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terça-feira, maio 30, 2006

«SENTE-SE» - fotografias de Miguel Louro

Vai estar exposta de 3 a 30 de Junho de 2006, na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, Rua de S. Paulo, nº 1, em BRAGA, a exposição de fotografia de Miguel Louro, assim nomeada «SENTE-SE», a qual consta de 55 platinotipias, uma técnica de impressão hoje em dia tomada como recurso de eleição e linguagem de estilo.

Tendo sido inaugurada no Centro Cultural da Ordem dos Médicos, no Porto, onde esteve de Dezembro de 2005 a Janeiro de 2006, esta exposição foi apresentada, em parte, no Clube de Golfe de Ponte de Lima. O autor, o médico bracarense Miguel Louro, celebra com esta exposição 30 anos de dedicação à arte da fotografia e os trabalhos agora expostos podem mesmo ser adquiridos por quem estiver interessado, dadas a sua qualidade de impressão e os seus atributos estéticos.

Sente-se – tomada como ordem ou conselho, esta acção verbal, que sintetiza a exposição de fotografias de Miguel Louro e que nomeia também o livro da sua biografia, remete-nos para o acto físico de nos sentarmos, fazendo uso de um meio ou instrumento que se transforma em lugar, em sítio. Onde nos sentamos é o lugar onde estamos, mas é também o objecto, a coisa, em que nos sentamos. Vêm à memória as palavras e os sons de António Variações: ...tenho pressa de sair... tenho pressa de chegar a outro lugar... porque eu só estou bem aonde eu não estou... porque só quero ir aonde eu não vou... o lugar onde nos sentamos pode bem ser o fim de uma errância, mas também o princípio de uma deriva, de um êxodo. A procura de um lugar é o nosso destino?

Sente-se
– tomada como declaração ou exclamação, esta acção verbal remete-nos para o acto de sentir, assumido reflexivamente ou direccionado emocionalmente para um objecto ou uma matéria exterior a nós.

Esta dupla leitura do título da exposição de fotografias e da biografia de Miguel Louro funda-se ora no percurso reflexivo do sujeito, ora na temática que o seu campo de visão reuniu para este evento.

Ao longo do tempo e ao largo do mundo, ao longo de trinta anos e em muitos países, Miguel Louro fixou com a sua objectiva aspectos que feriram a sua subjectividade de observador, de curioso, de participante, de cidadão, tomando a fotografia como um processo de recolha de novidades e variações sobre o outro, na ânsia de nos compreendermos melhor a nós próprios. Um destes aspectos – o lugar ou assento – tornou-se agora alvo da curiosidade e da fixação do fotógrafo, assumiu-se como linguagem de interpretação dos sentidos do mundo.

A ideia de assento é estruturante da cultura dos povos: presente na teologia da imortalidade, o assento à direita de Deus, presente na teleologia política, os tronos e os assentos à esquerda e à direita, presente nas ideologias pedagógicas e ecológicas, bem sentado, mal sentado, sentado naturalmente, sentado artificialmente, enfim, presente nas visões económicas, tecnológicas, artísticas, recreativas: o berço de oiro, o assento ejectável, o lugar de distinção, o camarote, a plateia, a tribuna, a bancada…

Estamos perante a 20ª exposição individual de Miguel Louro, desta feita produzida no processo de platinotipia, com o objectivo de proporcionar ao público observador e apreciador um campo de reflexão e uma área temática de estudo - «Sente-se – ser assento assédio sé» - o lugar comum de estar sentado e de fazer sentido.

Convidado e testemunha II

As danças de salão
O rito do matrimónio é uma escola de poesia, daquela que o tempo e a memória consagram depois da perda da referencialidade e da perda da fonte e da perda do destino, daquela que pode ser sempre o nosso caso e nunca o desilude, daquela que tem sempre a ver connosco e sempre nos transcende. Já assisti a casamentos pelo civil, com e sem arremedos de poesia, mas esta história fica mais bem contada dentro de uma igreja barroca, com um padre na função de mordomo do simbólico. São pareceres, que nem precisam de fundamentação na fé, pois acho que se aguentam na razão pelo lado meramente estético, melhor, por esse lado que se chama a tradição de nossos pais e avós e outros, sim, poderá ser o lado da cultura, como poderá ser o lado da convenção social. Mas, seja na perspectiva da hipocrisia social, seja na perspectiva da imersão religiosa, o rito é mais do que parece, tem um segredo que o enaltece e tem um ritmo... Esquece, alguém me diz ao lado, sentindo-me o devaneio do momento. Mas foi esta a música que o poema do pai do noivo fez nascer em mim, terá feito nascer nos outros, terá feito nascer em si próprio ou não lhe sentira eu as lágrimas incontidas da emoção. Nós temos de ser quem somos nestas alturas, temos que deixar «esbaganhar a alma», que o linho deve-se à flor e esta deve-se à raiz. Está bem, chega um dia, a sopa salga / a chuva cai e vai-se a ela / o amor vai-se, o frio galga / e a luz do sol já não nos péla / mas esse momento poderá ter a segurança de cautelas e caldos de galinha que neste dia se deitam à vida, à terra a dois, à família que se quer ser. A partir de hoje, aumenta a casa / a mesa, a conta da despesa / a família de cada um fica mais larga / e aumenta a confiança e a franqueza. É o que se diz, como se diz que a seguir cada um vai à sua vida, mas este ir é sair para andar no meio. A Sofia e o Jaime deram o sim, deram o nó, são marido e mulher e o padre Sandro lembrou-lhes que não separassem mais o que Deus uniu. Olhei a minha menina, mulher nas minhas histórias ao longo de quase trinta anos e lembrei-me que a noite será de noivos, com aquela fé de Abraão que ainda não perdi. A Teresinha leu a oração dos fiéis, o coro interpretou «Ave Maria» de Shubert, a Inês cirandou pelos bancos e pelo altar. Avé, Maria, aqui se lembra a Mãe / o colo carinhoso, permanente / cheio de graça, de saudade e bem / de que se precisa diariamente. E mais um tudonada e estávamos aos beijos e abraços, rezando pela paz, lembrando-a através da banalidade que aqueles gestos mais íntimos ganham com o uso, mas que assim, no lugar, entre nós, bem-vestidos, bem-cheirosos, bem-comportados, adquirem a «pose» cerimonial dos compromissos. Ainda não é hoje que falo das danças de salão.

Bolonha!

Força, Zé Carlos!
Só temos palavras, eu e tua madrinha, e elas não te farão agora grande precisão, mas nós precisamos de as deixar aqui, neste espaço de circulação livre, ao vento dos cliques e dos impulsos digitais, para que as leias ou elas te cheguem referidas por outros que as vejam e delas façam assunto na praça pública deste lugar de todos. Precisamos de ti como prova da esperança e da confiança nos médicos e na ciência médica, e queremos que tu mostres a determinação com que te formaste na sabedoria de outros corpos. Precisas de coragem para viveres o teu futuro e vais recolhê-la em ti mesmo, que a coragem e a determinação hão-de sair-te da pele como segredo que tinhas e não sabias até onde podia ir. Depois já saberás ajudar-nos melhor. Temos, misturada nas palavras, uma vontade de sentido que não sai, que não sabemos como exprimir, que só os olhos e a respiração poderiam ajudar a transmitir-te. No dia do ensaio, no Porto, em Ramalde, a tua presença aumentou essa vontade de dizer o que agora não nos vem, mas é esse sentimento que te queremos passar nesta mensagem, aqui, neste lugar do mundo: há em nós um desejo de te acompanhar, estamos já quase a chegar ao pé de ti, já ouvimos os teus passos, vais seguro, aguenta, o caminho depois alarga-se e vais encontrar uma passagem mais bonita, nessa altura já andaremos lado a lado, com mais tempo para fazer todo o caminho pela frente. Zé, não escolhemos sofrer, mas podemos escolher o sentido a dar ao nosso sofrimento, podemos escolher a música que o redima e o celebre. Procura no teu íntimo esses sons, mistura-os com os nossos. Um beijo dos padrinhos.

terça-feira, maio 23, 2006

Gerês - A subida da Vezeira do gado - Maio de 2006

Convidado e testemunha

As danças de salão
No passado sábado, 20 de Maio, foi o casamento da Sofia e do Jaime. Nós fomos convidados do noivo, amigos dos pais, amigos dele também porque o rapaz seguiu-nos sempre com uma curiosidade de satisfação e sempre nos saudou a presença com um riso de cumplicidade em torno de histórias, palavras e discursos mais ou menos promotores da boa disposição e da transgressão dos lugares comuns das boas maneiras, sobretudo sempre que a junção do seu pai com a minha pessoa proporcionava os imprevistos descaminhos da pilhéria e da graça no convívio. O casamento religioso foi na Igreja de S. Paulo e a boda foi na Quinta de Mouriz em Vila Verde, o primeiro lugar ditou a consagração da arte barroca como excelente símbolo da vida e o segundo ditou a terra e a casa como símbolos da criação pessoal. A água de nascente não poderia ter melhores apreciadores da sua correria para os campos e para a fonte. Na Igreja, fora, o padre passara-me ao lado ou vira-o até como quase arrumador de carros e de gente tal a dissemelhança do seu modo de estar e trajar, isto foi o que só pensei depois de o saber sacerdote, ao mesmo tempo que me deixava seduzir pelo seu lado juvenil e informal de celebrar o rito de casamento, numa prova de fé que espero seja profética o suficiente para se confirmar que o estilo do pastor ganha o rebanho. Ao som da marcha nupcial, interpretada pelo Coro da Igreja do Carmo, estilizado a preceito para este género de compromisso artístico, a noiva, a Sofia, entrou pelo braço de seu pai, segura e feliz, olhada e remirada, sentida, até se aproximar do noivo e o saudar beijadamente. Há gestos com que a gente ainda se comove. O cântico seguinte teve um trompete como personagem buliçosa, em contraponto melódico com a simplicidade do texto poético que afirmava a alegria de estar em festa com Jesus. A paixão mobiliza o altar e o altar dá-lhe um imaginário de intemporalidade, de encenação perpétua, como aquela talha dourada em rebuliço de formas e em excesso de motivos que está nos altares da Igreja de S. Paulo. Braga, a cidade do barroco, ganha no casamento católico um tempo propício de contemplação. O padre, afinal companheiro de infância de alguns outros convidados, colega de bairro, colega de escola, o Sandro, o miúdo que quis ser padre e que jorra a confiança de o ser, fez uma saudação de sabor familiar, de linguagem um nadinha marialva, mas de mensagem genuína, a apelar aos valores da união, do amor, da fé, da igualdade de esforços e de tempêros. O amor erótico, desde que agora recebeu a reflexão teológica de Bento XVI, dá mais alguns trunfos aos leitores atentos da palavra bíblica, seja aos que ainda estão no viço da juventude, seja aos que aguardam a «ditosa velhice» da experiência amorosa. Há sempre palavras acesas, vivas como o fogo, vermelhas e quentes como o vestido da primeira leitora, que tudo ali, ou na minha cabeça, estava a tomar as proporções estéticas do lugar. Esta euforia do casamento religioso católico, este querer casar pela Igreja, tem que ter uma explicação para lá da tradição e nela, há-de por força radicar em alguma energia incontida de optimismo na espécie, há-de entroncar em algum mistério de criação, se calhar é acto fundador da própria Igreja, da comunidade de crentes que se projectam em Deus para se transcenderem depois em nome de causas, de princípios, de ideias, de imagens, de tarefas. Por mais espectacular e exibicionista que possa parecer este modo de fazer um contrato a dois na presença de uma comunidade de familiares e amigos, é outra a energia que o move, é outro parecer e esse parecer é que é lindo porque é da ordem do ser. Divago, até que a Inês, criancinha de dois anos e já faladora de tudo, vem ter connosco e se apodera da esferográfica emprestada com que escrevo, para fazer uma outra escrita de flores ou de figuras. Retomo-a, já no sermão, para completar os avisos irónicos do Padre Sandro: nem sempre somos bons / mudamos muitas vezes / de cores, de lados e de sons / sofrendo, por isso, alguns reveses / Enquanto se é namorado /andamos bem agarradinhos / que o amor quer-se apertado / com correntes de beijinhos. (Continua)

quinta-feira, maio 11, 2006

Os lugares comuns - Viagem a Paris III

Ir a Paris foi ir aos lugares comuns do imaginário que nos acompanhou desde os bancos da escola e que hoje acompanha também o meu sobrinho na aprendizagem do francês, esses lugares comuns dos postais ilustrados, as provas dadas do turismo de massas, os lugares simbólicos de uma nação, de uma pátria, de uma civilização, pois foi assim que aprendi a França pelos livros, especialmente Paris, a cidade-luz, a cidade das luzes, o campo aberto de experiências estéticas e de recepções festivas a tudo quanto fosse descaramento e provocação culturais, ciência e ficção, concerto e desconcerto artístiscos. A partir do segundo dia da nossa permanência em Paris, quando iniciámos o roteiro turístico na estação do metro da Praça de Itália, esta ideia da cidade passou-me ao lado e no que me dei conta foi de que a cidade era de todos e todos eram os mais diferentes, os mais variados, os mais díspares e os mais semelhantes, na raça, no vestir, no estilo e na graça pessoais, no ir a dormir em pé ou sentado, no correr e no parar. Onde estão os franceses que não sejam estes que vão connosco de metro, que se cruzam connosco nas ruas, que sobem connosco à Torre Eiffel, que se sentam connosco nos restaurantes? É certo que não falei com muita gente, naquilo que fosse um falar de querer saber ou de entender o pensamento de alguém, que não tive tempo ou nem me concentrei em rostos que me ouvissem ou esperassem de mim três dedos de conversa. Mas é certo que entrei e saí de lugares frequentados e as pessoas me pareceram sempre as mais variadas e as mais comuns, nas lojas, nos restaurantes, nos cafés, nas livrarias, em Notre Dame, em Montparnasse, debaixo do Arco de Triunfo, no Louvre, na Praça da Concórdia, no Sacre Coeur. È certo que me espantei com os sem-abrigo e que receei daqueles cães tão grandes que os seguem tão andrajosos quanto eles, é certo que me espantei com o alívio de bexiga, público e descarado, de um deles na esquina de uma rua que tinha sinais exteriores de ser frequentada e rica, urbanizada que era em cantaria e vitrines, é certo que nos seduziu a simpatia dos empregados de café e restaurantes, e até dos bares de esquina. Dei comigo a pensar que a satisfação de subir às torres simbólicas da cidade, a de Eiffel e a de Montparnasse, poderia tomá-la como catarse das memórias dramáticas de 11 de Setembro e de facto não me livrei de um pequeno susto na primeira delas quando o altifalante anunciou que o acesso ia ser fechado por problemas de segurança e nos aconselhou a calma possível naquele topo do mundo, naquele excesso de confiança no futuro que fora construído em ferro para ser provisória atracção de feira de uma exposição universal em 1889. O que vemos e o que pensamos do alto destes lugares? Donde nos vem o conforto de ver tanto e tão longe e para que nos serve? Entre o alto e o baixo, o cemitério de Montparnasse merecia a nossa visita, mas não fomos lá, talvez que lá reflectíssemos na razão de termos subido tanto, a razão que acaba por se nos representar a mais forte, afinal, pois é de alturas que precisamos, e um passeio é uma espécie de aprendizagem de voo, para saciar uma fome que é de ver, mas também de conhecer, que é de falar e de estar, que é de sairmos de nós. Comprei uns livros no Boulevard de St Michel, na livraria de onde minha irmã me trazia algumas publicações avulsas a pedido, um deles sobre a França rural profunda, Le village métamorfhosé, de Pascal Dibie, comprei também o nº 1 de uma revista chamada Philosohie e dei-me por feliz por pensar que a filosofia ainda era assunto para primeiro número e para nome de uma revista que a promete fazer e pensar a partir do quotidiano contemporâneo. Andámos quilómetros, a pé, a «flâner», a divagar, como aconselhou minha irmã, rua abaixo, rua acima, até aos limites de urbanismos apelativos e até aos limites da repetição de lugares comuns, mas sempre surpreendidos pelas performances de rua e pelas apropriações tão familiares que as pessoas já fazem dela, como aquela surpresa de ainda termos visto as grades da polícia nas ruas da Sorbonne e os sinais evidentes das transgressões de limites que por ali se confrontaram, como aquela simplicidade de manifestação ruidosa que quatro ou cinco acorrentados decidiram realizar à frente da Notre Dame, super vigiados pela polícia, mas incansáveis na defesa de uma causa, a deles e a de outros, com muitos outros ao lado na maior das distracções com patinadores acrobatas ou com mimos de fantasias de máscaras, ou com pintores, ou simplesmente a ver a realização de uma cena de cinema em plena ponte sobre o Sena, esse rio que não cruzámos de vapor por acharmos que da margem se sentia também como imaginário de viagens. Regressávamos a casa satisfeitos e tomávamo-la, ainda que pequeno estúdio para uma rapariga só, como a casa mais larga que o cansaço deseja para se restabelecer.

quinta-feira, maio 04, 2006

Viagem a Paris II

Depois da paragem na área de descanso, servida de tudo, prosseguimos até Poitiers, onde a paragem deu para descortinar um centro de cidade movimentado, com uma vista exterior da catedral e uma passagem pelas ruas de comércio, agora com entrada para compras, um boné de pála a direito, como por cá já vira o meu sobrinho e por isso o desejara. Foi ocasião para merendar, aliviar e voltar à estrada, com ideia de ainda irmos dormir a Paris, o que se conseguiu nos vagares que a auto-estrada e o «périphérique» permitiram. A Praça de Itália assustou-nos com a sua rotunda caótica, ao estilo passe quem puder, mas o caminho para o hotel descortinou-se bem. Ali perto residia minha irmã e lá fomos fazer a marcação da hospedagem para os dias seguintes. Depois, o jantar, quase ceia, depois um passeio pelas ruas do sítio, com aquela familiaridade urbana de noctívagos e de transeuntes que temos por cá, como se os habitantes da noite possuíssem uma tipicidade urbana universal, isolados, lentos, vagabundos de si próprios ou das lojas mais iluminadas ou das paragens dos transportes públicos. As marcas da arrumação ou da desarrumação urbana também se pareciam nossas, mas pouco a pouco iam-se configurando mais urbanizadas, mais polidas, umas e outras, mais indicadoras e indicativas de si próprias, mais acauteladoras de bem-estar comum. Dormimos então com a novidade de estarmos em Paris. E dormimos bem que foi preciso minha irmã telefonar-nos a avisar de que o pequeno-almoço já estava a arrefecer. Boa, minha irmã, foi mesmo essa ideia dos «croissants» e das variedades de queijo e do salmão fumado, o que deu à nossa primeira manhã de Paris o encanto da cozinha da família.

quarta-feira, maio 03, 2006

Viagem a Paris
A decisão de abalar até Paris, nestas férias escolares da Páscoa, foi tomada por impulsos, o primeiro afectivo e o segundo rodoviário, mas a conselho de amigo experimentado, com mapas de imperfeição crónica, é certo, e com impressão de itinerários a partir da net, estes também atrasados em relação à construção das auto-estradas e em relação à sinalética de desvios, cruzamentos e entroncamentos. As estradas mantêm alguns truques para nos obrigarem à sua frequência e os caminhos fazem-se sempre depois de andados. Ainda bem que o impulso aéreo não funcionou à última hora, após a consulta das tarifas. Feitas as contas, o dinheiro do avião deveria chegar para o gasóleo e para os comes e bebes e as dormidas. Deu-se o acaso de a minha irmã, que está colocada como professora de Português em Paris, nos ter desafiado a vistá-la neste último ano de destacamento e deu-se o acaso de o Banco onde minha mulher trabalha ter consentido numa marcação de férias quase sem aviso. Eu, a minha esposa e o meu sobrinho João Pedro fomos por aí acima, com liberdade de paragem e de pernoita onde fosse o caso, mas depressa o sentido de viagem com destino se impôs nos ritmos de condução e de descanso. Mesmo assim, a primeira noite passámo-la em Irun, num hotel Ibis de localização periférica, tão convidativo a conhecer a terra onde ficava como a ficar entre paredes, que jogavam o Benfica e o Barcelona e a «camisola» veste-se também fora de casa. Assisti ao jogo na companhia de um catalão de quatro costados, conhecedor de dirigentes e de atletas dos clubes portugueses, por dentro também das rivalidades entre os clubes espanhóis, categórico quanto aos méritos do Barcelona. O quarto e a cama foram compensadores da pequena frustração positiva, a manhã levantou-nos risonhos e animados, o pequeno-almoço dispôs-nos ao caminho e a estrada de beira-mar até Biarritz configurou-nos uma urbanidade excessiva, mas de aparência regulada e sustentada, pelo mesno neste tempo em que a praia já apetece mas não se impõe, pois dos infernos de Verão hão-de falar outros que os viverem. Agora aquela estrada até Bordéus é um hino aos camiões! Quantos e quantos de todas as nações ali se vêem, que fortunas e que pesadelos económicos por ali não vão! A economia anda na estrada, tão demoradamente a ultrapassar-se quase à mesma velocidade de cruzeiro, como levianamente a sumir-se na ansiedade das pressas, ainda que a estrada esteja pejada de controladores de velocidade e de apelos à precaução. Para já, fiquemo-nos pela área de descanso, que os serviços são acolhedores.