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terça-feira, agosto 26, 2008

Os dias de Agosto

25 - 84 anos de minha mãe - a primeira foto é do ano passado, a segunda é deste ano, no mesmo rito, com os netos mais crescidos todos em volta dela, com os filhos todos, com o marido, com os ausentes no coração.














O discurso coube-me a mim e saiu-me em torno de uma ideia simples: a ordem natural das coisas é uma expectativa, mas a surpresa da natureza está em ela não ser uma regra, o que nos facilita a aprendizagem da precariedade da vida e da sua necessária fonte de resistência: o amor familiar, o sentimento de gratidão e o compromisso da sua sustentação por muitos anos, todos os que forem necessários, quer na ordem natural das coisas, quer nas surpresas que a contrariem. Os mais novos acharam que eu falei bem; fosse pelo sentido, fosse pela estranheza das palavras ou da sua composição, a coisa agradou-lhes.













Fomos 23 à mesa, o cabrito esteve à altura do acontecimento, com as irmãs a saberem preservar as tradições da casa e os rapazes a fazerem os possíveis.













Depois houve o jogo de futebol entre tios e sobrinhos, com os tios em menor número, mas a garantirem o resultado nos penaltis, naquele campo de feno onde a restolha cumpre funções de verdadeiro obstáculo estratégico para ambas as equipas; é claro que os sobrinhos estão a subir de forma e de pujança física e os tios estão com melhor desenvolvimento verbal das desculpas.

22 - As festas da Agonia em Viana do Castelo, com visita de pormenor à festa da mordomia, momento singular de graça e de curiosidade.














Vale sempre a pena ir, ver e participar nos momentos relevantes: as cerimónias protocolares de apresentação dos cumprimentos ao Governo Civil e à Câmara Municipal, momentos singulares de reivindicação e de prosmeirice, com esta a tentar desvanecer aquela, ainda que a média das duas dê vantagem à primeira, porque é de afirmação que se trata. A festa das mordomas continua com todas as interpretações possíveis, ou não fossem o ouro, os trajes da tradição e os corpos das mulheres os melhores símbolos de leitura.

5 a 9 - Expo Saragoça 2008 - Ver a cidade foi uma coisa, ver a Expo foi outra, se não fora a primeira a segunda ficava mais pobre e vice-versa e já quase se diz tudo. Foram três dias e dois para as viagens. Boa companhia, boa organização. Quem viu Lisboa, viu esta a querer continuá-la, no estilo e na parafernália tecnológica, com a confirmação de bons momentos de ilustração.














O desafio estará em saber como fazer circular a informação para além dos conteúdos fundamentais e já muito divulgados, sobre a água e sobre os outros recursos. Cai-se na estratégia comum: o essencial está em letras de rodapé e na leitura ou visão dos folhetos e dos filmes até ao fim.
O percurso de esperar para ver acaba por cansar demais. Depressa se deseja um pavilhão com lugar sentado e ar condicionado.














E depois as obras ou objectos de divulgação e de enriquecimento não estão acessíveis. E hoje já está ao alcance de qualquer país distribuir ou vender, quase a custo zero, um DVD com dados para os trabalhos de casa. O preço da água, ainda que em garrafa, exorbitou e se for visto a par da secura dos fontenários espalhados no recinto, então já temos de entrar pelos caminhos de outra crítica.

quinta-feira, agosto 14, 2008

O último livro de Rogério Borralheiro

(Fotografia do Castelo da Piconha, na Galiza. Foto de JM)

Rogério Borralheiro
Tourém. Vila e Concelho. História de uma Honra de Barroso.
Edição da Junta de Freguesia de Tourém. Braga, 2008.

O autor deste livro não está mais entre nós. Morreu cheio de trabalho, antes do tempo pleno a que aspirava e que se esperava dele. Paz à sua alma e honra aos seus méritos e aos produtos do seu trabalho. Um deles aqui está, esta monografia histórica sobre Tourém, uma terra a que o ligavam não só laços de amizade com as gentes e as instituições, mas também curiosidades obsessivas e desafiadoras, as mesmas que alimentavam a sua sede de explicações sobre o seu torrão natal, o seu planalto Barrosão, o seu país.

Tive a honra e o dever de apresentar esta obra, até porque fui seu interlocutor durante o acto de criação, um interlocutor marginal, procurado mais pelas arritmias de sistematização, ou seja, por esse gosto de pôr em causa, do que pelo conhecimento de fontes ou de interpretação de documentos.

A perplexidade do Rogério polarizou-se nessa realidade a que a história chamou Castelo da Piconha e que os documentos referem como centro da logística militar para a defesa de fronteira e de um território concelhio que englobava um conjunto de lugares que hoje são Tourém e as terras do Couto Misto de Rubiás, Meaus e Santiago. Ora quem por ali passe hoje não tem dados que lhe possibilitem encaixar os fraguedos em tão importante imaginário concelhio. Mas é assim mesmo o desafio da história: procurar o que soubemos que existiu e que hoje não vemos ou que temos dificuldade em compreender.

O Rogério andava pelos arquivos históricos tão sôfrego de fontes e documentos sobre as Memórias Paroquiais ou sobre as Invasões Francesas, como sobre o seu concelho, sobre as terras da sua infância, aquelas terras que ocupavam um espaço cada vez mais denso nesta ideologia contemporânea de procurar paraísos perdidos e valores patrimoniais simultaneamente autónomos e comunitários. Os dados sobre a história local via-os sempre à luz de um princípio hermenêutico muito simples: iam a favor da corrente de opinião estabelecida ou iam em sentido contrário? E entusiasmava-se de tal maneira quando a perspectiva de interpretação podia acrescentar um pormenor que era preciso às vezes refrear-lhe os ânimos, quase sempre em vão. Foi assim com esta obra: a escrita ganhou o ponto alto da ansiedade quando recolheu aquela documentação curiosíssima sobre a liquidação dos direitos de Foral que os lavradores de Tourém tinham em dívida com o senhorio de suas terras há 40 anos, desde 1739 a 1779.

Este caso tomou-o ele como sintoma da própria administração pública de bens e pessoas: a cobrança dos impostos foi sempre desejada por uns como esquecimento ou perdão e por outros como ajuste de contas. O livro tem os documentos históricos possíveis, outros eram desejados, mas o autor ainda os não localizara. Se por um lado lhe ficou frustrada a perspectiva de apresentar os documentos originais do primeiro Foral e de constituição da Honra de Tourém, do tempo do Rei D. Sancho I, se por outro lhe ficou desanimada a procura das pedras do Castelo da Piconha, onde D. João I mandara erguer muralha, isso não lhe impediu a interpretação à luz de outros documentos similares e aproveitou bem para expor toda a sua aprendizagem sobre o funcionamento dos concelhos, numa atitude pedagógica de ensinar a compreender a evolução dos sistemas e processos de eleição e de nomeação dos dirigentes locais.

No livro está também uma explicação da evolução do mapa dos concelhos que existiram em Trás-os-Montes até á Reforma de 1836, data em que Tourém deixou de ser sede de concelho. Está ainda essa história curiosa do Bispo de Ourense se ter refugiado em Tourém, terra então da sua diocese, para fugir e discordar das políticas de Napoleão Bonaparte quando este invadiu Espanha e a quis submeter aos seus desígnios, ou seja, está ali um pormenor curioso mas essencial para se perceber um espírito cívico que se instalou neste canto do território que é Portugal e que é Galiza: esta ideia de as terras serem territórios comuns, mistos, partilhados por ambos os povos dos países com igualdade de interesses, de direitos e de deveres.

A história de Tourém ensina a perceber a história de muitos outros concelhos e o leitor desta obra já terá nesta função toda a compensação: as explicações são dadas com uma preocupação minuciosa e exaustiva dos procedimentos administrativos e da sua evolução ao longo dos séculos, o que é conseguido não só em termos de texto, mas também de imagem, mapas ou fotografias, estas tiradas pelo próprio em jornadas de paciente investigação.

Ao fim e ao cabo, com os documentos possíveis, quer relativos ao estatuto de concelho, quer relativos ao estatuto religioso, Rogério Borralheiro traz à indiscrição pública esta terra de Tourém que de ora em diante só terá a ganhar em saber mais sobre si, pois o desafio à descoberta de mais documentos e de mais fontes ficou bem lançado por ele. Este imaginário de uma terra como Tourém se confirmar na nossa história como Honra ou terra de autonomias merecidas e conquistadas, há-de sempre contrastar com o cumprimento das leis por imposição dos poderes centrais. Porque é neste sentimento de mérito que pode enraizar-se mais a nossa consciência cívica. Durante uns anos até nos poderemos convencer de que nada devemos a ninguém e de que temos tudo em dia, mas um dia chegará que alguém, essas gerações mais novas que nos vão seguir, nos pode cobrar uma dívida que entretanto se acumulou: se for de pão, teremos de trabalhar, mas se for de instrução ou conhecimento podemos já não ter recursos.

sábado, agosto 02, 2008

Ao sétimo dia, Borralheiro...














(Foto de M. Duarte, em Castro Laboreiro)

Como desejo a água de uma fonte,
Também aguardo o eco do teu grito.
Mantenho uma esperança de infinito,
Preciso de outro céu no horizonte.

Deixo este a valer-me como ponte
Desse outro mais intenso e mais bonito.
Quer seja fantasia, ou seja mito,
Anseio que ele exista e me confronte

Com esse sentimento de missão
Que investiste na vida, por julgar
Que era o teu dever e criação.

Só quero que este querer a eternidade
Me dê justo sentido à brevidade
Dos dias que sem ti vou inventar!