Serra do Marão em paz. Esta (serra) não é propriedade de Baião, é propriedade da Humanidade!

o_homem_do_cume disse...

evidente que a serra não é
propriedade de baião, até porque a sua grande parte pertence a Fontes, Santa Marta de Penaguião.
Aliás, se não fosse a Câmara deste ilustre Munícipio a arranjar a estrada que dá acesso ao cimo da serrae que começa na Campeã(Vila Real), todo este percurso anual seria muito mais dificultado.
Grande parte do problema é este. É a quantidade de municipios que partilham a "tutela" da serra.
Acabam por passar a batata quente de mão-em-mão e o lixo fica por lá.
no entanto, ao nível do controlo da festa propriamente dita, é Santa Marta quem deve assumir-se. é na vertente sobre este concelho que a maioria das pessoas se estabelece durante a noite e é deste concelho a corporação de bombeiros mais próxima, Fontes.