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segunda-feira, junho 29, 2009

Crónica da última emissão da RFS

(Antena Minho: 27/06/09) O último programa do ano lectivo de 2008/2009 na Rádio Francisco Sanches é a boa ocasião para lembrar o que se fez, o que ficou por fazer e o que poderá ser a nossa colaboração futura num projecto desta natureza. Eu penso que fez sentido para a comunidade este programa da Rádio Francisco Sanches, não só mas também para mostrar sensibilidades de participação, trabalhos projectados e conseguidos, estados de espírito, preocupações temáticas, desabafos e noticiário de iniciativas. A equipa da Rádio demonstrou a perspicácia inventiva suficiente, obteve as colaborações possíveis, manteve-se em esforço e em expectativa ao longo de todo o ano, mas acaba, estou certo, com um sentimento geral de felicidade e de obra conseguida. Eu dou-lhes os parabéns pela persistência, pela paciência, pelo esforço.

A estação mediática, a Antena Minho, provavelmente dirá das suas ambições de programação no futuro e logo saberemos até onde poderemos ir. Se houve dimensão que faltou ao nosso programa foi a da interacção com o público receptor, assunto ou estratégia de comunicação que ainda não conseguimos resolver, mas na qual pensamos e da qual precisamos. Muito certamente também a própria estação nos poderá facultar uma linha de acesso a esta participação da comunidade no próprio programa.

Quanto à minha pessoal participação, para além de motivar alunos e professores e colaborar pontualmente neste ou naquele programa, mantive a obrigação pessoal de ler uma crónica, mantendo cascas e aparas neste propósito de falar de tudo e de todos, deixando sempre de fora os mesmos e mais. Qualquer outro professor pode assumir este objectivo e eu estarei disponível para ceder o lugar de cronista. Considero-me satisfeito e compensado, não só pelas reacções, mas também pelo grão da voz que me concede mais tempo de permanência nas memórias auditivas, o que é sempre bom quando acontece o reconhecimento nos lugares mais estranhos e mais imprevisíveis. «Olhe lá, o senhor não fala na rádio? Gosto de o ouvir» - eis uma síntese mais que suficiente para a minha motivação se sentir compensada. Dizem que um cronista deve manter a actualidade do assunto dentro da surpresa da linguagem e embrulhar as duas num tom de voz propiciador. Sei que fiquei sempre aquém nestas dimensões, mas esforcei-me.

Foi um ano difícil e conflituoso, entre mim próprio e mim, entre mim e outros, entre quem manda e quem obedece. Foi um ano de frustrações e de arremedos, foi um ano pesado, mas foi também um ano de trabalho persistente e de teimosia para o fazer. Não adivinho o futuro, mas toda a minha esperança é de que o haja e ele seja complicado: anseio uma corrente de mudança que se exprima em ambiente de liberdade e de democracia, que afaste o peso excessivo da burocracia, mas não atire a simplificação arbitrária para cima da mesa, que respeite alunos e professores sem lhes diminuir inteligência ou vontade, que retome diálogos e que decida a tempo e horas.

É óbvio que me declaro desejoso de mudanças em sede da entidade patronal, mas não me exprimo ansioso por libertações enganadoras: só pode vir aí mais trabalho e mais responsabilidade, e eu só desejo que elas venham com a dignidade do salário e com a dignificação da minha pessoa. Mas por favor não voltemos ao tempo do insulto fácil dos agentes de ensino nem voltemos ao tempo da desconsideração contínua do nosso passado: as estatísticas estão aí e agora quem as quiser manipular pode fazê-lo. A guiar-me pelos comentários dos jornais eu ficaria com a ideia da instalação definitiva do facilitismo se não soubesse quanto trabalho é feito nas escolas e nas salas de aula.

O futuro terá nas mãos esta batata quente que é falta de perspectivas dos jovens, agora que ela ainda foi mais esquentada pela precipitação do sucesso a todo o custo. O futuro está aí a pedir-me a fúria, mas é de controle de nervos que vamos precisar. O futuro está aí a pedir-me o uso intensivo das tecnologias, mas é ainda de giz e quadro que vamos precisar. O Futuro está aí a pedir-me projectos atrás de projectos, visibilidade e exposição, mas é ainda de discrição e trabalho de formiguinha que vamos precisar. O futuro está aí a requerer ansiedades, mas é de desconfiança e dúvidas que me devo alimentar. Todas as boas recomendações metódicas me serão úteis. Só mais receio que se instale no meu espírito esta suspeita de vinganças que anda nos subterrâneos da democracia. Aconselho férias com atenção.

domingo, junho 28, 2009

Agora, em Salto

No dia 27 de Junho, às 16.00, no Ecomuseu de Salto, fiz a apresentação deste livro que já apresentara na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva. A convite da Dra Isabel Lima Leite, filha da autora. Deixei lá as lágrimas pelo amigo Borralheiro, falei com uma fixação na sua memória, das conversas que ambos tínhamos sobre o livro e sobre a ideia que o livro transmite sobre o lugar: Rogério, andei próximo daquela ideia que conversei contigo, a da culpa, a de nos sentirmos obrigados a escrever sobre a nossa saída do paraíso, não falei da culpa naquele sentido de pecado, mas naquele sentido de necessidade de merecer a recompensa: a terra que te viu nascer, aquelas casas em que fizeste as tuas aprendizagens, aqueles campos de trabalho e de diversão, aqueles objectos de uso, estão todos dentro do museu, também lá estás tu e lá está o nosso amigo Castanheira, na voz de texto orientador, e o senhor Tito e mais amigos e conhecidos. O presidente da Câmara esteve à altura do teu merecimento e prometeu perpetuar-te naquele espaço. Fui-te ver, eu e a Tininha, lá te cantei.
Fiquei a conhecer o João Azenha, director do Ecomuseu. Todos estivemos à altura do acontecimento, na nossa dimensão absoluta de humildade face às memórias e às palavras que ali se desataram. O Orlando pareceu-me orgulhoso da obra feita, a directora da Biblioteca também. A doutora esteve presente, provavelmente sentiu-nos ocupados e interessados e eu recordei o carinho que tinhas por ela. Apesar de tudo, a Casa do Capitão reergueu-se à altura das outras Casas. Tudo vai mudando e nós parecemos crianças na vastidão dos lameiros.

(Agradeço a fotografia ao R. M. de Montalegre que tem o cuidado de me enviar as imagens dos eventos realizados no município. Obrigado.)

quinta-feira, junho 18, 2009

56 - Ninguém mos tira

Há 56 anos vim ao mundo e meu pai festejou ruidosamente na aldeia o meu nascimento: ao que me contou foi à cantina das Minas comprar um bacalhau e dirigiu-se com ele na bicicleta para o comer com amigos a goles de cerveja e de vinho, pão e azeitonas, em lascaria de mãos e de apetite. Minha mãe ficou a acalentar-me e soube da festa rija pelo estado de regresso de meu pai. Que na altura esta borga me fosse favorável soube-o mais tarde e sei-o agora quando os olhos de meus pais me festejam os passos e as palavras. Meu pai foi sempre ruidoso em matéria de festas, saindo-lhe as palavras e os brindes dos calores da alma, numa intensidade emotiva de apelo à consideração dos presentes e dos ausentes, convocando todos os espíritos para a festa, os do lugar e os do tempo, os da família e os de fora. A discrição de minha mãe contribuía seguramente para os climas de euforia. Eu fui o filho segundo numa irmandade de nove, quatro rapazes e cinco raparigas, todos por aqui e ali espalhados e a viver na distância os apertos deste sentimento de pertença a uma prole. Nossos pais estão entre nós e já somos agora mais de trinta, variando as contas consoante contarmos os consortes ou companheiros de vida, que netos e sobrinhos são por ora doze. Nasci em Campo de Jales, freguesia de Vreia de Jales, concelho de Vila Pouca de Aguiar, Trás-os-Montes, no bairro da Saíssa, assim se chamava aos corredores de casas que a empresa mineira construíra naquela zona de fora da povoação rural para instalar os seus trabalhadores. Nasci entre mineiros e lavradores e com eles vivi uma infância escolarizada e catequizada, sempre na perspectiva de sair dali para uma outra formação que pudesse coroar as expectativas de meus pais. À saída da primária os futuros eram três: ou a lavoura, ou a mina ou os estudos. Nestes, outros três atalhos: ou o liceu ou a escola técnica ou o seminário, com o cumprimento de três admissões, exames de exposição escrita e oral, opções de cálculo entre despesas e proveitos. Deu-se o caso de o rapaz se afirmar inspirado por desígnios superiores, fosse por influência de parentes, fosse por sortes dessa narrativa que fala sempre em filho padre numa família numerosa, e o seminário dos Missionários do Espírito Santo, em Godim, na Régua, foi o meu destino, dali passei para Braga dois anos depois e aqui continuei até sair por desvocação de fé e de projectos religiosos nesses anos setenta que antecederam a revolução de Abril. Toda a vida que levo é de interrogação sobre este desatino de não ter cumprido esse lugar de chegada que meus pais terão sonhado e esperado, embora saber qual fosse não me seja vantajoso considerar. Também os não terei desiludido, pese embora aquela situação de completa frustração que lhes terei provocado por via das minhas opções políticas depois de Abril, um caso típico de aposta nos cavalos errados, enfim, um esquerdismo de circunstância, porventura nunca compensado, mas que só os pais sabem considerar na sua infinita paciência de esperar. Temos partilhado sofrimentos e frustrações, como temos partilhado êxitos, sempre insatisfeitos de nós próprios. Meus pais estão a residir em Raiz do Monte, terra natal de minha mãe, pois meu pai é natural de Nogueira, Vila Real, terra ali a dois passos de Jales, onde as terras de herança acabaram por ditar obrigações de cuidado e de fixação. Há na pequena propriedade em que meus pais residem, tão sabiamente nomeada Mó, uma pedra cava em forma de tanque ou pia de rega onde imagino sempre ver meus pais sentados a olhar a horta e a falar sobre os filhos e a vida, já que na minha infância é essa imagem que guardo dos actos de partilha das terras entre os herdeiros de meus avós maternos. Foi à volta dessa pia de água que fiz todas as minhas aprendizagens, estou bem certo disso, e é lá que regresso, sempre que esse mecanismo sisifiano me surge como paradigma da vida: encher e esvaziar, tornar a encher e tornar a despejar, que é este o cumprimento repetido da esperança, a antídoto do desânimo e da depressão, o exemplo mais rico da paciência e da resistência. Da minha infância guardo também o sermão do pregador de Santo António e de Santa Bárbara que contava sempre a história do menino que quis esvaziar o mar às mãos cheias de água para uma poça de areia, como eu quis esvaziar o poço para uma pia de pedra e ainda hoje teimo que o conseguirei. Com um beijo especial para meus pais, meus irmãos e minha menina, mulher de meus dias inteiros.

terça-feira, junho 16, 2009

O S. João na Cultura Popular

Sessão cultural na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva: 22 de Junho – 21.30 Horas

Sob a orientação teórica do professor Doutor Aurélio de Oliveira e com intervenções de José Machado e do grupo «Os Sinos da Sé», esta sessão cultural procurará falar do S. João em quatro dimensões:

1. Cartazes e iluminações: a fogueira verbal e visual que anuncia a festa: a configuração das ruas como espaço sideral, a configuração da comunicação como revelação de conteúdos, anunciadora de realidades. Os lançamentos de fogo e de balões como sintomas de purificação, de fuga e devaneio.
2. Percursos e procissões: corridas e correrias: passeios e caminhadas: as singularidades rituais da festa: os percursos assinalam roteiros de socialização (desfiles e rusgas, cerimoniais de cumprimento), consagração do território (a sacralização e a catequização) e escapadelas de excesso (gastronómicas, consumistas, recreativas). Toda a gente tem de possuir uma percepção de território propiciador de benesses, sejam elas provenientes do mercado nas suas variedades de oferta, sejam elas provenientes da socialização na sua tolerância de manifestações, gestos e palavras, sejam elas provenientes da expressão da religiosidade, cristã ou plural ou «pagã».
3. Sons e sonoridades: o hino sanjoanino e a dança do Rei David são os paradigmas de toda a construção musical: entre o instrumental e o coral, toda a festa vive mergulhada em manifestações musicais e coreográficas, sejam espontâneas ou organizadas. O improviso como estilo de cantares e a variação como estrutura modelar. Os cantares ao desafio como erupção de interditos e expressão de fantasias: os Cachadinhas (José Cachadinha e sobrinho Pedro Cachadinha) como «caso» de liberdade expressiva e postura «descomposta».
4. Os ícones e os símbolos: as figuras catequéticas (S. João, Cristo, Apóstolos, pescadores, S. Cristóvão, o menino), o balão, as ervas (alho porro, manjerico), o martelinho e o assobio (gaitas e pandeiros).

Esta sessão cultural constará de pequenas intervenções expositivas (Professores Aurélio de Oliveira e José Machado), de perguntas e respostas avançadas pela assistência, de intervenções musicais («Os Sinos da Sé») e de cantadores ao desafio: Os Cachadinhas de Ponte de Lima.

Esta sessão constitui uma singular iniciativa da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva com a finalidade de se constituir no futuro como palco privilegiado da festa nas suas dimensões literárias (narrativas e poéticas) e artísticas (gráficas e musicais)

Texto elaborado por José Machado. Professor, membro da associação «Os Sinos da Sé», animador da BLCS na hora do conto.

terça-feira, junho 09, 2009

Autoavaliação e Modelo de gestão

A fotografia foi tirada durante a intervenção de uma escola no Encontro Regional do Prosepe, no Sameiro, em Braga, no pretérito dia 6 de Maio. Eu estava no palanque a animar a malta e a apresentar os «performers», a convite do Jorge Lage e por «ser da família prosepe» desde o início.

Aproveito-a para ilustrar as duas questões que coloquei ao Guinote, esse mesmo activíssimo professor da Educação do Meu Umbigo.

1. Andam por aí uma posições extremadas sobre a avaliação docente que devem ser clarificadas ao abrigo do parecer elaborado por Garcia Pereira. Ora pela leitura do mesmo, dentro de todas as ilegalidades, a luta dos professores que não entregaram OI, como é o meu caso, foi e é uma luta contra o modelo de avaliação do ME, mas sem ser contra o direito e o dever de o Estado, o patrão, nos avaliar, como decorre do ECD. A recusa de entrega de OI não é a recusa do dever de o Estado, seja lá como for e por quem for, me avaliar, porque todo o trabalho que desempenhei está feito e à vista de toda a gente. Portanto daqui decorre que a autoavaliação se deverá fazer nos moldes em que o Estado, através do Director ou não, determinar que se faça e deve-se entregar. Agora o que eu acho que se deve fundamentar é o seguinte: como é que eu, que recusei o modelo simplificado, tenho o direito de exigir ao Estado que me avalie e ele o deva fazer para eu a seguir me poder defender. Se eu achei que não tinha nada que definir objectivos, se eu achei que não tinha nada que pedir aulas observadas, se eu achei que os procedimentos de nomeação de avaliadores eram arbitrários e inconsistentes em termos deontológicos, se eu achei que a divisão da classe em duas categorias prejudicava a boa avaliação e não era garantia de boa formação, apesar disso tudo eu trabalhei, cumpri, dei aulas, desempenhei as tarefas que me foram distribuídas, portanto eu não posso ficar de fora da avaliação. Não lhe parece?

Agora, outra questão, sobre o modelo de gestão: numa sociedade democrática em que o desenvolvimento é alavancado por reformas, os cidadãos têm o direito e o dever de tomar parte em todas as instâncias da mesma, não sendo mais pertinente o estar de acordo ou em desacordo com a definição das políticas, e menos pertinente o bom desempenho ético das tarefas distribuídas. Numa sociedade de paradigma revolucionário, quem não concorda muda de trincheira e demite-se de colaborar, mas numa sociedade de pendor reformista, discordar não é impeditivo de exercer cargos ou de estar em instâncias de decisão. Portanto eu não compreendo onde é que um democrata pode encontrar fundamento para não se candidatar a Director ou para não pertencer a um Conselho Geral ou para não ser avaliador, posto que a reforma foi implementada por um governo legitimado e por uma parlamento. Recusar ou ser crítico, neste paradigma de sociedade democrática, estou em crer que é boa condição para o exercício de cargos, doutra forma cai-se em unanimismos, em «carneirada», o que pode ser pretendido pelos partidos no poder, mas não é certamente pretendido por uma cidadania responsável. Um professor limita-se muito se tomar como modelo de cidadania o paradigma político ou clubístico ou de seita ou de guerrilha ou de sindicatos que anda por aí... Você dir-me-á que os partidos cilindram quem discordar, ora aí está mais uma razão e boa para os que discordam dos partidos se candidatarem aos lugares que eles pretendem distribuir pelos amigos...